postado em 07/01/2011 08:15
O mercado financeiro levou um susto, embora passageiro, com as medidas anunciadas pelo Banco Central para conter a desvalorização do dólar em relação ao real. O presidente do BC, Alexandre Tombini, mandou o recado de que está atento às artimanhas dos bancos para auferir lucro fácil, ao forçá-los a reduzir a posição vendida (aposta na queda do dólar), a partir de 4 de abril. Isso será feito por meio de depósito compulsório, não remunerado, sobre 60% do total de moeda estrangeira em seu poder, que excederem US$ 3 bilhões. Por conta dessa imposição, as ações dos grandes bancos recuaram na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) e arrastaram para baixo o Ibovespa, índice que mede a lucratividade das ações mais negociadas no pregão paulista, que caiu 0,72%, para os 70.578 pontos.No fim do dia, os papéis do Bradesco despencaram 2,65%, os do Itaú baixaram 2,14% e os do Banco do Brasil escorregaram 1,47%. Os analistas ressaltaram, porém, que esses resultados são passageiros, pois o impacto das medidas baixadas pelo BC não devem afetar a alta rentabilidade do sistema financeiro nacional. Na verdade, o que o governo fez foi frear os movimentos especulativos comandados pelos bancos, que rapidamente encontrarão outras fontes de ganho. ;A ação do BC foi importantíssima para corrigir distorções, mas não afetará os lucros dos bancos. As ações deverão recuperar o fôlego rapidamente;, destacou um operador de mercado.
Segundo os analistas, depois do susto inicial e de enxergar com clareza o primeiro passo de Alexandre Tombini no mercado de câmbio, os investidores se acalmaram. ;Mero efeito psicológico;, afirmou Pedro Azzam, da Ativa Corretora. As ações dos grandes bancos, segundo os estudos gráficos de Azzam, caíram porque já vinham em clara tendência descendente. ;A queda da bolsa e a alta do dólar ( 0,78%, para R$ 1,688) se deram meramente por conta do cenário internacional. Um dos fatores que interferiram foi o pedido do Secretário do Tesouro dos Estados Unidos, Timothy Geithner, ao Congresso do país, para que seja elevado o limite da dívida pública do país, atualmente de US$ 14,3 trilhões;, frisou.
Para o economista-chefe do Bradesco, Octávio de Barros, não haverá mudanças no preço do dólar ante o real. ;O efeito da medida do BC será neutro;, ressaltou. Ele lembrou que a posição vendida dos bancos privados, de US$ 16,8 bilhões, está no maior nível desde 2005, e chegou a essa condição porque, em 2010, o próprio BC ;foi mais ativo em suas intervenções e comprou divisas além do excedente de fluxo do mercado;. Segundo ele, as instituições ;zeravam; o risco cambial, porque ;recebiam os juros em dólares no mercado doméstico (mais altos) e pagavam juros em dólares no mercado internacional (bem mais baixos), ganhando com a diferença.
Também para Luiz Roberto Monteiro, assessor de Investimentos da Corretora Souza Barros, a operação do BC não terá impactos imediatos. ;O mercado está com receio sobre o que pode acontecer daqui para frente;, salientou. E disparou: ;Estranho foi a reação tardia do BC. Os bancos já operam com posições vendidas em dólar há muito tempo;.
Sem a certeza de qual será a próxima cartada do governo, o mercado incentiva todos os tipos de boatos. Há quem diga que o governo pretende lançar mão da quarentena ; obrigar o capital especulativo a permanecer no país por tempo determinado ; ou taxar o investimento estrangeiro em bolsa.
Corte de gastos
A primeira iniciativa do novo presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, foi considerada acertada pelo mercado, mas em dose equivocada. Para o especialista em câmbio da Corretora BGC Liquidez, Mário Paiva, seria bem mais saudável se o governo sinalizasse a intenção de conter o gasto público. Além de não ter efeitos práticos imediatos para a economia do país, o pacote de Tombini não foi capaz de alterar as projeções para a taxa de câmbio nos próximos 12 meses. O Bradesco manteve as expectativas de preço médio de R$ 1,70 para o dólar até o fim de 2011.
Para brasileiro, até R$ 2 vale viajar
; Victor Martins
Enquanto o governo enfrenta dificuldades para conter o excesso de valorização do real frente o dólar, o brasileiro está tirando onda no exterior. Com a moeda norte-americana abaixo de R$ 2, o turista se sente rico lá fora e está comprando de tudo. Consequentemente, toda essa gastança colabora para o rombo nas contas externas, que, neste ano, deve ficar próximo de US$ 64 bilhões, segundo os mais otimistas, e US$ 100 bilhões, de acordo com os mais pessimistas. Além das viagens internacionais, o país está alugando muitos equipamentos estrangeiros com o câmbio favorável e deve fechar o ano próximo dos US$ 14 bilhões em gastos com maquinários.
Mês após mês, o BC registra recorde nos gastos de turistas com viagens internacionais. De janeiro a novembro do ano passado, o real valorizado fez as despesas chegarem a US$ 9,3 bilhões ; o maior valor registrado desde que a autoridade monetária passou a fazer o levantamento desses dados em 1947. Em dezembro, com o dólar próximo de R$ 1,65, estima-se que os desembolsos com esses passeios tenham superado US$ 1 bilhão. De acordo com economistas e especialistas em turismo, o consumidor brasileiro viaja preferencialmente para compras e o destino mais comum tem sido Miami, nos Estados Unidos ; cidade que é vista como um gigantesco shopping-center a céu aberto.
Todas essas despesas no exterior, na avaliação de especialistas, representam o custo do crescimento brasileiro. Com baixa poupança e sem capacidade de produzir tudo o que é demando no país, é necessário buscar lá fora o que falta para garantir o desenvolvimento brasileiro. Segundo as projeções do Banco Central, essa necessidade de serviços e produtos estrangeiros fez o Brasil desembolsar quase US$ 70 bilhões no ano passado e a estimativa para este ano é que a conta avance para US$ 78 bilhões.
Diante de um deficit nas transações correntes tão elevado, o país fica obrigado a atrair investimentos estrangeiros para cobrir o buraco ou a ter reservas internacionais suficientes para evitar desequilíbrios na economia. Com o BC acumulando US$ 288,5 bilhões e o capital especulativo financiando parte do rombo, no curto prazo, o buraco não é motivo de preocupação. Mas, caso a economia norte-americana se recupere, o fluxo de dinheiro deve migrar para lá, deixando o Brasil em situação desconfortável. (VM)
Hora de avaliar resultados
Depois de ameaça, veio a paulada. Agora, segundo o ministro da Fazenda, Guido Mantega, o governo acompanhará com atenção a reação do mercado e, caso a especulação continue, está pronto para agir. O momento, segundo ele, é de observação após as normas que limitam a posição vendida dos bancos no mercado de câmbio. Caso o dólar continue a derreter, o governo lançará mão de novas medidas, mas ;sem precipitações;. O sinal amarelo para a equipe econômica acendeu nos meses de novembro e dezembro, quando a posição das instituições financeiras avançou a passos largos, levando a aposta contra a moeda norte-americana para US$ 16,8 bilhões ; o maior montante já registrado pelo Banco Central.
A expectativa do governo, no curto prazo, é de que o dólar retome a trajetória de alta frente o real. Ainda assim, Mantega preferiu não arriscar quanto ao que vai ocorrer com a taxa de câmbio a partir de agora. ;A cada momento você examina de onde vem as pressões. O dólar é flutuante, não dá para dizer quanto vai variar. Sofre influências internas e externas. Temos de observar;, explicou.
Para Mário Paiva, analista da corretora BGC Liquidez, as limitações impostas ontem aos bancos são um sinal de que mais ações podem vir pela frente. ;Essas regras transmitem o recado de que o ministro Mantega quis dar, de que o governo têm infinitas medidas para adotar. Essa, a princípio, foi benéfica para o bom andamento da economia;, avaliou. O ministro também considerou as medidas positivas. ;São quase como uma taxação para o excesso de posição vendida. Estão na direção correta;, afirmou Mantega.
Nas contas do governo, os bancos não estarão dispostos a fazer o depósito compulsório para posições vendidas acima de US$ 3 bilhões ou superiores ao capital de referência das instituições (montante guardado para fazer frente aos riscos). A hipótese com que a equipe econômica trabalha é de que todas as instituições reduzirão suas apostas no mínimo até o limite exigido pelo BC, já que os depósitos obrigatórios não serão remunerados.
Mantega explicou ainda, que ontem, após as medidas, a cotação do dólar começou a se formar no mercado futuro, e não no à vista. Os operadores começaram a mudar suas apostas esperando que o dólar se valorize até que se conclua o prazo para que os bancos se adaptem às novas regras, em abril. (VM)
China admite flexibilizar o câmbio
Pequim ; O Banco Central chinês se comprometeu ontem a aumentar a flexibilidade da sua taxa de câmbio, para corrigir distorções provocadas por sua moeda, o iuan, no comércio internacional.
A promessa veio dias antes de o presidente Hu Jintao se encontrar, nos Estados Unidos, com o presidente Barack Obama. Os dois países são os principais protagonistas de uma guerra cambial, que tem provocado estragos em economias como o Brasil, onde as taxas de juros são elevadas para combater a inflação.
A flexibilização no sistema cambial chinês é um pleito dos Estados Unidos e de outros países ocidentais, que reclamam da perda de mercado para os produtos do país asiático.
Mas os EUA também têm uma grande parcela de culpa, porque vêm injetando bilhões de dólares na sua economia, com o intuito de tirá-la do atoleiro. Ao inundar o mundo de dólares, o governo norte-americano acaba contribuindo para a queda de preços, o que favorece as suas exportações e corrige um de seus graves problemas, o deficit comercial.
Desconfiança
;Reforçaremos a flexibilidade da taxa de câmbio e manteremos a taxa do iuan em um nível razoável e equilibrado;, indicou o Banco Popular da China em um comunicado. Hu Jintao será recebido por Obama no próximo 19 de janeiro. A expectativa é grande e poucos acreditam na real disposição da China de abrir mão de parte do mercado internacional.