Simone Kafruni
postado em 24/03/2015 19:39
O déficit em transações correntes do Brasil chegou a US$ 89,9 bilhões em 12 meses fechados em fevereiro, o equivalente a 4,22% do Produto Interno Bruto (PIB). Apesar de representar uma queda em relação ao fechamento de 2014, quando o rombo foi de US$ 91,3 bilhões, o comprometimento do PIB aumentou de 4,19% para 4,22%. Para os especialistas, é possível que a relação conta corrente/PIB se deteriore ainda mais, chegando a 5% este ano. Já a estimativa do BC é de fechar 2015 em 4,23%. Se confirmado, será o pior resultado desde 1999, quando foi de 4,32% do PIB.O motivo do comprometimento maior do PIB é que a produção de riquezas do país está menor em dólares por conta da desvalorização do real. ;Em percentual do PIB há uma deterioração sensível;, admitiu Fernando Rocha, chefe-adjunto do Departamento Econômico do BC. Por outro lado, a alta da moeda norte-americana dá mais competitividade às exportações brasileiras porque torna os produtos nacionais mais baratos e atrativos no exterior. Esse movimento fez o Banco Central (BC) revisar a perspectiva para as transações correntes este ano. ;Em dezembro, nossa projeção era de deficit de US$ 83,5 bilhões e reduzimos para US$ 80,5 bilhões;, explicou Rocha.
A autoridade monetária também revisou o deficit de US$ 6 bilhões da balança comercial para um superavit de US$ 4 bilhões no fechamento de 2015, apostando na queda das importações e aumento das exportações em função da desvalorização cambial. Contudo, há uma demora para que a resposta da alta do dólar seja sentida na balança comercial, ressaltou o professor da PUC-SP e consultor Antonio Corrêa de Lacerda. ;Isso envolve decisões como substituir importações por produção doméstica. Do lado das exportações, o comércio mundial ainda está fraco;, avaliou o consultor, para quem a vulnerabilidade do país continua elevada pela grande dependência do exterior.
De fato, conforme os dados do BC, a necessidade de financiamento externo é alta, de quase US$ 30 bilhões. Isso porque os investimentos estrangeiros diretos (IED) somaram US$ 60 bilhões em 12 meses fechados em fevereiro ante deficit nas transações correntes de US$ 89,9 bilhões.
;As principais contas apresentam um enfraquecimento importante, com destaque para as remessas de lucros e dividendos e as despesas em viagens internacionais, que apresentaram quedas de 43,5% e 26,7% frente a fevereiro de 2014;, assinalou o economista da Tendências Consultoria, Bruno Lavieri. Em fevereiro, o IED somou US$ 2,8 bilhões, queda de 30% em relação ao mesmo mês de 2014, quando totalizou US$ 4,05 bilhões.
Para Lavieri, ainda que seja esperada uma redução no deficit em conta corrente em dólares frente ao ano passado, motivada pelo arrefecimento do consumo doméstico e pela depreciação do câmbio, a razão entre o deficit e o PIB deverá se elevar ainda mais em 2015. ;O nível de 4,2% deve chegar a 5% este ano;, estimou. Para 2016, contudo, o especialista projetou que o efeito do novo patamar cambial será mais intenso, levando a um aumento de exportações e redução da relação conta corrente/PIB para 4,7%.
Sem investimentos estrangeiros diretos suficientes para cobrir o rombo das transações correntes, o país fica dependente do capital volátil. Aquele investimento estrangeiro em carteira, aplicado em ações e renda fixa e que pode deixar o país a qualquer momento. Conforme o BC, no primeiro bimestre de 2015 o montante investido em carteira chegou a US$ 11,8 bilhões ante US$ 4,8 bilhões em janeiro e fevereiro de 2014. ;A renda fixa se tornou bastante atrativa. É o dinheiro que vem atrás do juro alto do Brasil;, explicou o ex-diretor do Banco Central, Carlos Eduardo de Freitas, presidente do Conselho Regional de Economia do Distrito Federal (Corecon-DF).
Enquanto o ingresso em ações de companhias brasileiras somou US$ 2,8 bilhões no primeiro bimestre, os investimentos em títulos de renda fixa negociados no país somaram US$ 10,6 bilhões no período. ;Além disso, tem muita gente investindo no exterior. Como não há grandes motivos para aplicar no estrangeiro, a impressão que fica é que os investidores querem sair do Brasil;, alertou o ex-diretor do BC, para quem o quadro das transações correntes deve melhorar este ano por conta de uma atividade econômica mais fraca, importações menores e exportações em alta.