postado em 11/05/2011 07:50
Na ânsia de se livrarem do processo aberto pela Secretaria de Direito Econômico (SDE), do Ministério da Justiça, para investigar irregularidades, médicos e planos de saúde deram início a uma guerra de denúncias, revelando a fragilidade dos consumidores nesse jogo de interesses. Apontada como uma das pontas do esquema de cobrança de taxas indevidas dos conveniados de planos de saúde, a Fundação Assistencial dos Servidores do Ministério da Fazenda (Assefaz) informou ontem que vai entregar ao governo os nomes de todos os médicos que vinham cobrando até R$ 60 por consulta realizadas por meio de convênios.;Vamos repassar todas as informações que temos à SDE, inclusive os casos envolvendo médicos que tentaram cobrar a mais do que o valor da consulta, visando lucros maiores;, afirmou o presidente da Assefaz, Hélio Bernardes, que reconheceu problemas enfrentados por associados que precisaram de realizar consultas na rede particular. ;É uma falta de respeito. A gente paga a mensalidade, mas não adianta nada;, reclamou a funcionária pública Lenide Carreiro, 51, que denunciou ao Correio o esquema de cobrança da taxa extra. De acordo com a associação, quem arcou com esse ônus ilegal já foi ressarcido. Mas, no geral, os consumidores continuam a ser punidos por meio de um boicote disfarçado, que resulta em uma demora gigantesca para se agendar uma consulta usando os convênios.
Com o objetivo de criar uma proteção ao consumidor ; maior prejudicado na disputa entre médicos e operadoras ; a Agência Nacional de Saúde Complementar (ANS) pretende editar uma instrução normativa fixando prazos máximos para que os conveniados tenham acesso a consultas e procedimentos hospitalares e ambulatoriais. ;O consumidor que paga um plano não pode ficar esperando meses até conseguir atendimento;, disse o presidente da agência, Maurício Ceschin, durante audiência pública realizada ontem na Câmara dos Deputados, que teve a participação de representantes dos planos de saúde, dos médicos e dos órgãos de defesa do consumidor. Segundo Ceschin, a norma obrigará que os planos façam análises em suas estruturas, contratando novos profissionais e renegociando valores de honorários.
Do outro lado da briga, a Associação Médica Brasileira (AMB) classificou como mentirosas as afirmações de dirigentes de planos de saúde. A Federação Nacional de Saúde Suplementar (Fenasaúde), que representa as maiores operadoras do país, informou que o reajuste médio das consultas médicas entre os filiados à entidade variou entre 83,33% e 116,30% de 2002 a 2010 ; taxas superiores à inflação medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) no período, de 76,31%. Os médicos reclamam que o valor repassado não bate com as informações da instituição.
Até o governo reconheceu a situação de divergência. ;Há uma defasagem clara e nítida no valor dos honorários médicos pagos pelos planos de saúde, mas é preciso cuidado no debate dos reajustes, para que os custos não sejam repassados ao consumidor;, disse Ceschin. Ele reconheceu que uma norma da agência reguladora determina que os médicos recebam reajustes periódicos nos honorários. Mas, de acordo com a AMB, isso não vem sendo feito. ;O reajuste é descaradamente desrespeitado;, reclamou o presidente da entidade, José Luiz do Amaral.
Intervenção
Para a SDE, a situação chegou a um ponto no qual a intervenção será necessária para botar ordem na casa e reduzir os prejuízos à população. ;As medidas não são contra a classe médica ou contra os planos, mas a favor dos consumidores brasileiros que precisam dos serviços de saúde da rede particular;, destacou Diogo Thompson, diretor do Departamento de Proteção e Defesa Econômica do Ministério da Justiça. O governo proibiu, na segunda-feira, qualquer tipo de cobrança extra para conveniados a planos. Também foram vetadas as movimentações de descredenciamento em massa e paralisações coletivas da categoria.
A supervisora da Associação Brasileira de Defesa do Consumidor (Proteste), Polyanna da Silva, lembrou que todas as partes estão saindo no prejuízo, especialmente o consumidor. ;Da forma como está, a situação está ruim para todos. E o consumidor não pode ser usado como objeto durante as negociações;, disse. Em 2010, mais de 45 milhões de pessoas tinham contratos vigentes com as operadoras, conforme dados da agência reguladora.
Diante de tamanha bagunça, o presidente da Comissão de Seguridade Social e Família (CSFF) da Câmara dos Deputados, Saraiva Felipe (PMDB-MG), propôs que o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, compareça à Casa para prestar os esclarecimentos necessários sobre o processo aberto pela SDE e as restrições impostas a médicos e aos planos de saúde. Diversos deputados criticaram duramente a decisão do governo em proteger os consumidores com medidas preventivas, encampando os lobbies dos médicos e das empresas.