Economia

Com menor concorrência, preços dos carros nacionais podem aumentar

postado em 20/09/2011 08:03

Maiores beneficiadas pela decisão do governo de elevar a tributação sobre veículos importados, a Ford, a Volkswagen, a General Motors (GM) e a Fiat, donas de 54% do mercado doméstico, já admitem tirar proveito da diminuição da concorrência. Segundo Cledorvino Belini , presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), que reúne as quatro empresas, todas estão liberadas para reajustar as suas tabelas, caso se sintam confortáveis para isso. ;Não pretendemos aumentar preços, mas não podemos nos comprometer com isso, se não seria cartel;, disse. Foi justamente a competição com os automóveis vindo de fora que levou os preços médios dos carros a caírem 2,4% entre janeiro e agosto, apesar de a inflação ter saltado 4,4% no período, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Para os analistas, as meias palavras de Belini, que também preside a Fiat, confirmam que a alta de 30 pontos do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) sobre os carros importados representa o maior retrocesso desde a abertura do mercado automotivo do país, no início dos anos 1990. O lobby sobre o Planalto das quatro marcas tradicionais conseguiu, numa só tacada, ampliar vantagens dentro do grupo das 11 empresas com fábrica no Brasil e ainda barrar o incipiente avanço dos estreantes asiáticos. Assim, os especialistas não têm dúvidas: os maiores prejudicados serão os consumidores.

Além de anular boa parte da vantagem de preço dos modelos made in Coreia do Sul e China, a elevação IPI para automóveis e caminhões com menos de 65% de peças nacionais favorece importações de carros do Mercosul (sobretudo Argentina) e do México, isentas da nova regra e do pesado Imposto de Importação (35%). Belini disse, contudo, que a decisão do governo, que encarecerá os importados em até 28%, foi motivada pela balança comercial. De 2006 a 2010, o saldo total do país caiu de U$ 46 bilhões para US$ 20 bilhões afetado pelo setor automotivo, que saiu de um superavit de US$ 9,6 bilhões para deficit de US$ 6 bilhões. No mercado doméstico, porém, as montadoras não têm do que reclamar: as vendas somaram 151.808 unidades nos primeiros 15 dias de setembro, alta de 2,37% sobre igual período de 2010, informou a Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave).

Revolta
Os consumidores reagiram à alta do IPI correndo às concessionárias de importados em busca dos estoques sem remarcações. No último fim de semana, a coreana Kia Motors dobrou o movimento. O mesmo se observou na chinesa JAC Motors. O diretor da empresa no Distrito Federal, André Paulo, afirmou que a marca manterá os preços, cortando lucros, mas fechará lojas em shopping centers. ;O efeito do aumento do IPI gerou incerteza e acabou com a competição com carros equipados e de alta qualidade;, lamentou. A multinacional garantiu que investirá US$ 900 milhões em uma fábrica no Brasil. Porém, as garantias de assistência técnica e de reposição de peças podem ficar comprometidas.

Para o casal Marilda Junqueira e Sérgio Luiz da Silva, ambos de 55 anos, o governo cedeu ao lobby de empresas poderosas e puniu os mais fracos, os consumidores. ;A alta do IPI foi um absurdo. Tinha que haver outra maneira de o governo proteger a indústria nacional e os empregos;, afirmou Marilda. O servidor Valdir Ferreira, 52, considerou a medida como protecionismo burro. ;Os carros estão vindo com preço abaixo dos do mercado, o que é bom;, disse.

O economista Marco Túlio Bastos, 27anos, culpou a falta de imaginação do governo. ;Voltamos a adotar medidas comuns nos anos 1970;, reclamou. O administrador de empresas Diogo Campos, 31, sugeriu às montadoras instaladas no país que reduzam as margens de lucro para manter os clientes. Para o gerente da Kia, Heitor Melo, a abertura e a concorrência melhoraram o carro nacional. ;Agora, estão fazendo o caminho inverso.;

Na opinião de Ruy Coutinho, ex-presidente do Conselho Administrativo de Defesa da Concorrência (Cade), o protecionismo não se justifica sob nenhum ângulo. ;Se medidas infelizes como essa continuarem, daqui a pouco o consumidor pagará até pelas rodas do carro;, enfatizou. Para ele, a decisão do governo pode ser questionada na Organização Mundial do Comércio (OMC), ao discriminar produtos já vendidos no mercado interno em razão de sua origem. ;O lobby foi um tiro no pé da indústria, um atestado de falta de competitividade;, comentou.

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