Jornal Correio Braziliense

Economia

Governo quer diminuir gastos com compras diretas e no atacado de passagens

O ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão vai utilizar, por dois meses, um sistema piloto de compra de passagens aéreas sem intermediação de agências de viagem

Começa a funcionar esta semana o sistema de compra de passagens aéreas diretamente pelo governo federal, sem intermediação de agências de viagens. O modelo, que durante dois meses será usado em caráter piloto, apenas no Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, está sob a responsabilidade da central de compras da pasta. Criada em janeiro desse ano por meio de decreto, a central tem o objetivo de reduzir custos nas compras públicas de bens e serviços. No caso das passagens, por exemplo, companhias aéreas assumiram o compromisso de fazer descontos e segurar o preço e o assento por 72 horas. O valor médio dos abatimentos é de 5%.

Além da mudança na aquisição de passagens, a central de compras se prepara para lançar os dois primeiros editais de licitação desde o início de sua operação. Um deles envolve a contratação de serviço de videoconferência para 67 órgãos da administração direta. O outro, a compra de imagens de satélite para 13 ministérios. No primeiro caso, o custo inicial, de R$ 800 milhões, caiu para R$ 100 milhões após a central assumir o processo. Para a compra de imagens ainda não há comparativo.

Segundo Valter Ferreira, chefe da Assessoria para Modernização de Gestão do Ministério do Planejamento e responsável pela central de compras, um dos fatores que ajuda na diminuição do custo é a análise prévia das necessidades dos órgãos públicos. ;[O diferencial] é discutir melhor a demanda e precisar a necessidade. Às vezes, ele [órgão público] tem a percepção de um tipo de necessidade maior do que de fato é o que vai precisar. Quando senta um técnico do seu lado, já muda bastante a configuração;, diz ele, destacando ainda a vantagem de fazer compras no atacado.



;[Quando] negociado no atacado, as pessoas sabem que quem vencer [a licitação] vai fornecer para um conjunto grande de ministérios. Naturalmente, os valores caem mesmo;, explica Ferreira, lembrando que, em 2013, antes da entrada em operação da central de compras, foi feita uma experiência de compra compartilhada para o serviço de telefonia fixa. ;Fizemos economia só por ter feito de forma centralizada de 48% em relação aos contratos existentes. Eram contratos que tinham dois anos e já estavam vencendo. Negociamos para 58 órgãos. [A operação] Demonstra o potencial da central;. De acordo com Valter Ferreira, o objetivo é que, progressivamente, a aquisição de cada vez mais itens esteja sob responsabilidade da central de compras. ;Cada item vai entrando paulatinamente;, diz.

Segundo ele, para auxiliar na escolha do melhor modelo de compra, o Planejamento contratará os serviços de uma consultoria. ;Estamos finalizando a contratação de uma consultoria para nos ajudar a analisar cada objeto que venha para a central. Hoje, nós temos serviços que são prestados e que muitas vezes os órgãos públicos não têm sequer conhecimento. Por exemplo, mobiliário. [Vamos avaliar] se você compra separadamente mesas, cadeiras, ou se compra a estação inteira com serviços prestados de computador. Hoje é possível fazer isso. A iniciativa privada faz muito. E o órgão público continua comprando a mesa separada, o computador separado;, exemplifica.

No caso específico das passagens aéreas, na qual houve a aquisição de uma ferramenta de informática para a compra direta, a ideia é que, após a fase de testes no Ministério do Planejamento, os demais órgãos tenham acesso ao serviço e façam suas próprias pesquisas e compras. O governo federal, no entanto, enfrenta oposição das agências de viagens para implantação do sistema. A Associação Brasileira de Agências de Viagem do Distrito Federal (Abav-DF) recorreu à Justiça e teve negado pela 8; Vara do Tribunal Regional Federal da 1; Região (TRF-1) pedido de liminar para suspender a operação.

Segundo Marcelo Oliveira, assessor jurídico da Abav nacional, a entidade deve se juntar como parte interessada no processo e o setor continuará recorrendo às vias judiciais. De acordo com ele, também foi entregue uma representação ao Tribunal de Contas da União (TCU) questionando a compra direta de passagens. Para ele, haverá prejuízos técnicos e sociais. ;Mais de 80% das agências de viagens do Distrito Federal têm uma concentração muito forte na venda de bilhetes para o governo. A gente tem uma preocupação que o governo imagine que está fazendo um bom negócio, mas a conta saia muito maior. Não existe estrutura do poder público e das companhias aéreas para gerir [a aquisição de passagens]. [Haverá] problemas de reembolso, remarcação. Quem tem expertise é quem existe para isso. Sem falar no prejuízo de caráter social, com demissões incontáveis;, argumenta.

Marcelo Oliveira diz que as agências de viagens questionam ainda a regularidade do credenciamento das companhias aéreas para vender para o governo. ;[Questionamos] o procedimento em si de credenciamento. Credenciamento não é licitação. A nível judicial, foram questionados diversos passos do procedimento;, disse.

Valter Ferreira argumenta que o processo está dentro da lei. ;Agências não emitem passagem. Adquirem das empresas [aéreas]. Por que eu não faço licitação? Porque estou contratando todo mundo que fornece [companhias aéreas]. Basta um credenciamento. É o que a gente chama de inegibilidade [quando não há exigência de licitação];, rebate. Segundo ele, as quatro companhias aéreas com atuação nacional foram credenciadas. Apenas a aquisição de passagens para destinos internacionais continuará a ser feita por agências de viagens, pela impossibilidade de credenciar todas as companhias aéreas com atuação no exterior.

Para José Matias Pereira, professor da Universidade de Brasília (Unb) e especialista em finanças públicas, a iniciativa da central de compras é positiva. ;Quando o governo tem essa possibilidade de centralizar e organizar, a capacidade de negociação dele aumenta. A forma como estão conduzindo os procedimentos, do ponto de vista do direito administrativo, me parece adequado;, comenta. Matias, no entanto, diz que a central deve estar preparada para suportar a demanda. ;É preciso refletir se o governo vai ter estrutura para gerir um sistema complexo como esse, do ponto de vista de tecnologia e recursos humanos. Se ele reunir essas condições, o caminho é esse mesmo;, avalia.