Economia

Descoberta de cartel não reduz o preço da gasolina

Um mês depois de a Polícia Federal e o Ministério Público do DF desbaratarem quadrilha que combinava valores de combustíveis nos postos, nada mudou. Na época, Cade estimava sobrepreço de 20% nas bombas e lucro diário de R$ 800 mil aos fraudadores

Simone Kafruni, Rodolfo Costa
postado em 30/12/2015 06:05

Janaína Vilela, analista de segurança da informação


Os postos de abastecimento de Brasília desafiam o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) ao não reduzir o preço da gasolina. O custo do litro, que chega a quase R$ 3,80, é um dos mais caros do país (veja quadro). O órgão antitruste, a Polícia Federal (PF) e o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) desbarataram o cartel dos combustíveis na capital federal em 24 de novembro. Na ocasião, o superintendente-geral do Cade, Eduardo Frade, disse que esperava que os preços caíssem e estimava um sobrepreço de 20% no combustível vendido no DF. Como o esquema permitia, segundo cálculos da época, que as redes lucrassem R$ 800 mil por dia, isso significa que, desde então, os consumidores do Distrito Federal desembolsaram R$ 33,6 milhões a mais pela gasolina.

Um mês após a Operação Dubai da PF, que prendeu donos de postos e representantes do setor por combinação de preços da gasolina e manutenção do etanol acima dos níveis que tornam o biocombustível vantajoso, os estabelecimentos ainda praticam os mesmos valores nas bombas. Um frentista da principal rede investigada ; que vendia 1,1 milhão de litros por dia provocando prejuízos totais de R$ 1 bilhão por ano para os consumidores do DF ; afirmou que não há a ;menor chance; de queda nos preços. ;Como resultado dessa operação, o máximo que pode acontecer é não subir mais;, disse.

A operação de novembro animou o empresário Bruno Farias de Albuquerque, 34 anos, que imaginou que, com a descoberta da suposta fraude, os valores nas bombas voltassem ao patamar de R$ 3 ; custo de março de 2014. Passada a euforia, ele não guarda mais expectativas. ;Hoje, não tenho mais uma visão positiva. Os donos de postos se acomodaram com o cartel e não vão baixar os preços. Infelizmente, o brasileiro nasce sendo lesado e vai continuar sendo;, reclamou.

Investigações
Conforme o MPDFT, as investigações continuam em curso para punir os culpados, mas a lei de mercado impede a obrigatoriedade de redução dos preços. ;Como desdobramento da operação, o que avançou foi a aprovação da lei que permite que outros agentes, como supermercados, possam operar postos de gasolina no DF. Isso trará maior concorrência e a consequência pode ser a redução de preços;, explicou o MPDFT, por meio da assessoria de imprensa.

O Cade, autoridade responsável por investigar e punir condutas nocivas à livre concorrência, explicou que a queda nos preços é um dos efeitos ;possíveis e esperados; quando ocorre a desarticulação como a dos donos de postos. ;Ao deflagrar um cartel, o Cade reestabelece a livre concorrência no mercado afetado pela prática do ilícito. Em um ambiente no qual os agentes econômicos voltam a rivalizar entre si, a tendência é que passem a ser oferecidos melhores preços de produtos e serviços para os consumidores;, afirmou, em nota.

O órgão antitruste explicou, ainda, que, em um ambiente sem cartel, os consumidores têm mais incentivo a mudar de posto caso percebam que existem outros agentes praticando melhores preços e ofertas. ;O caso encontra-se em investigação na Superintendência-Geral do Cade. O material apreendido na Operação Dubai e compartilhado com o Cade, com as demais provas obtidas por meio de inquérito administrativo conduzido pelo órgão, ainda está sendo analisado;, esclareceu.

Procurado, o Sindicato do Comércio Varejista de Combustíveis e de Lubrificantes do Distrito Federal (Sindicombustíveis-DF) disse que não se pronunciará sobre a Operação Dubai. ;Não podemos nos pronunciar pelas pessoas envolvidas. O preço de bomba é fixado de forma livre por cada posto, dentro de sua visão de mercado, levando em consideração os valores de compra das distribuidoras;, emendou.

Desânimo
Entre os consumidores, o sentimento é de total desânimo em relação a uma possível redução do custo do litro da gasolina. Para a analista de segurança da informação Janaína Vilela, 35, o suposto cartel continuará operando no Distrito Federal. ;Os donos de postos são muito influentes no meio político. É mais provável o preço subir, mediante um novo reajuste autorizado pela Petrobras, do que cair;, criticou ela, que avalia nunca ter observado concorrência entre os produtos ofertados pelos revendedores.

;Em Uberlândia, onde tenho familiares, o preço do litro varia entre R$ 3,49 a R$ 3,59. Aqui, no DF, é uma diferença mínima, de R$ 0,03;, disse. No Acre, estado que tem a gasolina mais cara ; muito por conta das dificuldades logísticas para o abastecimento dos postos ;, a diferença entre o valor mínimo e máximo é de R$ 0,54. Na Bahia, onde o preço médio do litro é o mesmo que na capital federal, de R$ 3,77, a proporção entre o litro mais barato e o mais caro é de R$ 0,81.

O mesmo sentimento de descrença é compartilhado pelo aposentado Roberto Pozzatti, 75 anos. ;Dificilmente os preços vão cair como se imaginava. Infelizmente, o consumidor não é valorizado pelos empresários do setor;, lamentou. Sem a presença do suposto cartel, ele acredita, no entanto, que os brasilienses pagariam quase metade do preço cobrado atualmente. ;Não faz sentido pagarmos tanto. A população do DF clama urgentemente por mais concorrência;, defendeu.

A matéria completa está disponível aqui, para assinantes. Para assinar, clique

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação