postado em 06/10/2014 06:01
Enquanto 2014 ruma para o fim com crescimento perto de zero, o próximo ano pode ajudar negócios de menor porte a retomar o fôlego, com vendas ao governo. Em 1; de janeiro, passa a valer lei com série de incentivos aos empreendedores em licitações. Entre as mudanças, está a obrigação de que compras de itens de valor até R$80 mil sejam exclusivas de micro e pequenas empresas (MPE).
Pequenos empresários irão, com a medida, disputar sozinhos em raia na qual fluiu R$7,4 bilhões no ano passado. Nas licitações públicas, os bens ou serviços a serem adquiridos podem ser divididos em lotes. Pela lei federal, sancionada em agosto, cada um dos itens que custar até R$80 mil deve ser reservado a empreendedores de menor porte. Antes da norma, a exclusividade era opcional.
Ainda assim, a tendência de aumento da fatia de disputas públicas ganhas por MPEs existia há seis anos, ao menos. Subiram de 58%, em 2008, para 71%, em 2013, nas licitações agora reservadas.
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"Há muitas causas para a alta", aponta Ana Maria Vieira Neto, diretora de logística do Ministério do Planejamento. O setor reúne dados de gastos de toda a administração pública federal. "Notamos que, quando falta capacitação dos gestores públicos e dos fornecedores, as quantias caem. Servidores sem conhecimento não compram." Cortes de orçamento e trocas de gestão, diz ela, também deixam marcas.
Elevar o total ganho por empreendedores menores reflete avanços das duas partes, crê Ana. "O preparo dos empresários cresceu. E, no governo, temos tido economias. Comprar de pequenas empresas não significa pagar mais. Quando aumenta-se a competitividade, os preços baixam.; Em 2013, o Estado poupou 4,1 bilhões ao fechar negócio com MPEs, estima o órgão.
As medidas da lei federal valem para os três poderes, em todas as esferas, mesmo que eles ainda não tenham criado norma própria. Outra novidade é a hipótese do setor público priorizar negócios locais, a fim de fomentar o desenvolvimento regional, desde que justifique a opção. Definido o menor preço válido, a compra poderá ser fechada com uma empresa da área por valor até 10% maior.
Aos olhos de empresários do Distrito Federal, a regra merece atenção, segundo o secretário de Micro e Pequena Empresa, Antônio Augusto de Moraes. ;Vão concorrer, com tratamento distinto, mesmo que haja grandes no páreo.; Órgãos com sede na unidade da federação foram os maiores contratantes de micro e pequenas empresas no ano passado: o valor chegou a R$3,7 bilhões.
Ficou garantida a entrada de microempreendedores individuais (MEI) em licitações. Eles poderão, também, prestar serviços a empresas maiores que tenham vencido, conforme o secretário. ;São reduzidos gastos trabalhistas para quem emprega, como custos de admissão e de aviso prévio. Não se estará contratando empregados, mas pessoas jurídicas, de pequeno porte, com encargos menores.;
Vitória nos detalhes
Vender para o setor público exige situação legal e fiscal em dia. A jornada inicia com cadastro no Sistema de Cadastramento Unificado de Fornecedores (SICAF). Burocracia à parte, os cuidados são iguais aos que servem à iniciativa privada, frisa Andrea de Oliveira, analista do Sebrae. ;É como lidar com qualquer outro grande comprador. A diferença está no processo jurídico aplicado pelo governo.;
Na lista de clientes em potencial, estão as administrações regionais. Pesquisa do Sebrae traz o que cada uma comprou no ano passado. O estudo apurou, ainda, as intenções de aquisição, com base em questionários respondidos pelos responsáveis pelas licitações em cada cidade. ;Serviços são os mais buscados;, detalha Andrea. Planaltina deteve o maior percentual das transações.
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Após ganhar a disputa, resta atender a todos os critérios fixados em edital. ;Já tivemos caso de cliente que concorreu, venceu, assinou o contrato e não conseguiu executar. Ele esqueceu-se de cumprir uma cláusula técnica;, comenta a analista. ;Muitas vezes, a empresa tem capacidade financeira, mas falta gestão. Não há quem cuide dos processos, procedimentos sem estabelecer.;
Feita a própria parte, o empreendedor também deve atentar ao ritmo da máquina pública. ;Há um mito que o Estado não paga em dia. Não é isso. Há problemas em qualquer relação comercial. Se o empresário deixa de planejar, fica à mercê de um só contrato e pode atrasar. Espera que o governo lembre-se de pagá-lo. Pode ser necessário que ele fique alerta ao prazo e cobre. Na dúvida, pergunte.;
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Seguro, porém lento
Atento às tarefas dos tempos de estágio, Rafael Araújo buscou na experiência lições para tocar a própria empreitada. Dos 16 aos 18 anos, trabalhou em almoxarifado da Embrapa. "Recebia as compras de todos os setores, então conheci os produtos. Via o que chegava;, lembra, aos 24. Em seguida, concluído o Ensino Médio, passou outros dois anos em empresa dedicada a licitações.
Somou aprendizados dos dois empregos na criação da própria empresa, em 2010. Nela, 80% dos negócios atendem o setor público. "Nesses quatro anos, ficou bem mais competitivo. Pensava-se que trabalhar com licitações rendia muito, então todos passaram a apostar na área. A concorrência está incrível. Antes, conseguia-se margens em torno de 25%. Hoje, anda difícil chegar a 10%."
Para manter as vendas, o rapaz rastreia editais em sistemas pagos e gratuitos. A RDA Comércio, em Taguatinga, despacha insumos gráficos, como tintas e perfuradores. Entre os órgãos atendidos, estão prefeituras, secretarias, tribunais e ministérios. Com Copa e eleições, 2014 pediu exercício maior de garimpagem. "Trabalhamos, nesse ano, com 30% da nossa capacidade;, compara.
Atrasos já puseram a empresa em risco de quebra, em 2012. Um governo estadual levou sete meses para quitar fatura. ;É bom escolher os melhores clientes. No setor privado, há alta inadimplência. Apesar da demora do cliente público, existe certeza do pagamento. O maior obstáculo é a burocracia;, conta ele, que precisa comprovar os mesmos dados mais de uma vez durante cada processo.