Agência Estado
postado em 12/08/2015 11:18
A decisão do governo federal de manter energia mais competitiva para atender grandes indústrias instaladas na região do Nordeste torna mais cara a energia paga pelos demais consumidores. É o que aponta um estudo elaborado pela Associação Brasileira dos Comercializadores de Energia (Abraceel). De acordo com a Associação, o impacto provocado pela medida equivale a um aumento médio de 1,8% nas tarifas.A situação teve origem na medida provisória (MP) 677, publicada em junho. O texto estendeu até 2037 a vigência de contratos especiais entre a Chesf, empresa do grupo Eletrobras, e indústrias eletrointeNsivas do Nordeste. O custo da energia paga pelas indústrias foi reajustado de imediato em 22,5%, porém o valor de aproximadamente R$ 130/MWh válido a partir de julho permaneceu inferior aos preços a serem pagos pelos consumidores, caso tivessem que recorrer ao mercado de curto prazo.
[SAIBAMAIS]O acordo prevê a destinação de quase 600 MW de capacidade de energia para atender um grupo de grandes empresas formado por Vale, Gerdau, Braskem, entre outras. Para essas indústrias, o acesso a uma energia mais competitiva era condição essencial à continuidade das operações na região.
Para os demais consumidores, entretanto, a medida representa a "retirada" do mercado de um volume importante de energia, o qual deveria ser negociado a preços reduzidos. "Quando o governo elaborou a MP 579, em 2012, ele determinou o regime de cotas nas usinas amortizadas. Seria um benefício ao consumidor, que foi quem pagou o investimento", relembra o presidente da Abraceel, Reginaldo Medeiros.
A MP 579, polêmico texto que determinou novas regras para o processo de renovação de concessões no setor elétrico, previa que, após o fim das concessões das usinas amortizadas, a remuneração dos geradores deveria estar adequada ao custo de manutenção e operação do ativo, este lastreado por cotas, a um preço de aproximadamente R$ 35/MWh. Ou seja, o modelo previa que a energia de usinas antigas, caso dos ativos da Chesf, fosse disponibilizada ao mercado com preços menores.
Mas quase três anos após a divulgação da MP 579 o governo federal decidiu manter o modelo especial de fornecimento que unia a Chesf e as grandes indústrias do Nordeste. Decisão esta que, segundo a Abraceel, representou um acréscimo permanente de 1,8% na conta de luz de todos os consumidores brasileiros, uma vez que as distribuidoras precisarão comprar volume equivalente de energia no mercado, ao invés de ter acesso a uma energia mais barata.
Reivindicação
Além de criticar a falta de isonomia em relação à distribuição das cotas de energia, o presidente da Abraceel alerta para o fato de que a medida ainda pode criar um movimento de insatisfação entre os consumidores. "Se o governo tivesse dado cotas para todo mundo, lá atrás, o efeito seria o mesmo para os consumidores do Nordeste. Agora, criou-se uma nova fonte de pressão. Afinal, por que o consumidor de São Paulo ou de Minas Gerais não pode ter o mesmo tratamento?", salienta Medeiros.
O próprio ministro das Minas e Energia, Eduardo Braga, estimulou a discussão ao afirmar que o modelo adotado no Nordeste poderia ser utilizado para atender outras empresas e regiões do País. "Não estamos falando em repetir a modelagem identicamente, temos de analisar caso a caso", afirmou Braga no dia da publicação da MP 677. "Estamos abertos para sentar e conversar com diversos setores", complementou.
Para abrir novas exceções, contudo, o governo terá de analisar alternativas que garantam acesso a energia mais barata a um grupo específico de consumidores, medida que poderia afetar os demais consumidores novamente. No caso da situação entre a Chesf e as indústrias do Nordeste, essa energia mais barata já existia e o que foi estudado foi uma expansão do prazo de vigência do acordo especial.
Além disso, as indústrias atendidas pela Chesf tiveram de ceder a um reajuste imediato de 22,5% e um acordo de longo prazo corrigido pela inflação. A MP 677 ainda prevê a criação do Fundo de Energia do Nordeste (FEN), de onde virão recursos para novos investimentos da Chesf em projetos de geração de energia, preferencialmente no Nordeste do País.
O governo prevê que o fundo captará no mínimo R$ 2,5 bilhões, montante oriundo do valor mais elevado pago pela energia da Chesf após a publicação da MP. Em um primeiro momento, essa diferença está estimada em R$ 90/MWh, dos quais 30% serão endereçados ao fundo até 2022. Entre 2022 e 2030, a participação sobe para 88% dessa diferença e, entre 2030 e 2037, a totalidade do valor a maior será aportada no FEN.