Economia

Cursinhos perdem até 60% dos alunos e anunciam descontos nas mensalidades

Escolas preparatórias perdem até 60% dos alunos e, para sobreviver, anunciam redução de pelo menos 20% nas mensalidades

Vera Batista
postado em 24/11/2014 06:08
Estudantes estão com dificuldades financeiras devido à inflação alta e ao elevado endividamento das famílias

Diante da grande debandada de estudantes das salas de aula ; em algumas turmas, a evasão chega a 60% ;, os cursinhos preparatórios para concursos públicos estão sendo obrigados a reduzir em pelo menos 20% o valor das mensalidades para 2015. Foi o jeito encontrado pela escolas para se adaptarem à nova realidade e garantir o maior número possível de alunos. Os empresários reconhecem: apesar do desejo latente de entrar para o governo, no qual há garantia de bom salário e estabilidade no emprego, o bolso dos concurseiros está falando mais alto. Muitos tiveram a renda solapada pela inflação alta e as famílias, que bancam parte dos custos com as aulas, estão superendividadas.

[SAIBAMAIS]A situação está tão complicada que um dos maiores cursinhos do Distrito Federal, o Gran Cursos, fechará a sua sede no Setor de Indústrias Gráficas (SIG) e concentrará as atividades na Asa Sul, em um espaço bem menor. Além da fragilidade da economia, o dono da instituição, Wilson Granjeiro, atribuiu a menor disposição dos alunos em bancar cursos de até R$ 6 mil ao aumento da concorrência das aulas on-line gratuitas e aos chamados aulões ; eventos específicos com foco em matérias mais importantes para determinados certames.

A redução do número de alunos em salas de aula começou a ser percebida desde junho, com a Copa do Mundo. De início, os empresários acreditaram que o cancelamento de matrículas era passageiro, já que o mundial de futebol coincidiu com as férias de meio de ano. Mas com a economia em recessão, a carestia persistente e a renda comprometida com dívidas, nem o setor que se mostrava imune à crise conseguiu se manter de pé. O jeito será baixar os preços para ganhar escala e, claro, enxugar as estruturas.

Concorrência


Apesar da evidente contração do mercado, Granjeiro minimiza os problemas. ;Não se trata de crise. São as tendências. Não há mais como manter grandes estruturas para os cursos;, afirma, referindo-se à sede do Gran Cursos no SIG, onde se estabeleceu há 26 anos. ;Vamos partir para unidades mais modernas, menores e mais seguras;, assinala. Ele reconhece que, por questão de sobrevivência, o valor pago pelos estudantes terá de cair. E ressalta que cerca de 10 tradicionais concorrentes fecharam as portas das escolas preparatórias nos últimos meses.

Para se adaptar aos novos tempos, o Gran Cursos contratou uma consultoria especializada em reestruturação, a RGF Associados, para definir que caminho seguir. ;O trabalho de formatação termina em dezembro;, conta Granjeiro. No novo desenho, o filho do empresário, Gabriel, 22 anos, recém-formado em negócios pela Universidade de Nova York, vai dirigir os cursos on-line. Granjeiro e a mulher, Ivonete, administrarão outros ativos, como marcas e patentes e franquias do uso da tecnologia.

;Vamos dar um salto a partir de 1; de janeiro de 2015. A ideia é atrair mais estudantes, com menor preço, manter a qualidade e ganhar com a quantidade;, destaca o dono do Gran Cursos. Nesse enxugamento, o número de professores será reduzido. ;Ficarão os mais preparados, bem avaliados e os mais leais. Os próprios alunos já apontaram quem eles querem que continue;, afirma.

Ernani Pimentel, dono do Grupo Vestcon e um dos principais concorrentes de Granjeiro, admite que não há escapatória. É mudar para sobreviver. ;Estamos sendo vítimas da crise econômica. A sensação que temos é a de que o dinheiro parou de circular em todos os segmentos empresariais;, enfatiza. Ele destaca que muitas empresas estão descapitalizadas e atrasando salários. ;O nível de endividamento das famílias subiu muito. Nesse quadro, uma das coisas que as pessoas cortam são os estudos. E um número menor de estudantes derruba o faturamento dos cursinhos;, explica.

Na avaliação de Pimentel, a nova estrutura das escolas preparatórias ficará mais clara em dezembro, quando se encerram as aulas e se fechará o planejamento para o próximo ano com base na quantidade de concursos e de vagas disponíveis na administração pública. Uma tendência é clara: enxugamento do quadro de pessoal. ;Estamos convivendo com o seguinte dilema: baixar preço ou manter os valores e reduzir a quantidade de alunos;, frisa.

Para Max Kolbe, advogado e professor de direito constitucional e defesa do consumidor, as mudanças no setor de cursos preparatórios eram esperada e fazem parte do conceito de modernidade. ;Antes, os melhores professores estavam nos cursos pré-vestibulares. Passaram para os preparatórios. Agora, estão indo para a internet;, simplifica. Os concurseiros devem, contudo, ficar de olho tanto nas aulas on-line quanto nas presenciais.


;Com a redução de preço dos cursos, a qualidade tende a cair. A maioria não admite, mas os empresários normalmente fazem o contrário do que dizem, ou seja, demitem os professores mais caros e eficientes e contratam os mais baratos, normalmente iniciantes;, diz Kolbe. ;Portanto, os alunos terão que dar uma boa garimpada para não jogar dinheiro fora e não sofrer as consequências do péssimo aprendizado mais tarde;, emenda ele, lembrando que, por conta da crise, há docentes sem receber salários há mais de quatro meses.

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