postado em 29/08/2011 08:00
As turbulências dos mercados financeiros e as incertezas sobre a economia mundial fazem crescer entre investidores e analistas o medo de uma prolongada e simultânea recessão nos dois polos mais desenvolvidos do planeta ; Estados Unidos e Europa. O medo é de que os dois lados do Atlântico, para onde escoam mais de 30% das exportações brasileiras, mergulhem numa espécie de japanização, uma referência à estagnação do Japão, que perdura desde os anos 1990 e ainda não dá sinais de ser superada.Os que consideram inexorável a repetição da paralisia japonesa nos países ricos do Ocidente veem seis sintomas: grave desvalorização nas bolsas e imóveis, sistema financeiro debilitado, taxa básica de juros perto de zero, impasse político, panorama demográfico restritivo e desequilíbrios fiscais recordes. ;Com tais interrogações, o risco de japanização é evidente. EUA e Europa devem ter pelo menos uma década perdida;, diz Fabiano Pegurier, do Ibmec-RJ.
Um crescimento pífio até o fim desta década repetiria, na sua avaliação, mesmo que em menor grau, a depressão iniciada em 1929 e encerrada com a Segunda Guerra Mundial. ;A diferença, agora, é que o Produto Interno Bruto (PIB) sofreria recuos de 8% e não de 40%;, ilustra.
O professor lamenta que o tenso acordo firmado entre o governo e a oposição dos EUA em torno do Orçamento federal tenha limitado a capacidade do Estado de continuar intervindo diretamente em favor de uma retomada breve da economia. ;O dinamismo dos EUA pode até impedir que a recessão seja longa, mas o governo deve fazer a sua parte;, sublinha.
Dados divulgados nos últimos dois meses mostram que entraves ao crescimento econômico parecem bem superiores ao que se imaginava. O agravamento da crise europeia tem sido bem maior, com dúvidas sobre a saúde do sistema financeiro local e a insegurança sobre a capacidade dos países mais ricos em resistir à insolvência dos parceiros pobres. ;Após Grécia, Portugal e Espanha, surgiram dúvidas até se França honraria compromissos;, lembra.
Para Pegurier, o perfil geopolítico da crise europeia deixa só duas saídas: ou a Alemanha aceita cobrir prejuízos de terceiros em favor do euro ou o clube da moeda única é reduzido, afundando economias menores e deixando credores no prejuízo.
;Estou mais nervoso com as chances de japanização;, admite Sushil Wadhwani, ex-membro do comitê de política monetária do Banco Central da Inglaterra, em recente artigo. A seu ver, a principal prova de que o fenômeno recessivo está chegando a países como Reino Unido e Alemanha. ;Os números lembram a performance do Japão;, ressalta. O país tem crescido a uma taxa anual de 1%, com forte deflação (preços em queda), por falta de consumo.
Batendo à porta
O professor do Departamento de Economia da Universidade de Long Island, em Nova York, Panos Mourdoukoutas, duvida que os EUA e as economias altamente endividadas da Europa entrem em colapso. Mas, na sua avaliação, poderá ocorrer estagnação prolongada nessas duas regiões que, numa fase seguinte, engolfará países emergentes, como Brasil e China. Isso porque eles perderão parte importante dos mercados de seus produtos. ;Será a japanização da economia mundial;, diz.
Não à toa, Roberto Ellery, economista da Universidade de Brasília (UnB), considera inevitáveis os efeitos sobre o Brasil de uma acomodação conjunta das economias das regiões mais ricas do planeta. ;Só podemos cuidar bem das contas públicas. É uma pena que estejamos conseguindo equilíbrio fiscal mais pela arrecadação do que pelos gastos;, alerta.
Ellery explica que o pior impacto para a economia brasileira viria de uma desaceleração da China, em sequência ao desempenho do consumo nos EUA. ;As altas cotações das commodities retratam dependência do crescimento chinês;, acrescenta. Caindo na real, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, teme a evolução da crise global e acredita que EUA, Europa e Japão ilustram o estágio posterior à crise financeira de 2008 e 2009 ; o pesado endividamento público. Para ele, as turbulências resultarão em baixo crescimento mundial até 2014.
Nota rebaixada
Na quarta-feira, a agência de classificação de risco Moody;s rebaixou a nota de emissões a longo prazo dos principais bancos japoneses, horas após ter rebaixado a nota da dívida soberana do próprio Japão. A decisão foi uma continuidade dos temores de que o país tenha menos capacidade no futuro para apoiar o setor bancário no caso de nova crise financeira.