Economia

Brasil e China ajustam diferenças para o comércio bilateral ser vantajoso

postado em 13/02/2011 08:29
0 governo Dilma Rousseff iniciou um processo de revisão da parceria estratégica com a China, buscando reduzir distorções nas trocas comerciais. Com a percepção mais clara de que o mercado chinês representa ameaça e oportunidade extremas, empresários e autoridades debatem formas de conter efeitos nefastos dos importados, além de agregar mais valor às exportações para o gigante asiático. Analistas ligados aos dois países concordam com a necessidade de buscar o equilíbrio na relação comercial, mas apontam saídas diferentes. Daniel Yin Lau, diretor do China Desk, divisão de consultoria especializada da KPMG, acredita que o cenário é favorável a uma maior complementaridade entre os dois mercados, considerando o impacto da ascensão de consumidores de classe média chinesa. E para o Brasil, o saldo deve continuar positivo, ao se considerar a procura maior por alimentos, energia e minério. "Nos últimos 10 anos, as exportações brasileiras para a China avançaram 30 vezes, enquanto na mão inversa subiram 18 vezes", cita o executivo. Ao seu ver, embora qualquer comércio exterior sempre revele ganhadores e perdedores, "já existe um ponto de equilíbrio bilateral". Uma prova de que as trocas alcançaram patamar sustentável está nos números do investimento direto chinês aqui, que chegou a US$ 10 bilhões no ano passado, ante US$ 215 milhões em todo o período 2001-2009. Ida a Pequim Para Lau, enquanto a China consumir cada vez mais matérias-primas e os mercados futuros seguirem especulando com commodities, o Brasil continuará obtendo lucros na parceria com a segunda maior economia do mundo, que cresceu 10,3% no ano passado e é o maior fator de pressão dos preços. "A tendência é de a demanda e os preços continuarem subindo", estima. O minério de ferro teve valorização de 144% na pauta de exportação brasileira no ano passado, afastando o risco de deficit. Para Rodrigo Tavares Maciel, sócio da Strategus Consultoria, a agenda brasileira para a China precisa ser reformulada no rumo do diálogo mais construtivo entre os dois países. Nesse contexto, ele acredita que a presidente Dilma está consciente da importância da relação sino-brasileira e focará reparos em sua primeira visita a Pequim, prevista para abril. Apesar de mecanismos institucionais de calibragem de comércio vigentes desde 1993, o especialista acredita que o acesso à tecnologia e ao crédito e as elevadas escalas continuarão sustentando a discrepância entre os valores de manufaturados. "A competição entre produtos chineses e brasileiros no mercado doméstico não está determinada só pelo valor das moedas dos dois países, mas, sobretudo, pelas condições estruturais de cada lado", ressalta. Sem culpa Kevin Tang, diretor da Câmara de Comércio e Indústria Brasil China (CCIBC), vê ainda outros fatores de competitividade em favor dos chineses, como os atuais investimentos bilionários em educação, pesquisa e infraestrutura. "Além de combater o velho custo Brasil, temos de acompanhar o salto de qualidade que a China está preparando para os próximos anos", diz. Ele prevê uma aceleração da "invasão do bem" de marcas chinesas no Brasil, com destaque nas áreas de energia e mineração. Na avaliação de Tang, os chineses "não são culpados" das exportações brasileiras estarem concentradas em insumos básicos. Com três quartos (75%) das vendas para a China atreladas a apenas três commodities (minério de ferro, soja e petróleo bruto) e 84% em matérias-primas, mudanças significativas são improváveis. Por outro lado, ele acha que barreiras alfandegárias não seriam soluções efetivas para o avanço dos importados chineses, mais de 90% de manufaturados, defendendo como alternativa um esforço de modernização da indústria. "Caso contrário, o país pode ser invadido também por produtos de outros países asiáticos, como Índia, Vietnã e Tailândia", alerta. Maciel pondera que será difícil para a indústria brasileira encontrar brechas importantes para participar do crescente mercado consumidor chinês. "Podemos até negociar acordos para melhorar o perfil das exportações, mas não dá para ignorar as realidades envolvidas." O consultor descarta fechamento da fábrica da Embraer na China e ainda vê consolidação de marcas do Brasil instaladas lá, como as indústrias Weg (motores elétricos) e Embraco (compressores). Interferência dos EUA Assessores econômicos do governo chinês criticaram a tentativa dos Estados Unidos de angariar apoio do Brasil e da Índia contra a política cambial de Pequim. A visita ao Brasil, na semana passada, do secretário do Tesouro norte-americano, Timothy Geithner, seria a prova dessa incitação. Geithner pediu à presidente Dilma Rousseff um esforço para convencer os chineses a permitirem uma maior valorização de sua moeda, o iuan. Acostumados a enfrentar a pressão dos norte-americanos, os chineses estranham pedidos por um fortalecimento de sua moeda vindo de nações em desenvolvimento. Mais do que isso, duvidam que Brasil e Índia tenham mais sucesso na empreitada do que a Casa Branca. O presidente do Banco Caentral indiano, Duvvuri Subbarao, disse na semana passada que o iuan artificialmente desvalorizado prejudica seu país. E Dilma, pressionada pela alta consistente do real, apontou o iuan subvalorizado como "ameaça", com importações vindas da China prejudicando a competitividade da indústria. "A raiz do problema da alta das moedas de países emergentes não é a China, mas a política monetária afrouxada dos EUA", rebateu Chen Fengying, diretor do Instituto de Economia Mundial do Instituto de Relações Internacionais Contemporâneas, em Pequim. Resposta "Sabemos que a inflação da Índia é alta e que o Brasil está elevando juros, mas como a política cambial da China pode resolver seus problemas?", provoca Chen. Críticos acusam a China de dar aos exportadores vantagem desleal ao manter o iuan barato. Song Hong, pesquisador do Instituto de Economia Mundial da Academia Chinesa de Ciências Sociais, acredita que o governo chinês vai responder os emergentes com as mesmas explicações dadas a Washington. Para He Maochun, professor da Tsinghua University, "não importa se a pressão vem de países desenvolvidos ou emergentes, o governo chinês não deve ceder". A China tem de acelerar reformas fiscais para tributar poluidores e racionalizar o consumo de economia, com vista à perigosa dependência de fornecimento externo, disse na semana passada o vice-primeiro-ministro Li Keqiang, provável sucessor do primeiro-ministro Wen Jiabao em 2013. Li enfatizou o quanto a questão energética é crítica para a política externa e as metas econômicas da China. Ele adianta que o gigante asiático não poderá se livrar da dependência do carvão - matéria-prima responde por 70% das necessidades energéticas do país -, apesar da crescente pressão internacional em razão das emissões de gases do efeito estufa. De biquínis a máquinas Foi-se o tempo em que os importados chineses vendidos no Brasil não passavam de quinquilharias eletrônicas. De biquínis a uniformes do Exército, passando por máquinas para a indústria siderúrgica ou de transformação, eletrodomésticos, tecidos e calças jeans, os artigos made in China estão em todos os lugares. Com preço supercompetitivo, vêm tirando espaços dos produtos nacionais dia após dia.

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