As usinas de açúcar e etanol devem encerrar a safra 2015/16 (de abril a março) com endividamento recorde de R$ 95 bilhões, um crescimento de 18% sobre o ciclo anterior, 2014/15, quando as dívidas somaram cerca de R$ 80 bilhões. "Houve uma reação dos preços do açúcar e do etanol, sobretudo a partir de setembro, mas o mesmo câmbio que favorece as exportações (de açúcar) também eleva a dívida do setor", afirmou Alexandre Figliolino, diretor do Itaú BBA. Estimativa da União da Indústria da Cana-de-Açúcar (Unica) mostra que a receita do setor deve atingir nesta safra cerca de R$ 84 bilhões, um aumento de 17% sobre o período anterior.
Com a recuperação do açúcar no mercado internacional nos últimos meses, como reflexo da expectativa de déficit de produção global após cinco anos de excedente, e demanda mais aquecida por etanol no mercado interno, as usinas ganharam um fôlego, mas não o suficiente para reverter a situação financeira delicada de boa parte das empresas, segundo fontes ouvidas pelo Estado.
"Nem todas as usinas vão se beneficiar do aumento dos preços", disse Antonio de Pádua Rodrigues, diretor técnico da Unica. Das 450 usinas instaladas no País, 80 delas estão desativadas e cerca de 70 estão em recuperação judicial.
Para fazer caixa, muitas usinas moeram a cana para vender o etanol durante a safra a preços mais baixos. Já os grupos mais capitalizados conseguiram segurar sua produção para vender durante a entressafra, que tem preços mais atrativos.
São poucos os grupos que devem aumentar os investimentos para expansão de seus canaviais. Uma das exceções é o grupo São Martinho. Na semana passada, o empresa anunciou que vai investir R$ 42 milhões na Usina Santa Cruz, em Américo Brasiliense (SP), para aumentar sua produção de 4,5 milhões para 5,2 milhões de toneladas de cana. O grupo tem quatro usinas e capacidade total de 22 milhões de toneladas. "O setor passou por um momento de euforia entre 2005 e 2008. Em 2009, com a crise financeira global, muitas empresas foram afetadas", lembrou Fábio Venturelli, presidente do grupo. O São Martinho foi um dos poucos que reduziu seus custos e manteve rigidez financeira para atravessar a fase mais difícil do setor.
Longa jornada
Apesar de ter começado o ano com notícias favoráveis, como a volta da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) e o aumento da mistura de etanol na gasolina de 25% para 27%, o setor terá uma jornada longa para "arrumar a casa", avaliam analistas. "A recuperação de preços vai ajudar a fazer com que as empresas comecem a gerar resultados para, lentamente, reduzirem o endividamento", afirma Plínio Nastari, presidente da Datagro. Para Júlio Maria Martins Borges, da Job Economia, vão sobreviver à crise as usinas que fizerem boa gestão de risco. "O setor voltará a viver um movimento de consolidação", disse Borges.
As chuvas constantes no Estado de São Paulo e no Centro-Sul do País levaram a Guarani a antecipar o processamento da safra, com uma moagem total de 19,7 milhões de toneladas. "Encerramos a safra mais cedo com alguma cana em pé, entre 400 a 500 mil toneladas", afirmou Jacyr Costa, diretor do Brasil da Tereos, controladora da Guarani. A empresa também realizou uma política de retenção de estoques e, no final de novembro, estava com 56% de etanol estocado.
Luiz Mendonça, presidente da Odebrecht Agroindustrial, disse que a empresa teve avanços já neste ano. "Tivemos aumento de 15% em produtividade e de quase 20% na moagem, com a ampliação da usina Eldorado de 2 milhões para 3,5 milhões de toneladas." Ele vê boas perspectivas para 2016, mas pleiteia decisões no governo que tragam melhor remuneração para o etanol. "Precisa haver sinalizações claras e de longo prazo para que voltem os investimentos."