postado em 14/09/2011 07:38
Brasil, China, Índia, Rússia e África do Sul, países que compõem o Brics, decidiram estender as mãos à Europa, como forma de evitar um calote em cascata na região, o que empurrará o mundo para um longo processo de recessão. Com mais de US$ 4 trilhões em reservas internacionais, as nações emergentes temem ser contaminadas e obrigadas a abrir mão de parte das conquistas sociais dos últimos anos. A meta é comprar títulos das dívidas de Portugal, Itália, Grécia e Espanha, os Pigs na sigla em inglês. Nos cálculos da agência de classificação de risco Austin Rating, os Brics têm condições de oferecer um socorro de US$ 464 bilhões, dos quais US$ 35 bilhões sairiam do Brasil.
O ministro da Fazenda, Guigo Mantega, confirmou que o plano de ajuda está a caminho. ;Vamos nos reunir na semana que vem em Washington (Estados Unidos) e estudar como fazer para a Europa sair da atual crise;, disse. Ele e o presidente do Banco Central brasileiro, Alexandre Tombini, participarão, na segunda-feira, da reunião de primavera do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial. O encontro também debaterá o plano de estímulo à economia norte-americana, de US$ 447 bilhões, anunciado pelo presidente Barack Obama.
Segundo o instituto de estatística para a Europa, a Eurostat, a dívida dos 17 países da Zona do Euro chegou ao fim de 2010 representando 85,1% de toda a riqueza do bloco, o equivalente a 7,8 trilhões de euros. Apenas os Pigs devem 3,2 trilhões de euros. Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating, lembrou que, com esse montante pesando sobre a cabeça dos europeus, uma ajuda dos emergentes não será suficiente para tirá-los do atoleiro. ;Os US$ 464 bilhões são pouco frente ao tamanho da dívida da Zona do Euro. Mas não deixa de ser um alento, pois dará um alívio a curto prazo, permitindo aos governos europeus chegarem a um plano de resgate mais consistente. A ajuda também devolverá a confiança aos investidores;, argumentou.
Pires na mão
A oferta dos Brics recebeu o aval da diretora-gerente do FMI, Christine Lagarde. ;É muito interessante ver que as economias emergentes realmente estão interessadas em comprar bônus europeus;, afirmou. Mas ela recomendou que o processo seja amplo e não restrito aos títulos de dívida menos arriscados. A perspectiva de Lagarde é de que o socorro se volte para os países mais problemáticos. A China, por sinal, deu o primeiro passo nessa direção, ao abrir negociações com a Itália. O China Investment Corp, um dos maiores fundos soberanos do mundo, participou de uma delegação que visitou Roma na semana passada para uma conversa com Giulio Tremonti, ministro das Finanças. Uma semana antes, os italianos haviam ido à China de pires na mão para iniciar negociações acerca de uma possível venda de parte da dívida do país.
Tremonti, que criticava a expansão chinesa e temia uma ;colonização inversa;, ficou sem opção, principalmente depois que o Banco Central Europeu (BCE) alertou que não continuará com o programa de recompra de títulos indefinidamente. A situação em Roma chegou a um ponto tão crítico que o governo já cogita vender participações em diversas empresas em troca de um alívio momentâneo. A situação da Itália só não está pior que a da Grécia, onde 20 mil funcionários públicos serão demitidos.
Segurança
No Brasil, a preocupação é com o risco que a compra de títulos podres pode trazer às reservas internacionais do país, que passam de US$ 350 bilhões. Aldo Mendes, diretor de Política Monetária do BC e responsável pela gestão dos recursos, lembrou, ontem, na Câmara dos Deputados, que a aquisição de ativos para esse colchão de proteção tem a segurança como um dos principais pilares. Explicou ainda que há a prerrogativa de se arrematar títulos que sejam classificados, no mínimo, como duplo A. ;Essa é uma excelente classificação de risco para nós;, disse.
Porém, se o plano de socorrer os europeus for executado, o BC terá de abrir mão de parte da segurança. Atualmente, apenas 3% das reservas são classificados como duplo A, todo o restante é AAA. Pela nota de risco usada pela autoridade monetária ; o rating é elaborado pela Moody;s ;, ajudar a Grécia, por exemplo, significaria embolsar títulos Ba1. No caso de socorro a Portugal, seriam papéis A1. No da Itália, Aa2. ;Será difícil explicar à população a compra dessas dívidas soberanas, devido à insegurança. Mas será necessário, pois o Brasil se beneficiará do reaquecimento da economia global, com a Europa voltando a importar nossos produtos;, explicou Agostini. ;Provavelmente, os títulos europeus oferecerão rendimentos melhores do que os dos Estados Unidos.;
Na média dos últimos nove anos, com a estratégia adotada pelo BC, de predominância de bônus norte-americanos, as reservas internacionais ofereceram retorno médio de 5,2%. Em 2011, até setembro, acumulam rendimento de 4,9%. Mas essa taxa é insuficiente, pois a autoridade monetária paga caro na outra ponta, ao emitir títulos para retirar do mercado os reais usados na aquisição de dólares (12% ao ano). O BC também é prejudicado pela valorização do dólar frente ao real. Nos primeiros seis meses do ano, as reservas deram prejuízo de
R$ 44,5 bilhões à autoridade monetária.