O comércio foi tragado pela recessão, pelo crédito escasso e caro e pela inflação alta. As vendas do varejo registraram queda de 4,3% na comparação com 2014, segundo dados divulgados ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Foi o pior resultado da série histórica, iniciada em 2001. Nesse quadro de forte retração do consumo, houve fechamento recorde de 95,4 mil lojas e destruídos 180,9 mil postos de trabalho. Na avaliação de especialistas, tudo indica que 2016 será ainda pior.
A retração nas vendas foi generalizada. Nem mesmo o segmento de alimentação conseguiu driblar a crise e caiu 2,5%. Com a renda em queda, os brasileiros foram obrigados a retirar produtos básicos dos carrinhos dos supermercados. Isso, mesmo no período de Natal. Em dezembro, as vendas do varejo recuaram 7,1% ante o mesmo mês de 2014. Na comparação com novembro, o tombo ficou em 2,7%. Nunca houve um dezembro tão ruim para o comércio.
Segundo o IBGE, quando incluído os ramos de carros e motos e material de construção, mais dependentes de crédito, a queda na vendas em 2015 foi ainda maior: 8,6%. O índice representou o pior nível da série histórica e selou o segundo ano consecutivo de contração ; em 2014, a retração havia sido de 1,7%. ;Infelizmente, ainda não podemos dizer que o varejo atingiu o fundo do poço;, disse o economista-sênior da Confederação Nacional do Comércio (CNC), Fábio Bentes.
No entender de Bentes, com as perspectivas de alta da inadimplência provocada pela escalada do desemprego, a tendência é de que as instituições financeiras repassem os riscos na forma de aumento dos juros. ;Segmentos mais sensíveis ao crédito, como o de carros, materiais de construção e móveis e eletrodomésticos serão os mais prejudicados;, avaliou. Para este ano, a CNC prevê recuo de 3,9% no varejo restrito e de 7,8% no ampliado.
;Não descartamos, porém, revisões para pior nessas estimativas;, destacou Bentes. Ele prevê que, somente o comércio fechará mais 200 mil vagas em 2016. Não à toa, os analistas preveem que a taxa de desocupação atingirá 12% nos próximos meses. ;O momento é assustador.
E não vemos melhora tão cedo. A inflação continua elevada e a renda dos consumidores não dá mais conta de absorver tantos reajustes de preços e de tarifas públicas;, emendou.
Substituição
O servidor público Everson Nunes, 53 anos, está assustado. A cada ida ao supermercado leva menos produtos para casa. O jeito de não esvaziar a despensa está sendo substituir marcas e mesmo mercadorias. ;Hoje, a substituição de itens é a única forma de não faltar nada em casa;, afirmou. Mas nem sempre essa estratégia dá certo. ;Há dias que, mesmo trocando produtos e marcas, compro menos que o necessário e pago mais caro;, assinalou. Em média, o servidor desembolsa cerca de R$ 900 com compras do mês, o dobro do que gastava há um ano.
Não bastasse ter que lidar com os erros cometidos pelo governo na condução da política econômica, o varejo foi obrigado a conviver com a forte alta do dólar, que encareceu ; e muito ; os produtos importados. A moeda norte-americana cravou valorização de mais de 50% no ano passado. Os comerciantes não tiveram como absorver toda essa alta de custo e repassaram parte dos encargos aos consumidores, que fugiram das lojas. Esse movimento foi de repasse foi mais intenso no segundo semestre de 2015.
;Todos os fatores que poderiam impactar de alguma forma o consumo se deterioraram mais no segundo semestre de 2015, fazendo com que a queda no varejo fosse mais concentrada nos seis últimos meses do ano;, disse Isabella Nunes, gerente da Coordenação de Serviços e Comércio do IBGE. Para 2016, um dos principais fatores que ditarão o ritmo do varejo será a confiança de consumidores e empresários. E não há perspectiva de melhora.
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