Economia

Países emergentes vão tentar acordo para recompor o FMI

Enviado Especial
postado em 02/11/2011 08:00
Cannes (França) ; O Fundo Monetário Internacional (FMI) já não é o mesmo e deverá sofrer importantes mudanças por conta da crise atual nos países europeus. Tudo porque os emergentes, antes os maiores tomadores de empréstimos mundiais, agora podem passar à condição de financiadores do mundo desenvolvido. Não à toa, será o primeiro tema a ser tratado hoje pela presidente Dilma Rousseff em Cannes, no sul da França, onde os líderes das 20 maiores economias do planeta se reunirão, amanhã e depois, na Reunião de Cúpula do G-20 para discutir os rumos da economia global. Pela manhã, Dilma discutirá o assunto com Christine Lagarde, diretora-gerente do Fundo. Na sequência, ela se sentará com seus pares do Brics (grupo que, além do Brasil, é formado por Rússia, Índia, China e África do Sul) em busca de uma proposta comum para mudar as regras do organismo multilateral.

Os atuais deficits fiscais gigantescos da Europa, gerados a partir da reação dos governos às turbulências de 2008 e 2009, tornaram-se um desafio sem precedentes para os órgãos de financiamento. Os países emergentes alertam sobre a necessidade de reforçar o caixa do FMI em pelo menos U$ 350 bilhões. Com quase US$ 4 trilhões em reservas internacionais, os líderes do mundo em desenvolvimento aceitam bancar parte dessa conta, desde, é claro, que aumentem a participação acionária no Fundo. Hoje, os países desenvolvidos têm 55% das cotas (votos) do FMI, e os emergentes, 45%. Brasil, China, Índia e África do Sul defendem que essa relação seja de meio a meio.

A expectativa dos observadores do G-20 é de que, durante o encontro, seja anunciado um socorro inédito dos países emergentes da Ásia e América Latina aos países europeus via FMI. Após um longo período de descrédito, o Fundo voltou a ganhar relevância em meio à crise econômica que se arrasta há três anos e vem sendo apontado como instrumento ideal para viabilizar uma operação coordenada de resgate do sistema financeiro. Essa possibilidade de reviravolta nas regras do organismo atiçou os ânimos dos emergentes, sobretudo do Brasil. ;A presidente Dilma Rousseff já deu um duro recado ao FMI e aos países europeus em crise: a prática mostrou que o remédio amargo dos ajustes fiscais impostos pelo fundo à América Latina nos anos 1980 e 1990 só piorou as coisas. É bom não repetir o erro com a Grécia e outros países;, avaliou Sandra Polónia Rios, diretora do Centro de Estudos de Integração e Desenvolvimento (Cindes). Sandra lembra que o próprio FMI sinalizou favoravelmente para uma calibragem nos seus métodos, sem se afastar totalmente da receita de rigor fiscal como forma de tornar as economias nacionais sustentáveis. Ela também considera inevitável que a rediscussão do papel do organismo, cobrada pelo Brasil e outros grandes emergentes, como a China, seja tratada no campo político (leia-se mais poder decisório), mas também na coordenação macroeconômica e nas regras cambiais.

Provocação
Para Jairo Saddi, professor de direito econômico do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper), é curioso o fato de o Brasil oferecer ajuda ao sistema financeiro internacional, apresentando práticas bancárias mais conservadoras que os próprios países desenvolvidos. ;O Brasil tem sido um agente provocador, conseguindo pautar o mundo sobre questões relevantes, como a da guerra cambial na Organização Mundial do Comércio (OMC). Mas, por não ter voz ativa no contexto global, o país não consegue ir além;, ressaltou. É por isso que o FMI ainda está no ;mesmo lugar;, avaliou Saddi. A seu ver, diante da notória vontade do governo brasileiro de ocupar espaços, aproveitando-se da crise internacional, há avanços e mais pragmatismo na gestão Dilma. ;Mas ainda estamos longe da importância que o Brasil acha que tem;, reconheceu.

Em discursos recentes, Dilma mostrou preocupação com o quadro global da economia e disse que a falta de uma ação rápida dos países europeus para a solução da crise mundial só levará ao agravamento da crise, com sérias consequências sociais. A presidente vem defendendo a consolidação fiscal e o crescimento econômico com geração de emprego como possíveis saídas para a crise europeia. ;É preciso esforço concentrado. Há que se evitar que países transfiram para outros os custos, seja por política cambial, seja por desequilíbrio financeiro;, tem pregado Dilma.

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