Economia

Blecaute em SP agrava a crise no Palácio do Planalto

postado em 09/02/2011 09:12
Edison Lobão, ministro de Minas e Energia, teve que explicar, mais uma vez, o motivo das falhasO blecaute de cinco minutos que atingiu na tarde de ontem 21 bairros da zona sul de São Paulo acabou servindo para esquentar o atual debate nacional sobre a eficiência e a segurança do sistema elétrico brasileiro. As recentes explicações dadas pelo Ministério de Minas e Energia sobre o apagão que atingiu o Nordeste na semana passada não satisfizeram a oposição nem mesmo o governo. Cinco dias depois do corte de fornecimento de energia em oito estados, deixando mais de 46 milhões de pessoas às escuras, a presidente Dilma Rousseff foi obrigada novamente a mudar sua agenda para reagir às críticas ao modelo criado, sob sua inspiração, há sete anos pela gestão petista.

Ainda irritada com a repercussão negativa, Dilma reuniu-se no fim da tarde de ontem com o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, e dirigentes do setor elétrico, cobrando um relato preciso sobre o que realmente causou o apagão nordestino. Dilma considerou ;insatisfatória; a explicação apresentada segunda-feira pelo secretário executivo de Minas e Energia, Marcio Zimmermann, e telefonou na manhã de ontem para Lobão. No entendimento da presidente, a população não teve explicação clara sobre o primeiro apagão do seu governo. O diretor-geral da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), Nelson Hubner, abandonou uma reunião para atender, às pressas, o chamado presidencial.

Antes da reunião, porém, às 15h21, a parcela mais nobre da capital paulista experimentava o caos que desligou elevadores e semáforos e até interrompeu pousos e decolagens no Aeroporto de Congonhas. A Eletropaulo, concessionária estadual responsável pelo fornecimento de energia elétrica, informou que houve apenas uma falha na transmissão de uma subestação, o que deixou 2,5 milhões de pessoas sem luz. A Companhia de Transmissão e Energia Elétrica Paulista (Cteep), responsável pela transmissão de energia informou, por sua vez, que um dos três transformadores da subestação Bandeirantes falhou.

Transparência
De novo, uma subestação gerou transtornos gigantescos. Dessa vez, contudo, a origem se deu sob a jurisdição do governo oposicionista do PSDB. Na segunda-feira, deputados do PSDB apresentaram à Mesa Diretora da Câmara requerimento para ouvir Lobão sobre as causas do apagão do Nordeste. Os parlamentares anunciaram que vão solicitar investigação ao Ministério Público, além de auditorias do Tribunal de Contas da União (TCU) e da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).

Aos olhos dos estudiosos do setor, a presidente Dilma acertou ao cobrar mais dados sobre o evento do Nordeste, ainda repleto de dúvidas. A justificativa de que houve apenas uma falha em um cartão de proteção do sistema, na subestação de Luiz Gonzaga, em Pernambuco, é até tecnicamente aceitável, mas insuficiente para explicar o tamanho dos seus desdobramentos. ;Eventos como o envolvendo a Chesf (Companhia Hidrelétrica do São Francisco) na sexta-feira geram grave preocupação à medida que revelam a fragilidade de um sistema grande e complexo;, disse Nivalde de Castro, coordenador do Grupo de Estudos do Setor Elétrico (Gesel), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Adriano Pires, professor da UFRJ e diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (Cbie), o apagão paulistano refletiu causas conjunturais, como o aumento da carga em tempos de verão. Mas ele ressalta que o tipo de falha ocorrida numa subestação de uma concessionária privada remete às mesmas causas dos grandes apagões de 2009 e 2011, marcados pela gestão estatal. ;Temos de rever o modelo elétrico brasileiro, que inibe investimentos em manutenção e modernização, além de falhar na fiscalização dos serviços de distribuição e transmissão;, criticou.

A Aneel rebateu as críticas de falta de fiscalização e informou que a autarquia realiza checagens periódicas nas geradoras, nas distribuidoras e nas transmissoras em todo o país. ;Essa atividade segue um cronograma anual e na modalidade técnica-comercial avalia a manutenção dos equipamentos, a operação e o atendimento aos clientes;, afirmou o órgão. Números da agência mostram que, em 2010, foram feitas, no total, 1.105 ações desse tipo. (Colaborou Rosana Hessel)


Financiamento
O Plenário do Senado Federal ampliou em R$ 90 bilhões a linha de crédito do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para o setor elétrico, passando de R$ 44 bilhões para R$ 134 bilhões. Esse financiamento possui taxas subsidiadas pelo governo e deve aumentar a participação da iniciativa privada na geração de energia e permitir o andamento das obras das usinas de Jirau e Santo Antônio, em Rondônia, e a construção de Belo Monte, no Pará.


Um alívio a Furnas

Rosana Hessel

Em meio ao turbilhão provocado pelo apagão que aconteceu em oito dos nove estados do Nordeste na semana passada, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) deu ontem uma prova de simpatia a Furnas Centrais Elétricas e reduziu em R$ 10,4 milhões a multa de R$ 53,79 milhões aplicada contra a estatal em razão da pane ocorrida em 10 de novembro de 2009 e que deixou 18 estados no escuro.

De acordo com a agência, quatro infrações foram cometidas por Furnas no incidente de 2009. A autarquia negou o recurso da estatal, mas a redução da multa para R$ 43,39 milhões ocorreu porque a diretoria decidiu juntar três infrações em apenas uma. Esse agrupamento das penalidades foi uma recomendação da Procuradoria-Geral da agência.

O diretor Romeu Donizete Rufino, relator do processo, informou que, apesar da redução do valor, a multa continua sendo a maior aplicada a uma concessionária do setor elétrico em toda a história do órgão. A decisão da diretoria colegiada, que não foi unânime, é final e não cabe mais recurso. ;Não há mais recurso na esfera administrativa, mas nada impede um processo judicial;, disse Rufino. Segundo ele, o pagamento da multa deverá ocorrer em 10 dias úteis, a partir da publicação do despacho da Aneel no Diário Oficial da União.

O único voto contrário à decisão de redução da multa foi o do diretor Edvaldo Alves Santana, que, curiosamente, foi o relator do processo que favoreceu as distribuidoras de energia e não determinou a devolução dos mais de R$ 7 bilhões tomados indevidamente da conta do consumidor entre os anos de 2002 e 2009.

Em relação à interrupção no fornecimento de energia que atingiu oito estados do Nordeste na noite de quinta-feira e na madrugada de sexta, Rufino disse que ainda não foi aberto um processo oficial de fiscalização. A área técnica da agência, segundo ele, aguarda os relatórios produzidos pela Chesf e pelo Operador Nacional do Sistema (ONS).


Índios protestam contra Belo Monte

A novela que envolve a hidrelétrica de Belo Monte teve mais um capítulo ontem. Cerca de 250 índios e ativistas protestaram em frente ao Congresso Nacional contra a licença da construção da usina, no rio Xingu (PA), que deverá custar mais de R$ 20 bilhões aos cofres públicos. Depois de três horas, o protesto terminou em promessas.

O objetivo dos manifestantes era entregar à presidente Dilma Rousseff um documento listando os motivos contra a execução do projeto. As lideranças acabaram sendo recebidas, no início da tarde, pelo secretário executivo da Secretaria-Geral da Presidência, Rogério Sotilli, que se comprometeu a levar o relato à presidente.

As obras da usina deveriam ter sido iniciadas em dezembro do ano passado, mas houve atrasos. A licença ambiental que liberou o desmatamento para a instalação do canteiro de obras só saiu no mês passado. O índio Takwyrey, 29 anos, representante da tribo dos kaypós, demonstrou irritação com o projeto: ;Nós não queremos apenas bom tratamento. Precisamos de atitudes. A construção da Belo Monte vai afetar todas as comunidades que moram em volta do rio. Vivemos de pesca e caça e isso vai acabar;. Segundo ele, a hidrelétrica afetará as populações ribeirinhas que habitam as margens do rio.

Polêmica
A ativista Sheila Yakarepi Juruna, de uma aldeia da região, também criticou a obra. ;Eles vão continuar com a Belo Monte e não vão nos ouvir. Vamos partir para a luta lá na nossa área mesmo;, disse. O representante do movimento Xingu Vivo Para Sempre Lázaro Versosa, que mora em Altamira (PA), uma das regiões comprometidas, afirmou que os movimentos sociais estão se organizando para pressionar o governo ainda mais.

O leilão da hidrelétrica de Belo Monte ocorreu em 20 de abril do ano passado, em meio a uma guerra de liminares na Justiça. O processo de licitação só pôde ser iniciado depois que o Tribunal Regional Federal da 1; Região (TRF-1) cassou a ação expedida na noite anterior pela Justiça Federal do Pará. Protestos de ambientalistas, de indígenas e da sociedade civil marcaram a licitação. Ativistas do Greenpeace jogaram esterco na porta da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).

Participaram da concorrência dois consórcios: um liderado pela Companhia Hidroelétrica do São Francisco (Chesf), denominado Norte Energia, e outro encabeçado por Furnas e Eletrosul, batizado de Belo Monte. Surpreendentemente, o leilão durou apenas sete minutos, já que o lance oferecido pelo Norte Energia foi mais de 5% inferior à proposta do grupo Belo Monte. O grupo vencedor não foi anunciado porque outra liminar impedia a homologação do leilão e a divulgação dos detalhes. O resultado final só saiu três horas depois. Belo Monte será a segunda maior hidrelétrica do país, atrás apenas de Itaipu. A usina terá 11.233 megawatts de potência instalada e 4.571 megawatts médios.


Royalties subirão

O Ministério de Minas e Energia estimou ontem que o setor de mineração deverá receber US$ 350 bilhões em investimentos nos próximos 20 anos, dos quais US$ 80 bilhões serão em infraestrutura e logística. A maior parte dos recursos englobam pesquisa para expansão ou descoberta de jazidas, exploração e transformação mineral. Os números fazem parte do Plano Nacional de Mineração 2030 lançado pelo ministro Edison Lobão, que destacou o faturamento do setor no país no ano passado: US$ 157 bilhões, representando 25% das exportações brasileiras (US$ 51 bilhões).

Segundo Lobão, esse é o quarto plano nacional de mineração, mas o primeiro com horizonte de duas décadas. ;O documento será um GPS que norteará as diretrizes para os investimentos no país nessa área;, afirmou. Para o ministro, fatos importantes colocam o Brasil na elite do setor de energia e mineração global, como as reservas de urânio, que permitirão a ampliação das usinas térmicas nucleares. As reservas do mineral somam 1,3 milhão de toneladas e estão avaliadas em US$ 100 bilhões.

O plano considera o crescimento médio de 5,1% na economia brasileira e de 3,8% no Produto Interno Bruto (PIB) mundial, em média, até 2030. Prevê ainda que o consumo per capita de produtos de base mineral no Brasil triplicará até 2030, atingindo um patamar próximo ao de países desenvolvidos. O setor terá uma para o novo código de mineração, outra para a cobrança de royalties e será criada uma agência reguladora. No caso dos royalties, o ministro não descartou o aumento dos royalties sobre a mineração, hoje em 2%, bem abaixo da Austrália, por exemplo, onde é de 7% .

;Há uma carga tributária que incide sobre o setor e estamos fazendo um levantamento conjunto com a Fazenda sobre o total desses impostos. Não podemos retirar a competitividade do produto brasileiro. Se tivermos que aumentar os royalties, faremos dentro de certas medidas que não prejudiquem a exportação;, assegurou.

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