Economia

Justiça barra abusos contra os clientes que usam milhas para viajar

postado em 23/10/2011 08:00
O Judiciário está barrando os abusos cometidos pelas empresas que administram programas de milhagem para aquisição de passagens aéreas. A retenção indevida de milhas devido ao cancelamento de cartão de crédito ou por adiamento da viagem, por exemplo, viola o Código de Defesa do Consumidor, no entendimento dos magistrados. Os consumidores que vão atrás dos seus direitos têm vencido os processos na Justiça.

;Muitas pessoas que participam desses programas de milhagens não reclamam por falta de informação e porque acham que elas são bônus concedidos pelas empresas, como se fosse um brinde, mas não são. O preço está embutido na passagem adquirida, nos produtos comprados com cartões de crédito ou em qualquer outro que deu direito ao recebimento das milhas. O consumidor paga por isso;, afirma o presidente do Instituto Brasileiro de Estudo e Defesa das Relações de Consumo (Ibedec), Geraldo Tardin.

Para o Judiciário, a cláusula dos contratos que prevê perda automática dos pontos acumulados quando ocorre o cancelamento dos cartões de crédito, mesmo por iniciativa do consumidor, é abusiva e representa vantagem excessiva para a administradora. O Tribunal de Justiça de São Paulo determinou, no início do ano, o crédito das milhas acumuladas por um cliente que ingressou com ação judicial. De acordo com o acórdão dos desembargadores, as milhas integram o patrimônio do cliente no exato momento em que ele paga a fatura do cartão.

O mesmo entendimento tem o Tribunal de Justiça do Distrito Federal, que também reconhece o direito dos usuários à devolução da taxa de embarque de bilhete de viagem cancelada, à remarcação do voo ou à devolução das milhas. De acordo com as decisões dos tribunais, os clientes têm direito a remarcar passagens dentro do prazo de um ano de validade, como ocorre nos voos adquiridos com dinheiro, mesmo que as milhas que geraram o bilhete tenham expirado antes da nova data da viagem.

Mas é preciso ficar de olho nas regras estabelecidas por alguns programas e nas taxas cobradas. O Tam Fidelidade, por exemplo, só permite remarcação de bilhetes para a América do Sul em até três meses após a sua emissão e até seis meses, no caso de voos internacionais. A taxa é de R$ 80. No Smiles, da Gol, é de R$ 50 por trecho. Os dois programas reúnem 17 milhões de clientes. Companhias estrangeiras cobram valores maiores, até US$ 250 (R$ 441).

Ofertas
Os órgãos de defesa do consumidor recomendam o acompanhamento frequente do extrato para o usuário não ter surpresas com débitos indevidos. Ele também não deve aceitar práticas que o coloquem em franca desvantagem, como a recusa da companhia em emitir nova passagem, após desistência de voo marcado. O site do Smiles, por exemplo, debita as milhas após a escolha de um voo pelo cliente, mesmo que ele não conclua os passos seguintes de pagamento da taxa de embarque com o fornecimento dos dados do cartão de crédito e o bilhete não seja emitido. Para o Ibedec, esse desconto das milhas é abusivo.

Hoje, existem no mercado várias opções para o consumidor acumular pontos e transformar em milhas e passagens, por meio de compras no cartão de crédito e de voos realizados. O Bradesco, por exemplo, tem convênio com cerca de 150 companhias aéreas para emissão on-line do bilhete, sem precisar antes transferir os pontos para o programa desejado, como exigem o Smiles e o Tam Fidelidade. Essa é uma facilidade, mas o consumidor pode ter problemas na hora de remarcar um bilhete de viagem e perder todas as milhas. Nesse caso, ele deve mover ação nos Juizados Especiais de Pequenas Causas contra o banco e a companhia aérea, por exigência de taxas abusivas para marcar nova data ou recusa em restituir os pontos ou milhas.

Segundo Tardin, do Ibedec, no caso de o cliente pedir a restituição de milhas de passagem não utilizada, pode haver o desconto de uma taxa a título de custo administrativo. Mas ela não pode ser exorbitante. ;Em geral, de 10% a 20% do total das milhas utilizadas;, diz. Se o cliente, porém, optar por remarcação do voo, deve pagar apenas o encargo previsto para esse fim, desde que não seja abusivo, não podendo ter retenção de milhas conjuntamente, assegura.

O advogado Thiago Azevedo, da associação de defesa do consumidor Proteste, alerta ainda que as empresas não podem dificultar o acesso a vagas reservadas com o uso de milhas, o que ocorre com frequência, com disponibilidade pequena de assentos nos voos. ;Isso significa descumprimento da oferta;, afirma. Nesse caso, o usuário deve procurar ajuda em alguma entidade de defesa do consumidor.

Problemas
O bancário Flavio Andrade de Oliveira, 34 anos, é cuidadoso em relação às suas milhas. Ele concentra todas as compras em um único cartão de crédito, transfere com frequência os pontos adquiridos para a companhia aérea e procura reservar a passagem com seis meses de antecedência. Mesmo assim, enfrenta problemas. Integrante dos programas de milhagem Tam Fidelidade e Smiles, Oliveira diz que as duas empresas demoram para contabilizar pontos de companhias parceiras.

;Sempre tenho que reclamar e ligar para a central e ficar horas pendurado no telefone até resolver o problema;, comenta. O bancário conta que tentou marcar recentemente uma passagem com milhas pela Tam, disponível no site, mas não conseguiu completar a operação. O assento disponível tinha desaparecido. ;Passei mais de duas horas no telefone para fazer reclamações e, somente depois de muita insistência, eles disseram que eu poderia comprar a passagem com milhas em caráter excepcional. Era um direito que eu tinha e parecia que eles estavam me fazendo um favor;, lamenta.

A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), responsável por regulamentar e fiscalizar o serviço de transporte aéreo no país, informou que não tem autoridade para punir ou multar as empresas que cometem abusos. A orientação do órgão para o consumidor que se sentir lesado é se queixar no Procon e nos Juizados Especiais dos aeroportos.

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