postado em 19/04/2011 08:00
Sob o fogo cruzado de médicos e operadoras de planos de saúde, os usuários que buscaram atendimento ontem em Brasília, mesmo com suas mensalidades em dia, foram surpreendidos com a cobrança de uma taxa de R$ 60 por consulta. O ônus é mais um capítulo da briga dos médicos contra as operadoras por um a reajuste de seus honorários ; eles não concordam com o valor médio de R$ 30 pago pelos convênios. O pretexto alegado foi o da entrada em vigor de uma resolução do Conselho Regional de Medicina do Distrito Federal (CRM-DF), que estabelece mudanças na forma como as empresas remuneram os profissionais. Em protesto por um reajuste no valor das consultas, médicos de todo o país fizeram paralisação no último dia 7.
O CRM-DF argumentou que seis planos não se adaptaram à medida, levando seus afiliados a se recusarem a prestar atendimento aos clientes dos convênios Amil/Medial, Bradesco, Sul América, Golden Cross, Bradesco Saúde, Assefaz e AGF que não aceitassem pagar a taxa extra. As operadoras, por sua vez, desaprovaram a decisão, que, segundo elas, foi praticada de forma unilateral pelos médicos.
O valor adicional fez com que muitos pacientes desistissem do atendimento. A operadora de áudio Meire Aparecida da Silva, 29 anos, tentou uma consulta com um clínico-geral por meio da Golden Cross, mas diante da cobrança de R$ 60, mudou de ideia. ;Vou procurar outra empresa. Eu me recuso a pagar;, protestou. Procurada pelo Correio, a Golden Cross não se pronunciou sobre a postura dos médicos até o fechamento desta edição. O policial militar Vanderlucio Alarcão, 48, também saiu revoltado do hospital após ser informado que teria de pagar pela consulta, mesmo sendo um cliente da Amil. ;Vou registrar uma reclamação. Isso é abusivo;, disse. A Amil informou que foi surpreendida com ;ações isoladas; de cobrança de honorários médicos.
Reembolso
Já a funcionária pública Lenide Carreiro, 51 anos, pagou os R$ 60 para conseguir atendimento de um otorrinolaringologista pela Assefaz, mas fez questão de pedir o recibo para cobrar o ressarcimento do plano. ;É uma falta de respeito. A gente paga a mensalidade, mas não adianta nada;, reclamou. A Assefaz disse não compactuar com a atitude dos médicos, que classificou como ;uma exceção na maneira como (a operadora) atende aos beneficiários;. A empresa assegurou que reembolsará integralmente o valor das consultas.
;O paciente que teve de pagar pela consulta deve ir atrás do plano ou das entidades de defesa do consumidor para ser reembolsado. O médico está fazendo o trabalho dele. Quem nega o atendimento é o plano, não o profissional. Urgências e emergências continuarão o atendimento normal;, assegurou Iran Cardoso, presidente do CRM-DF. Procurada, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) informou apenas que negociações entre médicos e planos não podem prejudicar os beneficiários. Oswaldo Morais, presidente do Instituto de Defesa do Consumidor (Procon-DF), orientou os usuários a guardarem os recibos e exigirem o ressarcimento ao plano. ;A relação de consumo é entre paciente e operadora. A empresa tem que cumprir o contrato;, explicou.
Preço tabelado
O texto da Resolução n; 317/2010, do CRM-DF, que passou a valer ontem, determina que a remuneração dos médicos não poderá mais ser feita pelo intermédio dos hospitais ; daqui para a frente, os médicos querem receber os honorários diretamente dos planos de saúde. Além disso, a categoria exige o valor a ser recebido deve ser referenciado em tabela que será elaborada pela entidade de classe. Por hora, os cálculos utilizados, equivalentes a R$ 60, são da Associação Médica Brasileira (AMB). Iran Augusto Cardoso, presidente do CRM-DF, alegou que os seis planos cujos médicos deixaram de atender os que remuneram a categoria abaixo desse valor.
A resolução do CRM foi publicada em 19 de novembro de 2010 e estabeleceu, na ocasião, um prazo até o último domingo para os planos se adaptarem. A elaboração e a aplicação do texto é acompanhada pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), mas o órgão ainda não chegou a uma conclusão sobre a legalidade do documento. O promotor de Justiça de Defesa do Consumidor Trajano Sousa de Melo, que acompanha o caso, disse que ainda é preciso ouvir representantes dos planos de saúde para chegar a um entendimento sobre o assunto. O Ministério Público apresentau sugestões, mas o CRM as recusou.
Entre as propostas apresentadas estava a de retirar a proibição ao médico em aceitar planos que não se adaptarem à resolução. ;Isso pode gerar um conflito para o profissional. O código de ética o obriga a atender os pacientes, mas a resolução o proíbe. Seja qual for a decisão do médico, ele fica passível de punição;, avaliou Melo.