postado em 08/01/2011 08:00
Escalado para atuar em uma das áreas mais sensíveis do governo, o novo ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, está empenhado em tirar do papel o plano que pretende levar banda larga barata a milhões de brasileiros. Em parceria com o setor privado, organizações civis, empresas públicas, estados e municípios, a estratégia é investir pesado em infraestrutura e forçar a queda dos preços dos equipamentos ao consumidor final. ;Temos de massificar a banda larga;, explica Bernardo, referindo-se à missão recebida da presidente Dilma Rousseff antes mesmo de sua posse.Prestes a sair da gaveta estão propostas de utilização das redes do setor elétrico e da Petrobras. As companhias telefônicas também deverão ser atraídas para o debate. A Telebrás, estatal ressuscitada no último ano de mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, terá papel fundamental, adianta o ministro: ;O temor do mercado é que ela vire a fornecedora exclusiva do governo federal, dos estados, de bancos públicos e de empresas, mas isso não está colocado;.
A reestruturação dos Correios, primeira grande canetada de Dilma no segundo escalão, é outro assunto espinhoso na ordem do dia do Ministério das Comunicações. A empresa, que em 2010 atravessou uma de suas mais graves crises de gestão, terá seu estatuto completamente reformulado. A intenção, com isso, é dar mais transparência às ações e melhorar o ambiente de governança interna, minimizando pressões partidárias pela ocupação de cargos. ;Mas não vamos abrir o capital. A empresa é pública com 100% da União;, completa o ministro.
A seguir, os principais trechos da entrevista de Paulo Bernardo ao Correio:
ENTREVISTA - PAULO BERNARDO
Banda larga a R$ 30 por mês?
Temos um plano, uma coisa elaborada que está sendo implementada. Achamos que é possível ampliar com associações e parcerias com as empresas do setor privado de telecomunicações ou mesmo com provedores regionais. Vamos fazer parcerias com órgãos públicos e prefeituras. A OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) tem locais com antenas e conexão. Poderia ter uma parceria. O importante é o seguinte: para um país que quer ser uma grande economia, e nós já somos uma grande democracia, se quiser ocupar lugares mais importantes no cenário internacional, a difusão em larga escala de novas mídias, de novas tecnologias, é essencial. Isso para a educação, para a saúde, para melhorar a produtividade no trabalho. Temos de massificar a banda larga. Até 2014 dá para ir para 60%, 80%.
Por que o serviço ainda é tão caro e ineficiente?
Estamos atrasados. Na Coreia fala-se em superbanda larga. Nós no Brasil começamos depois e temos de avançar com mais rapidez. Nesse momento, nossa referência é algo na faixa de 512 kbps ou 1 mega, o que não quer dizer que vamos parar por aí. Precisa ter investimento em infraestrutura, barateamento de equipamento. O MEC (Ministério da Educação) abriu uma licitação e o notebook vai sair por R$ 344. Se o MEC pode comprar, havendo larga escala, o computador pode ficar nessa faixa.
A internet é um caso à parte?
No caso da internet há falta de investimento e uma estratégia errada das empresas, que é de oferecer para pouca gente e cobrar caro, de concentrar em algumas áreas. São Paulo e Rio de Janeiro, que são mercados colossais, quando a gente vê há áreas das cidades que não têm a mesma densidade de cobertura. Queremos discutir isso. Queremos também discutir banda larga com as empresas de telefonia. E tem a Telebrás. Vamos fazer um acordo para utilizar as redes do setor elétrico e da Petrobras.
Qual o papel da Telebrás?
A preocupação do mercado é de que a Telebrás vire a fornecedora exclusiva do governo federal, dos estados, de bancos públicos e de empresas, mas isso não está colocado. Queremos banda larga. Se o mercado tivesse resolvido a questão não precisaríamos estar discutindo. A verdade é que eles não conseguiram ou não se interessaram em resolver. Tanto quanto for possível vamos fazer parcerias.
Quando isso vai acontecer?
Estamos pensando em quatro anos. Neste ano de 2011 temos condição de fazer um acordo com as empresas e definir o preço de R$ 35 ou de R$ 30. O que é preciso fazer? O que as empresas devem fazer?
O Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicacões (Fust) pode ser usado para custear o plano de banda larga?
Claro. Vale para uma série de programas.
O senhor está hoje à frente do ministério das privatizações. Há problemas em outras áreas, além desse da banda larga, que não foram sanados pelo mercado?
O sistema foi privatizado, isso está feito. Tem uma regulação. Acho que a gente tem de aperfeiçoar isso, a própria Anatel precisa aprimorar suas atividades. Mas aqui nós temos dificuldade de criticar a Anatel porque estamos em situação muito pior do que ela. A verdade é que a agência tem mais quadros técnicos do que o ministério.
Houve um sucateamento do Ministério das Comunicações?
Não houve uma atualização. Temos pouca gente. Tem de ter um reforço.
Por que as tarifas de celular são tão altas?
Comparando com o mercado internacional, os preços no Brasil são muito mais caros. Temos uma classe D em ascensão que está sedenta por acesso, mas precisa ter preço condizente.
É um problema de infraestrutura?
Precisa investir largamente. Temos um decreto tramitando na Casa Civil que determina o seguinte: todas as grandes obras de infraestrutura que o governo for fazer ou financiar, vamos incluir redes de fibra ótica no projeto. Por exemplo: vai fazer uma ferrovia, um gasoduto, uma linha de transmissão, já põe. Fica muito mais barato fazer isso durante a obra do que depois. O custo é muito maior depois.
As empresas de telefonia querem produzir conteúdo. O que o governo acha disso?
É uma tendência. Daqui a pouco, vamos receber televisão e outros serviços pelo celular. Precisa regular e há um projeto para isso. Tem de ter uma regulação.
Que tipo de relação o ministério quer ter com a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel)?
Vamos ter uma boa relação, o que não quer dizer que se tiver algum bate-boca... Já tive uma reunião com o Ronaldo Sardenberg (diretor da Anatel). Não temos nenhum problema. Acho que temos de prestigiar a Anatel.
A agência fala em nome do mercado e o ministério em nome do público?
A Anatel tem de regular e fazer cumprir a lei. Ela não é responsável por elaborar políticas públicas. Essa tarefa cabe ao Executivo. A Anatel está com uma mudança regimental interna tramitando, o que vai melhorar o funcionamento deles. Vamos conversar sempre, o que não quer dizer que às vezes não apareça uma divergência ou outra, o que é normal.
Quais os planos para os Correios?
Estamos mudando o estatuto dos Correios, que é baseado em um decreto-lei de 1969. Um exemplo: o conselho de administração da empresa é presidido pelo presidente dos Correios. Nenhuma empresa é assim. O presidente participa e o governo indica os outros membros. Tem ainda a determinação que as empresas estatais tenham representantes eleitos para os conselhos. Vai ser feito. Os Correios vão publicar balanços também. Vai dar uma modernizada na empresa.
A estatal será de capital aberto?
Não. Não vamos abrir o capital. A empresa é pública com capital 100% da União. O que está em discussão, tem de ser aprovado pelo Congresso Nacional, é a possibilidade de criar subsidiárias para explorar serviços correlatos, que pode ser até a montagem de uma empresa para fazer o transporte aéreo de cargas. Mas fizemos uma avaliação e chegamos à conclusão de que não há condições de fazer isso neste momento. Os Correios estão tendo dificuldades de fazer um concurso. A gente vai comprar avião? Vamos com calma.
A crise na estatal teve razões técnicas ou políticas?
Os Correios funcionam muito bem. Havia um problema de gestão, havia uma dificuldade de diálogo, a diretoria não tinha coesão e isso afeta a vida da empresa. Por isso a empresa não andava para lado nenhum.
Havia um movimento deliberado para asfixiar os Correios para depois forçar a venda?
Não sei. Não vi isso. Tem gente que fala, mas achamos o seguinte: havia problemas de gestão, defasagem tecnológica. Vamos arrumar rápido. Isso é muito mais fácil do que implantar o plano de banda larga.
Em relação a concessões de rádio, o que o governo pretende fazer?
A Constituição não permite que políticos tenham rádios ou televisões. O problema é que o cidadão põe no nome de outro e dificulta a fiscalização. Tem de fiscalizar com rigor. O que está na lei tem de ser cumprido.