Economia

Golpistas enganam os consumidores mais atentos durante telefonemas

Estado de Minas
postado em 28/02/2011 10:10
Marinella Castro
Paula Takahashi

Raquel Hyllege quase foi vítima de golpe, mas desconfiou e não cedeu aos apelos da suposta funcionária da empresaSe a oferta é grande, o melhor mesmo é desconfiar. Ao atender telefonema de um vendedor muito convincente, com respostas na ponta da língua, oferecendo viagens, assinaturas de revistas, premiações referentes a pontos no cartão de crédito e até empréstimo bancário, o consumidor deve acender o alerta e não divulgar nenhum dado pessoal. Antes de fornecer o número do cartão para ter acesso aos benefícios prometidos, é preciso certificar que o contato não está por trás de uma fraude. Somente no ano passado, os golpes que utilizam como ferramenta os cartões de crédito, movimentaram cerca de R$ 320 milhões no Brasil. As estimativas são do setor financeiro, que monitora o impacto das fraudes no segmento.

No país, os golpistas se tornam cada vez mais criativos, a ponto de deixar na dúvida até mesmo consumidores bem perspicazes. A modalidade que oferece troca de pontos acumulados no cartão de crédito por premiações é uma nova febre. Como o mercado de cartões é dominado por duas grandes bandeiras, ficou fácil, com um simples blefe, acertar os consumidores. Pelo telefone, é iniciada a venda de falsos serviços, que têm como alvo o número do cartão e CPF do consumidor. A principal dica é saber que bancos e operadoras de cartões de crédito não entram em contato com seus usuários, a menos que uma comunicação já esteja em curso, tendo sido iniciada pelo próprio cliente.

Preocupada com problemas de saúde na família, a dona de casa Ivone Cunha foi surpreendida pelo telefonema de uma suposta vendedora da Editora Globo. Geralmente, a dona de casa é bastante astuta, mas neste dia específico, acabou caindo na lábia da golpista, o que lhe rendeu dor de cabeça e preocupações. ;Foi lançada uma cobrança no cartão de crédito da minha mãe, como se ela tivesse feito a assinatura de revistas;, conta a produtora de eventos Jaqueline Cunha, filha da dona de casa. Segundo Jaqueline, no telefonema, a suposta vendedora anunciava que a dona de casa tinha pontos acumulados no cartão Visa, que poderiam ser trocados por prêmios, desde que fossem feitas assinaturas, com valor superior a R$ 400.

A fraude foi rapidamente descoberta. O número deixado para contato com a ;vendedora; era falso. Jaqueline também constatou que sua mãe não tinha programa de pontos no cartão, assim, o valor lançado na fatura foi estornado. ;O que achamos estranho foi o vendedor ter conseguido lançar o débito no cartão de crédito.; Segundo informou a Editora Globo, ex-assinantes é que recebem telefonemas em casa. Em outros casos, o contato feito não é por parte da empresa. A editora não esclareceu, no entanto, o fato de o débito ter sido lançado na fatura da consumidora com a bandeira da empresa.

Apesar de ser casos de polícia, os golpes representam uma preocupação para as entidades de defesa dos consumidores. ;No caso dos cartões de crédito, os clientes têm direito à restituição dos valores. Os bancos são responsáveis solidários;, aponta Lillian Salgado, advogada da Associação Nacional dos Consumidores de Crédito (Andec). Segundo ela, o consumidor não deve fornecer seus dados por telefone. Só devem divulgá-los a empresas de sua confiança. A advogada ressalta, ainda, que é dever das instituições zelar pelo cadastro de seus clientes, e que o hábito de ligar para a residência dos consumidores, oferecendo qualquer tipo de produto, é uma prática abusiva, prevista no Código de Defesa do Consumidor.

Sem acesso

A gerente de relações corporativas da Visa Brasil, Sabrina Sciama explica que a operadora não tem acesso ao banco de dados de seus usuários. ;A fatura é enviada ao cliente pelo banco.; Segundo ela, o fato explica porque as operadoras não fazem contato com o consumidor. Ela reforça que a única forma de um portador de cartão de crédito receber telefonema da operadora é se ele tiver iniciado um contato prévio. E o que o sistema financeiro tem feito para proteger seus clientes? De acordo com a gerente da Visa Brasil, existe espaço reservado no site da operadora para dicas de segurança. A operadora também trabalha junto aos bancos, que têm áreas específicas para tratar fraudes. O lançamento dos cartões com chip também são uma tentativa para conter os golpistas.

Há cerca de seis meses o engenheiro Lúcio Fernandes recebeu em casa o telefonema de uma suposta funcionária de sua operadora de crédito. ;De forma bem clara e convincente ela me alertava que aquele era o último dia para trocar meus pontos no cartão de crédito por eletrodomésticos. No momento de fornecer o número do cartão, fiquei receoso e desisti. Preferi perder a suposta troca;, conta. ;Em muitos casos, estas pessoas não têm os dados dos clientes. Tentam um blefe;, alerta Sciama.

Facilidades devem levantar suspeitas

A aparente facilidade criada por empréstimos contratados por telefone também tem aberto brechas para golpes. Sem necessidade de avalista ou consulta ao SPC e Serasa, os estelionatários exigem apenas um depósito antecipado de parte do valor do empréstimo, em geral de cerca de 10%, para que o montante total seja liberado. ;Onde já se viu uma pessoa que está precisando de dinheiro ter que fazer um depósito? Isso não existe;, afirma o coordenador do Procon Assembleia, Marcelo Barbosa.

A contratação desse serviço por telefone é totalmente desaconselhada pelas instituições de defesa do consumidor. ;Esse tipo de negócio só deve ser realizado em instituições financeiras autorizadas pelo Banco Central e pessoalmente;, afirma Barbosa. Na grande parte dos casos, a suposta financeira não informa CNPJ, telefones e endereço físico, dificultando qualquer contato posterior. ;O que esses golpistas fazem é ligar de celulares pré-pagos, de difícil rastreamento. Eles informam contas de laranjas, que depois são encerradas;, explica Marcelo.

Outra prática comum tem sido o envio de mensagens em aparelhos celulares com o anúncio de que o dono daquela linha foi contemplado com um prêmio. Para resgatá-lo, normalmente é exigida a compra de cartões de recarga e o repasse dos números, ou mesmo depósito de uma determinada quantia.

O papel dos Procons tem sido o de orientação e prevenção. Caso seja configurado o golpe, entra em cena a Delegacia de Falsificações e Defraudações, uma vez que o caso passa a ser tratado como crime. ;Nestas situações, a pessoa deve procurar a delegacia para lavrar o boletim de ocorrência. Fazemos o registro e a análise e, se for configurado golpe, é instaurado inquérito para apuração dos fatos;, explica o chefe do Departamento de Investigação de Crimes Contra o Patrimônio da Polícia Civil, Islande Batista. ;Vamos então em busca dos golpistas e, caso ele seja identificado e haja elementos para acusação, podemos abrir representação judicial para prisão temporária;, acrescenta. Em média, 60% dos casos são apurados, e a pessoa é ressarcida dos prejuízos sofridos. ;Mas os mais difíceis de identificação são os golpes por telefone;, pondera Batista.

Lista telefônica

Muito comum há cerca de três anos, o golpe da lista telefônica ainda assombra os comerciantes. Este ano, a gerente operacional de uma imobiliária, Raquel Hyllege Lima, recebeu uma ligação de uma atendente que se identificou como funcionária de uma empresa que presta serviço de lista telefônica. ;Ela disse que precisava atualizar os cadastros da empresa e que tudo seria gratuito. Foi, então, enviado um fax, mas como sempre leio com cuidado, mesmo com a pressão dela para que eu apenas assinasse e enviasse de volta, percebi que estavam descritos alguns valores;, lembra. Foi aí que Raquel desconfiou da abordagem. ;Dei uma desculpa qualquer e não assinei. Depois descobri que era golpe;, conta.

Caso tivesse assinado e remetido o fax, hoje a gerente operacional estaria na mira de cobranças, pois teria firmado um contrato com a empresa. ;As pessoas são levadas a entender que é apenas uma atualização de dados cadastrais, mas estão, na verdade, contratando o serviço. É uma publicidade enganosa;, explica Marcelo Barbosa.

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