Economia

Crescimento brasileiro se desloca dos grandes centros para cidades médias

postado em 16/01/2011 10:44
A cara do Brasil mudou. Verdadeiras Chinas de prosperidade, livres dos problemas do gigante oriental, como trabalho degradante e superpopulação, brotam no interior do país e descentralizam a riqueza para além dos grandes aglomerados urbanos. A substituição de Estados Unidos, Japão e Alemanha como os protagonistas mundiais pelos emergentes China, Índia e Brasil, se repete no âmbito interno. Hoje, em vez das metrópoles, as cidades médias são as locomotivas do crescimento econômico nacional. Com expansão, em alguns casos, a taxas superiores a 100% ao ano, esses municípios são o reflexo mais evidente do processo que levará a uma nova ordem econômica nacional.Condomínios residenciais disputam espaço com o setor industrial de Rio Verde (GO): descentralização econômica não tem volta

A estabilidade de preços e a ascensão da classe C ao mercado consumidor desencadearam pequenas revoluções industriais país afora, transformando cidades até então restritas à produção agrícola. A exemplo de Rio Verde (GO) e Unaí (MG), onde o campo já determinou o Produto Interno Bruto (PIB, soma de todas as riquezas), hoje o crescimento é puxado pelo setor de serviços e pela indústria. ;Conforme a economia amadurece, mais ela é puxada pelos serviços. Como nos Estados Unidos, nessas cidades começa a se consolidar o mercado local;, argumenta Fábio Romão, analista da LCA Consultoria.

Os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) evidenciam o fenômeno. Enquanto o Sul e o Sudeste, tradicionais polos de desenvolvimento, perderam participação no PIB nacional, o resto do país avançou. As regiões metropolitanas ; São Paulo (SP), Rio de Janeiro (RJ), Belo Horizonte (MG), Curitiba (PR), Porto Alegre (RS), Salvador (BA), Recife (PE), Fortaleza (CE) e Belém (PA) ; foram abatidas pelos mais graves casos de violência, degradação ambiental, ocupação irregular, trânsito caótico e infraestrutura saturada.

Os grandes conglomerados urbanos abrigam, juntos, cerca de 27% da carência habitacional no Brasil. Todos esses transtornos afetam sua capacidade de produzir e se manterem competitivos. ;As metrópoles constituem espaço estratégico devido à sua importância para o crescimento nacional, mas apresentaram o pior desempenho de produtividade nos últimos 15 anos;, avalia Diana Motta, pesquisadora do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

Problemas como a falta de espaço e o alto custo dos terrenos e aluguéis completam a situação de ;deseconomia;, nome dado por alguns especialistas ao momento em que o investimento em determinada cidade deixa de ser lucrativo por deficiências estruturais. Dados do Censo 2010 comprovam o ponto de vista de Diana. As cidades de porte médio, com população entre 100 mil e 500 mil habitantes, cresceram a uma taxa de 1,5% ao ano na última década, contra 1% das cidades grandes.

A descentralização econômica é um processo lento, mas sem volta. Basta observar municípios como Londrina (PR), Ribeirão Preto (SP), Uberlândia (MG), Natal (RN) e Teresina (PI). Na década de 1980, elas eram cidades médias, mas hoje subiram um degrau na hierarquia urbana para integrar o seleto grupo de 31 cidades grandes brasileiras. Quanto mais companhias migram para o interior, maior é a força atrativa para fora das grandes metrópoles. ;À medida que profissionais qualificados vão atuar nas empresas do interior, um novo potencial de consumo se forma, o que justifica novos investimentos;, explica Fernando Mantovani, diretor de operações da empresa de treinamento Robert Half no Brasil.

As cidades médias se apresentam como a alternativa mais lucrativa aos empresários. O PIB de Catalão (GO), por exemplo, cresceu 719,7% entre 1999 e 2008. A cidade de São Sebastião (SP) se expandiu 928,1% em igual período. Entre 2002 e 2007, o PIB das cidades médias cresceu 5,36% ao ano, enquanto as cidades pequenas registraram 3,84% e as grandes, 3,32%, em igual período. De cada R$ 1 produzido no Brasil, R$ 0,40 veio das cidades com população entre 100 mil e 500 mil habitantes. ;O padrão de desenvolvimento brasileiro está alterado;, constata Cláudio Salvadori Dedecca, professor de economia da Universidade de Campinas (Unicamp).

A capital paulista sofre com essa realidade. As montadoras de veículos, um dos principais agentes para a industrialização do ABC na década de 1970, agora preferem as cidades do interior do estado. Nos últimos anos, a Kia se instalou em Salto; a Toyota, em Sorocaba; a Hyundai , em Piracicaba e a Chery, em Jacareí. Sem contar com a cidade de São Paulo, o PIB do resto da unidade da federação alcança US$ 250 bilhões. Se fosse um país, o interior de São Paulo seria a 27; economia do mundo, à frente da Argentina. Quando excluídos todos os 39 municípios da área metropolitana, o PIB da região chega a US$ 146 bilhões, maior do que toda a riqueza produzida no Chile.

Mantovani, da Robert Half, revela sentir na prática os efeitos da nova ordem econômica brasileira. ;Atualmente, temos escritórios no Rio, em São Paulo e em Belo Horizonte. A concentração de empresas no interior de São Paulo, entretanto, criou a oportunidade de nos expandirmos. O plano é abrir, até o fim do semestre, um escritório na região;, diz. Na avaliação de Flavio Amary, vice-presidente do Sindicato das Empresas de Compra, Venda, Locação e Administração de Imóveis Residenciais e Comerciais de São Paulo (Secovi-SP), o crescimento do interior paulista ocorre de maneira sustentável. ;Ao contrário dos primeiros aglomerados, as cidades emergentes têm planos diretores bem definidos. Os problemas da expansão desordenada são mais bem conhecidos, assim como as formas de preveni-los;, comenta.

Dispersão
Estudos do pesquisador norte-americano Jeffrey Williamson sobre as desigualdades regionais indicam que, em um primeiro estágio de desenvolvimento, a redução dos custos de transporte leva ao aumento da concentração espacial, uma vez que as empresas aglomeradas podem atingir mercados mais amplos. Passada a fase de agravamento das diferenças regionais, entretanto, a atividade produtiva volta a se dispersar, porque as regiões enfrentam aluguéis mais caros e a contínua queda dos custos de transporte e telecomunicações torna a produção independente do território.

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