As chances crescentes de recessão na economia europeia estão obrigando os governos a apertarem o cinto onde mais fere a população: nos benefícios sociais. Seguindo a cartilha do Fundo Monetário Internacional (FMI) para nações perdulárias, a Zona do Euro cancelou feriados para aumentar a produtividade, demitiu servidores públicos, cortou salários e elevou impostos. Aos poucos, está desmontando o Estado de bem-estar social oferecido por décadas aos europeus e perdendo seus principais defensores ; os líderes socialistas e social-democratas. O mais recente exemplo é a Espanha, que, de acordo com os resultados das eleições de domingo (20/11), trocou José Luis Zapatero por um primeiro-ministro conservador, Mariano Rajoy.
Com a crise, muitos dos 17 governos da Zona do Euro passaram a impor a quebra de direitos adquiridos, como as aposentadorias, para financiar o crescimento do Produto Interno
Bruto (PIB, soma de todas as riquezas da região) e, sobretudo, viabilizar a criação de emprego para os jovens. A taxa de desocupação entre os europeus com menos de 25 anos atingiu níveis recordes, 21,4%. Na Espanha e na Grécia, a extinção de postos de trabalho para esse público se alastra em ritmo de epidemia: 48% dos espanhóis nessa faixa etária estão desocupados. Entre os gregos, o problema afeta 43,5%, segundo dados do escritório oficial de estatísticas do bloco, o Eurostat.
;A Europa caminha para o fim do Estado de bem-estar social. Tanto que os partidos socialistas, idealizadores disso, estão perdendo espaço;, observa Alfredo Barbudi, economista-chefe da corretora BGC Liquidez. Para ele, essa prática está em xeque tanto do ponto de vista econômico quanto político. A crise financeira de 2008 e a recente falta de confiança dos investidores na capacidade de os países honrarem suas dívidas estão, paulatinamente, provocando um colapso do mercado de trabalho.
Gordura
A situação é tão grave no Velho Continente que o governo da Grécia estuda reduzir o número de cidades das atuais 1.034 para 325, com o objetivo de cortar drasticamente a gordura do Estado. Com a medida, diminuiria de 6 mil para 2 mil o número de prefeituras, câmaras, secretarias e outros órgãos estatais. Outros países severamente afetados pelas turbulências estudam ações semelhantes. Além de benefícios sociais e
investimentos comprometidos, até o Natal na Zona do Euro pode ser afetado. Já em 2010, antes do agravamento dos problemas, as principais cidades da Espanha cortaram parte da decoração do período e houve uma economia de 49% com energia que seria gasta com luzes natalinas, situação que se repetirá neste ano.
Para Zeina Latiff, economista do Royal Bank of Scotland, a
situação na Europa chegou a um nível em que o ;recomendado é uma ruptura da Zona do Euro. O fim do euro significaria o fim da moeda e não do restante dos avanços alcançados pelo bloco. A decisão não é trivial, mas a situação recomenda uma quebra drástica;, alerta Zeina. O caos que predomina na região e que culminou na retirada de benefícios sociais pode ser ilustrado ainda pela Irlanda, país no qual o seguro-desemprego foi reduzido para um ano e não será mais usado por tempo indeterminado.
A lista de benesses vetadas não para de crescer: na Grécia, o salário dos funcionários públicos foi cortado em 15%. Na Espanha, viúvas que recebiam até mil euros por mês tiveram o benefício reduzido e vão proporcionar uma economia de 14 milhões de euros por ano. O país ainda demitiu 2,5 mil professores interinos e aumentou a carga de trabalho dos titulares. Elevou o imposto sobre o recolhimento do lixo, as tarifas do metrô e anunciou que vai economizar 2,5 bilhões de euros na compra de remédios. A Itália vai aumentar impostos, a idade para se aposentar e transferir todos os feriados religiosos para o domingo.
Em frangalhos
União Europeia amarga o maior desemprego de sua história: 9,7%. Veja a taxa em alguns de seus membros (Em %)
Espanha 22,6
Grécia 17,6
Irlanda 14,2
Portugal 12,5
Itália 8,3
França 9,9
Alemanha 5,8
Proporção de desocupados com menos de 25 anos de idade avança
Espanha 48,0
Grécia 43,5
Irlanda 29,5
Itália 29,3
Portugal 27,1
Reino Unido 21,2
França 24,0
União Europeia 21,4
Fonte: Eurostat