Economia

Número de investidores da terceira idade cresceu 27,7% nos últimos anos

postado em 06/01/2012 08:00

Depois de mais de quatro décadas de trabalho para construir uma carreira e um patrimônio, o engenheiro Marco Silva, 66 anos, decidiu apostar em um mercado de alto risco. Acostumado com investimentos tradicionais, como a caderneta de poupança e o setor imobiliário, ele passou a destinar, há dois anos, parte de seus recursos para a compra de ações listadas na Bolsa de Valores de São Paulo (BM). O caso de Silva é apenas um pequeno recorte de uma geração que, ao ver a expectativa de vida saltar de 62,6 anos para 73,5 anos desde 1980, enxergou a possibilidade de realizar aplicações de longo prazo e ter ganhos maiores mesmo após a aposentadoria.

É uma nova terceira idade que mudou pensamentos e hábitos. No passado, ao chegar a essa faixa etária, depois de tantos planos concretizados, os brasileiros entendiam que não tinham mais que poupar e se empenhar em realizar projetos, sobretudo correndo o risco de perder parte do patrimônio amealhado ao longo de décadas de trabalho duro, como no caso do mercado acionário, muito sensível a qualquer intempérie na economia. A mudança de postura é retratada pela BM. O número de investidores com mais de 56 anos cresceu 27,7% entre dezembro de 2009 e novembro de 2011, de 124.652 para 159.237.

Silva explica que a ideia de se arriscar na bolsa começou ainda nos anos 1980. À época, ele decidiu colocar parte de seus recursos nas ações, mas viu o dinheiro desaparecer por causa das turbulências vividas no país, que afundava na hiperinflação. ;Na ocasião, não gostei e deixei para lá. Agora, depois do estouro da crise imobiliária de 2008, vi que a bolsa caiu, mas se recuperou. Comecei a aplicar em fundos de renda fixa e, mais tarde, em ações;, diz o engenheiro.

Com os novos investimentos, a preocupação de Silva é não apenas manter o padrão de vida após a aposentadoria, mas também deixar um patrimônio para a família. ;Quero complementar o que o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) não pode fazer e garantir o futuro dos meus filhos. A aplicação em ações é de risco. Sei que estou sujeito a ganhar e a perder. Mas tomo cuidados, como acompanhar sempre o noticiário econômico e investir em empresas sólidas;, afirma. Hoje, o valor máximo pago aos beneficiários pelo INSS é de R$ 3,6 mil.

Inflação
Alexandra Almawi, economista da Lerosa Investimentos, avalia que o interesse de pessoas na terceira idade pela bolsa de valores é maior justamente entre aquelas que querem reservar recursos para a família. ;Elas podem entrar na bolsa, mas o investimento não pode ser uma parcela significativa de seus recursos. Muitas querem formar uma poupança para os seus herdeiros. O que elas não devem é aplicar todo o dinheiro que têm para viver;, alerta.

José Alberto Netto Filho, professor de educação financeira da BM, destaca que outro motivo para o aumento no número de investidores nessa faixa etária é a estabilidade financeira que eles adquirem ao longo da vida ; e, claro, a previsibilidade maior da economia, com a inflação dentro das metas definidas pelo governo. ;Muitos se aposentam, continuam trabalhando e têm o fundo de garantia em mãos. Querem maximizar os rendimentos;, pondera.

A economista da Lerosa observa, porém, que grande parte das pessoas com mais de 60 anos de idade que está na bolsa começou a aplicar há mais de 10 anos e ganhou com a valorização ao longo do tempo. ;Também vemos hoje um grande número de mulheres que estão se interessando mais por seus investimentos de risco e ingressam na bolsa, seja por causa do divórcio ou da morte do marido;, diz.

Dividendos
De fato, pelos dados da BM, embora as mulheres ainda representem 27,2% do total de investidores da terceira idade, proporcionalmente, a procura pelo mercado acionário tem crescido mais entre elas. O número de investidoras acima de 60 anos saltou 30,6% desde dezembro de 2009, de 33.162 para 43.324. Entre eles, o avanço foi de 26,7%, de 91.490 para 115.913.

Apesar do aumento na expectativa de vida dos brasileiros e da estabilidade da economia nacional, especialistas destacam que quem quer ingressar no mercado acionário após os 50 ou 60 anos de idade deve redobrar os cuidados. ;Quanto mais avançada for a idade, menor deve ser a concentração de recursos em renda variável. Apesar de a liquidez ser uma vantagem no mercado de ações, pode ser que, no momento do resgate, a bolsa tenha caído por causa de influências externas;, destaca Fernanda Machado Ramos, assessora da Mundial Investimentos.

Ela sugere que, mesmo no caso das ações, parte dos recursos deve ser destinado para aquelas que distribuem lucros aos acionistas ; os chamados dividendos, repassados a cada ano, semestre, trimestre ou mesmo mês. ;As companhias do setor elétrico são, tradicionalmente, boas pagadoras de dividendos. Além de ter uma demanda constante, ele não tem gastos com propaganda e marketing, o que costuma consumir porte dos lucros das empresas;, diz.

[SAIBAMAIS]Nas contas de Alexandra, da Lerosa, entre os idosos, o máximo aplicado em ações deve chegar a 20%. ;Nos Estados Unidos, há uma máxima que diz que, aos 30 anos de idade, 70% do dinheiro deve ir para a bolsa. Aos 70 anos de idade, apenas 30% vai para a renda variável;, compara a economista. Netto Filho, da BM, ressalta ainda que as pessoas devem ter paciência diante da instabilidade dos preços das ações. ;Esse é um investimento que leva tempo para dar um bom retorno. Além disso, nunca se pode investir sem a orientação de uma corretora de valores que seja credenciada na bolsa e na Comissão de Valores Mobiliários (CVM), a xerife do mercado de capitais brasileiro;, orienta.


2012, época de cautela
O ano de 2011 foi péssimo para o mercado acionário. O Ibovespa, principal índice de lucratividade da Bolsa de Valores de São Paulo (BM), registrou queda de 18,1%, o pior resultado entre todas as aplicações disponíveis no mercado. Para 2012, os analistas recomendam cautela aos investidores. Não sem motivos. A crise europeia, que, no ano passado, empurrou os preços dos principais papéis ladeira abaixo, está longe do fim e pode jogar a economia global para a recessão, com sérios efeitos sobre o Brasil.

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