postado em 22/07/2011 08:26
Bruxelas ; Reunidos ontem com a missão histórica de evitar a derrocada da única experiência contemporânea de integração monetária, os líderes dos 17 países da Zona do Euro (ZE) socorreram a Grécia pela segunda vez. O pacote desenhado para evitar a quebra do mais problemático membro do bloco envolve recursos totais de 159 bilhões de euros (R$ 353 bilhões), incluindo 109 bilhões de euros em empréstimos das nações europeias e do Fundo Monetário Internacional (FMI) ; 37 bilhões de euros virão da participação dos credores privados e 13 bilhões de euros, de um programa de recompra de títulos públicos. Num maldisfarçado calote parcial da dívida, os bancos e fundos de investimento terão que trocar papéis em seu poder por outros, que pagarão juros menores e serão pagos em prazos maiores. Nos cálculos do primeiro-ministro grego, George Papandreou, o socorro vai permitir a redução de 26 bilhões de euros (R$ 57,7 bilhões) até 2014 numa dívida total de 350 bilhões de euros (R$ 777 bilhões). Hoje, o endividamento público do país corresponde a 155% do Produto Interno Bruto (PIB, a soma das riquezas geradas num ano). Com o socorro, cairia 12 pontos percentuais, estacionando em 143% do PIB. ;Agora, temos um programa que cria um caminho sustentável para a Grécia. No fim, ele significará não apenas recursos de um empréstimo, mas também a retirada do peso sobre o povo grego e um alívio para a Zona do Euro;, disse. Com o auxílio europeu, que só veio após a aprovação de duras medidas de austeridade pelo Parlamento grego, Papandreou ganhou uma sobrevida no cargo.
;Este é o pacote final de ajuda à Grécia;, afirmou, de forma categórica, o presidente do grupo de ministros das Finanças da Zona do Euro, Jean-Claude Juncker. O primeiro empréstimo da Zona do Euro e do FMI, em maio do ano passado, foi de 110 bilhões de euros (R$ 244 bilhões). Mas a iniciativa foi insuficiente para afastar o temor dos investidores de que o governo grego, mais cedo ou mais tarde, deixaria de honrar seus compromissos. Isso poderia causar um efeito dominó, ameaçando a sobrevivência do próprio euro. Ontem, as autoridades europeias evitaram, a todo custo, o uso da palavra calote para caracterizar o novo programa. ;Cabe às agências de classificação de risco avaliar se ele foi ou não uma moratória seletiva;, completou Juncker.
Segundo o presidente da França, Nicolas Sarkozy, os bancos credores prometeram contribuir com 54 bilhões de euros (R$ 120 bilhões) em três anos. Num prazo maior, de 30 anos, os empréstimos chegariam a 135 bilhões de euros (R$ 299,7 bilhões). ;Decidimos apoiar a Grécia como membro do euro. É um compromisso determinado;, disse o francês, que tentou capitalizar as glórias da decisão fazendo o anúncio do acordo antes da entrevista oficial das autoridades da Comissão Europeia. O Instituto Internacional de Finanças (IIF), que representou os bancos, enumerou uma lista de 30 instituições financeiras que aceitaram participar do esforço para salvar a Grécia: 23 da União Europeia, três suíças, uma canadense, uma kwaitiana, uma peruana e uma sul-coreana.
Redução de juros
A participação dos credores privados, uma vitória política da primeira-ministra alemã, Angela Merkel, evitou um mal maior. Em vez de um prejuízo total, em caso de suspensão dos pagamentos pelo Tesouro grego, os bancos aceitaram receber menos dinheiro pelos títulos em seu poder. Mas sua participação será restrita à dívida grega. Em compensação, os membros da Zona do Euro decidiram estender à Irlanda e à Portugal, nos empréstimos já feitos com recursos do Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (Fesf), as condições oferecidas agora à Grécia. Nos pacotes dos três países, os juros serão reduzidos de 5,5% para 3,5%. O prazo mínimo de vencimento subirá de 7 anos e meio para 15 anos e o máximo será fixado em 30 anos, com uma carência de 10 anos.
Coordenada pelo presidente do Conselho Europeu, o holandês Herman van Rompuy, a quinta cúpula sobre a crise da dívida do continente desde fevereiro lançou as bases para a criação de uma espécie de Fundo Monetário Europeu (FME). O organismo multilateral de crédito, uma cópia do FMI em menor escala, nasceria da ampliação das atribuições do Fesf. Ontem, o fundo emergencial foi autorizado a conceder empréstimos aos países em crise antes que as linhas dos bancos privados sequem. Também poderá comprar títulos públicos no mercado secundário, o que facilita a rolagem da dívida dos países membros e compensa uma eventual fuga de investidores.
;Usamos a crise grega para dar um salto qualitativo na governança da Zona do Euro;, disse Sarkozy. ;Não podemos continuar tendo uma moeda desconectada da política econômica.; Especialistas avaliam que o bloco terá que caminhar, em algum momento, para uma espécie de federação, com uma política fiscal comum. O desequilíbrio orçamentário de alguns dos sócios, que extrapolam em muito o limite de 3% do PIB para o deficit público, ameaça a existência do euro. Por causa dos graves desajustes, analistas e até algumas autoridades europeias já defendem a saída, mesmo que temporária, da Grécia, de Portugal e da Irlanda, que voltariam a adotar suas moedas extintas ; dracma, escudo e libra irlandesa, respectivamente.
Espanha e Itália são apontadas como os próximos países na lista de socorro europeu e do FMI. Presente à reunião em Bruxelas, o primeiro-ministro espanhol, José Luis Zapatero, se apressou em dizer que seu governo não pretende recorrer às linhas de crédito disponíveis. ;Não está em nossos planos;, afirmou. Segundo ele, o pacote para a Grécia vai contribuir para reduzir os juros exigidos pelos investidores na compra dos títulos públicos. ;O acordo baixará a tensão, além de gerar confiança.; Nos últimos meses, as taxas pagas pelos Tesouros dos países europeus endividados bateram recordes, em função dos temores de calote generalizado no continente.