O Banco Central está sob fogo amigo. Os ministros da Fazenda e do Desenvolvimento, a base aliada no Congresso e até a presidente Dilma Rousseff pressionam para que a instituição derrube a taxa básica de juros (Selic) hoje, mesmo que em 0,25 ponto percentual. O movimento deve se intensificar ao longo desta quarta-feira, segundo e último dia da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), que definirá o tamanho da Selic nos próximos 45 dias. A investida sobre o BC começou anteontem, com o anúncio do reforço de R$ 10 bilhões no arrocho fiscal deste ano para o pagamento de juros da dívida.
Em viagem a Pernambuco, Dilma disse que começava a ver a possibilidade de redução dos juros no Brasil. ;Os R$ 10 bilhões (de aumento no superavit primário) decorrem dos esforços que fizemos tanto nos gastos de custeio quanto nas receitas;, afirmou. ;Nós preferimos utilizá-los para abrir um novo caminho, além do caminho de aumentar o investimento.
A partir deste momento, nós começamos a ver a possibilidade de redução dos juros. Hoje, o Brasil pratica as mais altas taxas (do mundo);, reforçou a presidente, em entrevista a rádios locais, ao chegar a Caruaru, no agreste pernambucano.
Gritaria
Na segunda-feira, quando anunciou a medida fiscal, que elevará o superavit para R$ 127 bilhões, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, fez apelo semelhante. ;Queremos menos política fiscal e mais monetária (ou seja, juros baixos);, disse. Ontem, foi a vez de Fernando Pimentel, do Desenvolvimento, engrossar a gritaria contra o BC. Durante audiência na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, ele afirmou esperar a queda nos juros ;em um futuro próximo;. ;O governo está fazendo um grande esforço para criar as condições necessárias para que o Copom possa começar a reduzir a taxa de juros. Agora, se será nesta ou em outra reunião, depende do Copom. Mas o esforço fiscal tem esse objetivo, criar condições para que haja uma redução;, afirmou.
Especialistas do mercado financeiro avaliaram negativamente as pressões políticas, mas ponderaram não haver risco de a reunião do Copom ser pautada pelos clamores governistas e populares. Eles se apegam ao perfil técnico do presidente da instituição, Alexandre Tombini, e dos demais integrantes da diretoria e acreditam que, hoje, mais uma vez, a instituição passará um atestado de profissionalismo e autonomia.
Tanto é assim que, no mercado de juros futuros, diminuíram as apostas em uma redução imediata da Selic. A maioria pondera que uma queda virá, mas possivelmente em alguma das duas últimas reuniões deste ano ; quando a taxa cairia dos atuais 12,50% ao ano para 12,25%. ;O BC, como todo Banco Central do mundo deveria fazer, age conforme as metas inflacionarias, com base em dados objetivos. A instituição não se curvar a essas pressões;, disse Jason Vieira, economista da Corretora Cruzeiro do Sul.
Alcides Leite, professor da Trevisan Escola de Negócios, tem opinião semelhante. Para ele, o BC brasileiro é técnico demais para se deixar influenciar por protestos. ;O Copom leva em conta o comportamento da inflação atual e, nesse encontro, não pesará a medida de rigor fiscal. Ela é um dos elementos que vão entrar nas decisões tomadas nas próximas reuniões;, observou.
Especulação
Carlos Thadeu Filho, economista da gestora de recursos Franklin Templeton, prefere não entrar no debate político, mas observou que, por enquanto, há muita especulação quanto à decisão que será tomada hoje. ;O que pode acontecer é o BC dar mais peso à crise do que ao quadro doméstico;, disse. ;Apenas o cenário doméstico não justifica uma queda nos juros;, emendou.
Enquanto o governo diz que chegou a hora de cortar a taxa básica, o mercado se preocupa com a inflação acumulada em 12 meses, que está acima do teto da meta. O Índice de Preços ao Consumidor Amplo-15 (IPCA-15) alcançou 7,1% em 12 meses, enquanto o objetivo do governo é limitar esse indicador a 4,5%.
Há desconfiança ainda acerca da política fiscal tocada pela Fazenda, baseado em aumento das receitas e não em corte de despesas e eficiência da máquina pública.
Para Jason Vieira, o anúncio da economia extra de R$ 10 bilhões pode gerar um alívio suficiente apenas para permitir uma parada no aperto monetário, não para cortes nos juros. ;O governo tem de trabalhar sério. Apesar de a atividade do país estar em menor ritmo, o potencial inflacionário ainda é grande;, alertou.
A Bolsa de Valores de São Paulo (BMF) ignorou as pressões sobre o BC e, pelo terceiro pregão consecutivo, fechou no azul, aos 55.385 pontos, com alta de 0,96%. O dólar foi na direção contrária e registrou queda, terminando o dia cotado a R$ 1,588 para venda.
Tombini entre os melhores
O presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, está entre os melhores presidentes de bancos centrais do mundo, segundo ranking divulgado pela revista norte-americana Global Finance. O levantamento conferiu avaliações que vão de A (desempenho excelente) a F (fracasso). Tombini ganhou nota B%2b e aparece bem à frente do presidente do banco central dos Estados Unidos, Ben Bernanke, que mereceu apenas um C. A revista atribuiu nota máxima apenas aos chefes dos BCs da Austrália, de Israel, do Líbano, da Malásia, das Filipinas e de Taiwan. Foram avaliados presidentes de instituições monetárias de 36 países e do Banco Central Europeu (BCE).