Economia

Dilma e Bradesco acertam troca de Roger Agnelli, presidente da Vale

Governo busca, agora, substituto à altura

Marta Vieira - Especial para o Correio
postado em 24/03/2011 07:00
O presidente da Vale, Roger Agnelli, não terá o seu mandato renovado pela Assembleia Geral de Acionistas da mineradora, marcada para 19 de abril. A decisão foi sacramentada no início do ano, quando a presidente Dilma Rousseff e o presidente do Conselho de Administração do Bradesco, Lázaro de Mello Brandão, fecharam acordo para substituir o executivo, que completaria 10 anos à frente da maior empresa privada do país em julho. Desde então, as portas do Palácio do Planalto e dos ministérios mais importantes se fecharam para Agnelli. Nem mesmo os seus telefonemas são atendidos.

Dilma só não encontrou ainda o substituto para o presidente da Vale, que, apesar do desgaste, deseja fazer o seu sucessor ; ele defende o nome de um de seus vices, José Carlos Martins. Dentro do governo, foram cogitados os nomes de Nelson Barbosa, secretário executivo do Ministério da Fazenda, e de Luciano Coutinho, presidente do presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Mas a chefe do Executivo já demonstrou o interesse em ter os dois economistas próximos dela, à disposição para outras missões. Segundo o mercado, são fortes candidatos ao comando da Vale Antonio Maciel Neto, presidente da Suzano, e Fábio Barbosa, presidente do Santander.

O clima é de apreensão entre os diretores e funcionários da Vale. A visão é de que a decisão do governo de destituir Agnelli é um processo de intervenção branca, uma forma indireta de reestatizar a empresa. Há um processo de rebelião em curso e o grupo de executivos poderá renunciar após a troca na presidência da mineradora. Funcionários estão, inclusive, organizando protestos, com sinal de luto, e um abaixo-assinado para tentar reverter a decisão de Dilma. Em 21 de maio, termina o mandato da diretoria da Vale, que é renovado anualmente.

Silêncio
O desgaste de Agnelli aumentou nesta semana, pois o governo o acusou de ter sido o responsável por vazar a informação de que o ministro da Fazenda, Guido Mantega, teria conversado com Lázaro Brandão, do Bradesco, para confirmar a substituição do executivo. Aos amigos, o presidente da Vale negou qualquer ligação com o assunto. Ele, inclusive, fez um voto de silêncio até que toda a confusão seja superada. Mas não esconde a decepção pela troca de comando da segunda maior mineradora do mundo estar se dando por questões políticas.

Apesar dos bons resultados apresentados pela gestão Agnelli, pesaram contra ele desavenças desde 2008 com o governo, que participa do bloco de acionistas majoritários da Vale por intermédio do BNDES e de fundos de pensão de estatais liderados pela Previ (dos funcionários do Banco do Brasil). Com o Bradesco e a japonesa Mitsui, eles detêm a maior parte das ações da Valepar, a holding que controla a mineradora.

Para o Bradesco, é vital ficar ao lado do governo. Desde que perdeu o posto de maior banco privado do país para o Itaú Unibanco, a instituição com sede na Cidade de Deus, em Osasco (SP), firmou uma série de parceiras estratégicas com o Banco do Brasil, inclusive no continente africano. Além disso, o Bradesco pretende renovar a parceria com os Correios, que vence no fim do ano, para continuar administrando o Banco Postal.

Cobiça
O próprio Agnelli tem admitido a cobiça por seu cargo. Seus ganhos estão estimados em US$ 20 milhões por ano. Em outubro do ano passado, ele criticou setores do PT que estariam ávidos por ganhar espaço na companhia. ;Tem muita gente procurando uma cadeira. E é geralmente gente do PT;, chegou a afirmar. Sob seu comando, entre 2001 e 2010, a Vale ampliou a suas receitas de US$ 4 bilhões para US$ 40 bilhões e o lucro, de US$ 3 bilhões para US$ 15 bilhões. Mas a maior mudança ocorreu no valor patrimonial, que saltou de US$ 7 bilhões para US$ 176 bilhões, e na atuação internacional.

Conhecido pelo estilo durão, Agnelli desperta sentimentos que vão da admiração à raiva nas relações com colegas de profissão e de comando na Vale, governadores e, especialmente, prefeitos das cidades mineradoras. Deles vem a cobrança pelo ;pagamento justo; em royalties pela exploração mineral, além de empregar recursos para minimizar os efeitos drásticos da atividade sobre o meio ambiente e garantir a infraestrutura que essas cidades não têm ou não criam.

Para tentar aplacar um dos principais focos de insatisfação do governo, que cobra mais investimento da Vale no país, a diretoria da Vale tem apresentado números recentes. Aristides Corbellini, diretor de Siderurgia, lembra que já foram contratados os fornecedores da Aços Laminados do Pará (Alpa), em Marabá. O pacote da Vale para o setor soma US$ 21 bilhões até 2015. ;A Alpa é velho desejo do povo paraense, que vai gerar milhares de empregos;, disse ao Correio, lembrando que projetos siderúrgicos ;costumam empregar mais; do que a área petrolífera.

GUIDO MANTEGA SE EXPLICA À CÂMARA
A Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara decidiu convidar o ministro da Fazenda, Guido Mantega, a prestar esclarecimentos sobre eventual interferência do governo na Vale ; leiam-se pressões para a substituição do presidente da companhia, Roger Agnelli. O requerimento do deputado Mendonça Filho (DEM-PE) era por uma convocação, mas, por acordo, os membros aprovaram apenas um convite. Assim, o titular da Fazenda não será obrigado a comparecer. O autor da proposta viu ;capricho intervencionista; de Mantega no episódio, já que a Vale tem tido bons resultados. Na terça-feira, o deputado José Otávio Germano (PP-RS) também apresentou à Comissão de Minas e Energia requerimento para uma audiência pública com mesma finalidade. ;A informação causou estranheza. Se confirmada, caracterizará intervenção do Poder Federal na esfera privada;, alegou.

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