postado em 21/02/2011 08:41
As acusações de leniência com a inflação que tanto pesavam contra Henrique Meirelles nos últimos meses de 2010 voltaram a assombrar o Banco Central, agora comandado por Alexandre Tombini. Relatórios de instituições financeiras afirmam que a autoridade monetária no governo Dilma Rousseff abandonou sua postura conservadora em troca de estratégias menos ortodoxas. A palavra-chave da nova administração, segundo esses documentos, é prudência ; termo que para o mercado abrange uma série de ferramentas complementares ou, em alguns casos, alternativas ao aperto na taxa básica de juros (Selic). Com o reposicionamento estratégico, o Brasil entrou para o grupo de países emergentes apontados como experimentalistas e que tentam evitar a carestia sem pesar nos juros.Desde que começou a implementar medidas de cautela como uma forma a mais de conter a consumo, o BC vem atuando fortemente para tentar convencer os agentes do sistema de que está atento à inflação e não dará trégua ao repique de preços. A despeito da difícil herança deixada por Meirelles, que evitou subir juros no ano passado por interesses políticos ; o que influenciou pesadamente os indicadores de 2010 ;, o banco tem tentado deixar claro que vai brigar pelo poder de compra do brasileiro.
Para Maurício Molan, economista do Santander, mesmo com discurso garantindo que o dever do BC será cumprido plenamente, houve uma mudança no padrão de comportamento da instituição quando se compara o ajuste monetário realizado em 2008 com o novo ciclo de alta da Selic iniciado neste ano. Em um relatório, Molan compara os dois períodos. Segundo ele, há três anos o cenário econômico era bem mais favorável que o atual, com menos riscos e incertezas e, ainda assim, o BC preferiu adotar medidas prudenciais a iniciar o aperto monetário com elevação da Selic.
Também teria deixado as expectativas se deteriorarem intensamente. O cenário, conforme análise do economista do Santander, evidencia um Banco Central mais tolerante com a inflação. ;Expectativas e demanda doméstica em alta configuram um ambiente sensível para um Copom (Comitê de Política Monetária) com reputação arranhada pela discrepância entre o discurso otimista construído ao longo do segundo semestre de 2010 e a dinâmica dos preços no mesmo período;, reforça Molan em um de seus estudos recém-divulgados.
Emergentes
Além de Maurício Molan, uma parte considerável do mercado avalia que as medidas prudencias encampadas pelo BC neste início de 2011 são sinais claros dessa tolerância. Atualmente, seis países emergentes ; mais destacadamente que outras nações ; se comportam mais ou menos da mesma maneira quando o assunto é política monetária. São eles: Peru, Rússia, Israel, Turquia, China e, mais recentemente, Brasil. ;O recomendável para esses países é, de qualquer forma, subir os juros. Na medida em que vai esgotando a capacidade ociosa e com as commodities (matérias-primas produzidas e comercializadas em escala mundial) subindo é inevitável. A inflação vai bater;, justifica João Pedro Bumachar Resende, economista do ItaúUnibanco.
Um respeitado integrante do mercado financeiro reforça que o Banco Central brasileiro está fazendo experimentalismos e lança dúvidas sobre a eficácia das ações assumidas até agora. ;É cedo para fazer uma crítica mais ferrenha. As medidas prudenciais adotadas ainda estão em fase de experiência. O que estamos vendo é que está ocorrendo um esforço para tirar peso do instrumento convencional de política monetária, que é a Selic, mas sem abandoná-la completamente;, avalia o analista que prefere o anonimato.
A crítica mais contundente feita pelos analistas tem sido direcionada às normas restritivas de crédito anunciadas ainda em dezembro do ano passado. Com forte impacto sobre o volume de concessões (queda de 17,1% em pouco mais de um mês) e sobre as taxas de financiamento (que subiram de 44% ao ano para 49% entre dezembro e janeiro) o mesmo efeito não foi verificado sobre a inflação. Em janeiro, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ficou em 0,83%. Na época, Henrique Meirelles havia calculado que as ações teriam um impacto equivalente a um arrocho na Selic entre 0,75 ponto percentual e 1 ponto percentual. Técnicos da autoridade monetária, porém, têm rebatido constantemente os ataques, afirmando que os efeitos demoram a se propagar pela economia e que em breve os efeitos serão sentidos. Na visão de economistas, o BC está tentando frear a inflação dos alimentos e dos serviços, itens que mais pressionam o custo de vida, por meio de limitações ao crédito. Para esses mesmos analistas, se o experimentalismo do Banco Central não funcionar, o remédio terá de ser amargo mais à frente.
Esforço turco
A Turquia é o país que tem usado mais radicalmente as medidas prudenciais, mas João Pedro Bumachar Resende, do ItaúUnibanco, explica que ainda é cedo para avaliar se elas terão sucesso. ;Lá, eles subiram compulsórios e baixaram juros;, afirma o especialista. Em função do derretimento do dólar frente a diversas moedas pelo mundo, as ações menos agressivas dos bancos centrais devem se tornar cada vez mais comuns, já que as economias querem evitar a atração exagerada de capital estrangeiro e a supervalorização de suas divisas.