Economia

Pesquisa mostra que recessão destrói renda e emprego desde 2014

Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) mostra que o país vem sofrendo com a retração da economia há mais de um ano, pondo em risco muitas das conquistas sociais. Segundo analistas, o quadro de 2015 será devastador para as empresas e os consumidores

Paulo Silva Pinto
postado em 14/11/2015 08:03

Quando a presidente Dilma Rousseff buscava a reeleição no ano passado, mostrando na tevê um país róseo, os indicadores sociais e econômicos já mostravam o prenúncio dos dias difíceis que os brasileiros atravessam hoje, com recessão profunda, desemprego em alta e inflação que não dá trégua. O retrato apresentado ontem na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) ainda é, predominantemente, de um país com avanços, com redução no analfabetismo, aumento no número de crianças na escola e elevação na renda per capita. Mas os dados apresentados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) se referem a setembro de 2014, comparados com o mesmo mês de 2013. E, mesmo nesse passado quase remoto, sinais preocupantes se faziam presentes.

O mais escandaloso é a quantidade de crianças e de adolescentes trabalhando. Na faixa de 5 a 13 anos, passaram de 506 mil para 554 mil, um aumento de 9,3%. Quando se amplia a faixa etária para até 17 anos, o número é bem maior: 3,3 milhões estavam trabalhando em 2014. O incremento de um ano para outro foi de 4,5%, o que representa mais 143,5 mil pessoas. Especialistas desconfiam que as crianças estejam sendo obrigadas a ajudar os pais, sobretudo os que têm pequenos estabelecimentos comerciais ou trabalham no campo. É a saída para enfrentar as restrições no orçamento doméstico. Incluídas todas as fontes de renda (salários, aluguéis e outras), houve alta no país, mas queda no Centro-Oeste e no Nordeste.

Também por essa razão, explicam os especialistas, se deu a alta na desocupação de 9,3% ;o maior salto desde 2009. Um contingente de 617 mil pessoas com mais de 15 anos que não trabalhava passou a procurar uma vaga no mercado de trabalho. Isso aconteceu especialmente entre os mais velhos. Com a sensação de que as chances de aumentar a renda estão diminuindo, todos os membros da família se veem obrigados a ajudar a pagar as contas.

Preocupação
Entre as coisas boas captadas pela Pnad está a pequena elevação, de 345 mil, no número de pessoas com carteira assinada no país ; mais 1%. Só que, no Sudeste, houve queda de 220 mil no total de trabalhadores com emprego formal. Também cresceu a desigualdade na região. Nessa área do país, a desocupação cresceu 15,8%, bem acima da média nacional.

O fato de isso acontecer na região mais industrializada do país, e com um setor de serviços mais dinâmico, é um sinal inequívoco, para especialistas, de que o setor privado já estava sofrendo com a crise, que se acentuou mais tarde.

;Em outras regiões do país, isso foi adiado graças à maior dependência de programas sociais do governo, e também do salário mínimo, que tem tido aumentos reais;, afirmou o economista Jorge Arbache, professor da Universidade de Brasília (UnB). ;Como a pesquisa é feita em setembro, não pegou a alta da inflação, de 6,5% para 10%, nem os outros sinais da queda estrutural que o país sofreu. A grande virada veio no fim do ano;, diss.

A Pnad de 2015, a ser elaborada no fim do ano que vem, mostrará números bem piores. E será a última da série anual: mais tarde, o país terá apenas a versão contínua da pesquisa. ;Os sinais da queda na atividade já estavam presentes desde 2013, e se acentuaram no ano passado;, ressaltou o economista Luiz Gonzaga Belluzzo, professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Ele se diz cético com as chances de reversão dos problemas. ;Não sei se há alguém preocupado com isso no governo hoje. Ou com qualquer outra coisa;, acrescentou.

Sem saída
Para a economista-chefe da XP Investimentos, Zeina Latif, os números da Pnad mostram claramente que a recessão já estava chegando ao mercado de trabalho em 2014. Agora, a situação está pior, e tende a se agravar. ;Uma coisa é o fim de um ciclo econômico. Outra, é a onda que estamos vivendo agora, com a contaminação financeira das empresas pela crise;, disse. As companhias médias evitaram demitir até agora, explicou Zeina, porque os custos de dispensar trabalhadores é alto e porque ninguém quer desperdiçar os recursos aplicados no treinamento dos trabalhadores. Agora, os patrões estão se vendo em uma situação em que não têm saída.

Entre as grandes empresas, o apuro maior é entre as que tomaram recursos emprestados em moeda estrangeira. Mesmo com a proteção cambial, muitas podem não resistir à desvalorização do real frente ao dólar. ;Não há hedge (seguro) perfeito. E, para as empresas que chegarem à situação de insolvência, não haverá socorro. Os bancos ajudam quando a companhia enfrenta um problema de liquidez. Mas, se ela estiver prestes a quebrar, não vão colocar dinheiro. O risco é muito alto;, alertou Zeina. Para a economista, a situação pode piorar muito se o Brasil perder o grau de investimento por uma das duas agências de classificação de risco que o mantém, a Moody;s e a Fitch.

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