Economia

Demora em concessões impõe um custo elevado ao desenvolvimento do país

postado em 30/01/2012 08:00
O pintor de paredes José Carvalho anda bastante insatisfeito com as estradas onde trafegaO maranhense José Augusto Carvalho, 45 anos, mal sabe o que é privatização. Ainda que busque pela memória, o pintor de paredes, daqueles que se preocupam com cada detalhe do trabalho a ser entregue a seus clientes, não se lembra do nome de nenhuma das empresas que, nas últimas duas décadas, foram vendidas pelo governo ao setor privado. Mas há um ponto sobre o qual Carvalho é enfático e faz questão de opinar: a qualidade das estradas brasileiras. ;São ruins demais. Se o governo não dá conta de mantê-las em bom estado, que transfira essa responsabilidade para alguém. O que não pode é continuarmos com essa situação. Tantos buracos, que provocam tantos acidentes fatais;, diz.

O pintor tem razões de sobra para reclamar, mesmo estando longe de entender como funciona o sistema de concessão de estradas e rodovias à iniciativa privada. Chova ou faça sol, lá está ele, toda manhã, pegando o seu carro para ir ao trabalho e garantir o sustento da mulher, Adriana, 35, e da filha, Júlia, 6. ;Sou totalmente dependente do meu automóvel. Preciso me deslocar por todo o Distrito Federal e por Goiás;, relata o morador da Vila Estrutural, um dos bairros mais pobres da capital do país. A preocupação de Carvalho cresce porque ele ainda está pagando as 30 prestações do seu sonho sobre rodas. Quebrá-lo em uma vala qualquer lhe custará muito caro.

As vendas recordes de carros novos em 2011 não só agigantam as percepções do pintor de paredes como tornam urgente o desafio da infraestrutura rodoviária do Brasil, que, até 2020, deverá ser o terceiro maior produtor de automóveis do mundo. Menos de 20% das estradas são pavimentadas e, pelos cálculos da Confederação Nacional do Transporte (CNT), 24,9 mil quilômetros (ou 27% do total asfaltado) estão em situação crítica.

Mudar essa realidade só depende de vontade política e da maior eficiência do governo. ;Até a China está disposta a investir bilhões de dólares na logística do Brasil. O problema é que os investidores não enxergam regras seguras para isso;, afirma o diretor executivo da entidade, Bruno Batista. ;Os projetos previstos para os próximos 10 anos serão, porém, cruciais para o país avançar sem sustos;, acrescenta Guilherme Floriani, analista de infraestrutura do Ministério de Minas e Energia.

O consenso é claro: a tarefa de reduzir custos de transporte e riscos à vida é do Estado, que há cinco anos tenta recolocar nos trilhos a agenda perdida dos investimentos em infraestrutura. A meta é superar os constrangimentos trazidos pelo crescimento econômico. E graças às concessões de rodovias, ferrovias e aeroportos previstas para este ano, além de leilões do sistema elétrico, a expectativa é de que 2012 seja o marco da retomada das privatizações que o maranhense José Augusto Carvalho não sabe o que significam, mas não tem dúvidas do quanto elas são importantes para o país.

O economista Alexandre Schwartsman, ex-diretor do Banco Central, defende para a logística uma abertura igual à que teve a telefonia, privatizada nos anos 1990. ;O ranço ideológico do governo não dá chance de o investimento privado imprimir a velocidade exigida pelo momento;, critica. Os números da telefonia celular impressionam. O Brasil fechou 2011 com recorde de habilitações, 39,3 milhões, alta de 19,36% sobre 2010. São 242,2 milhões de celulares ativos.

As telecomunicações colecionam progressos que se aceleram com o aumento da renda. O lar da dona de casa Cristina Raquel Dinis Lopes, 43 anos, é um dos 12,74 milhões com tevê por assinatura. A televisão LCD de 32 polegadas que ganhou do marido no Dia das Mães é a diversão dos filhos Marcos Kevin, 10, e Bianca Caroline, 9. ;Eles adoram os desenhos;, conta Cristina. Números da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) mostram que a tevê paga registrou, em 2011, o maior crescimento dos últimos seis anos ; 30,45% ou 2,97 milhões de novos assinantes.

Como planejador e indutor, o Estado tem papel estratégico. Prova disso foi o sucesso, reconhecido no exterior, da política brasileira para enfrentar as recentes crises mundiais, anota o economista Claudio Porto, presidente da consultoria Macroplan. Os bancos públicos, em particular, tiveram papel decisivo para manter os níveis de crédito ao consumo e à produção. À infraestrutura, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) prevê desembolso de R$ 52 bilhões ao longo deste ano.

;Apesar das inúmeras oportunidades, são grandes as chances de atrasos em vários projetos;, pondera Hugo Tadeu, professor de logística da Fundação Dom Cabral (FDC). Ele ressalta que o Estado não só regula a atividade econômica, mas também é dono de grandes e pequenos negócios, sem falar da influência sobre fundos de pensão de estatais, principais investidores do mercado de capitais.
Com isso, o capitalismo à brasileira interfere até na gestão privada. Cerca de 680 empresas de todos os setores têm alguma participação ou influência do Palácio do Planalto. O apetite do Estado-empresário ganhou força no governo Lula e continua com Dilma Rousseff. Nos nove anos da gestão petista, foram criadas várias estatais e recriadas outras, como a Telebrás.

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação