Economia

Crescimento acelerado do endividamento público põe mercado em alerta

Órgãos públicos atrasam pagamentos

Rosana Hessel
postado em 25/02/2016 06:05


A possibilidade de um calote da dívida pública do Brasil ganhou maior visibilidade no radar dos investidores após a Moody;s rebaixar o país, ontem, e colocar os títulos soberanos brasileiros no rol dos papéis considerados especulativos pelas agências de rating, ou junk (lixo), no jargão do mercado. Nesta semana, um relatório do diretor de Pesquisa para a América Latina do Goldman Sachs, Alberto Ramos, deixou o mercado alarmado, ao constatar, em visita de três dias ao pais, ;uma percepção crescente do risco de insolvência fiscal;.

Os riscos de uma moratória, como aconteceu nos anos 1980 com a dívida externa, não são imediatos, segundo analistas. No entanto, eles consideram as chances de isso acontecer a médio prazo, caso o governo não consiga fazer um ajuste fiscal capaz de reduzir o ritmo cada vez mais acelerado de crescimento da dívida pública.

No ano passado, o endividamento do setor público bateu em 66% do Produto Interno Bruto (PIB), segundo o Banco Central (BC), que não inclui no cálculo as operações compromissadas, de curtíssimo prazo, que já somam R$ 1 trilhão. Se elas forem consideradas, o endividamento já estaria em mais de 70% do PIB, podendo encerrar o ano em 80%, se nada for feito pelo governo. O aumento vertiginoso da dívida pública foi o principal motivo que levou não só a Moody;s, mas também a Standard & Poor;s e a Fitch Ratings, anteriormente, a rebaixar a nota de crédito soberano do Brasil.

Colchão

Ontem, a Secretaria do Tesouro divulgou os dados da dívida mobiliária, que compreende apenas papéis emitidos pelo governo federal. Em janeiro, o estoque teve queda de 1,54%, para R$ 2,749 trilhões, graças ao resgate de R$ 150,4 bilhões, dos quais R$ 143,9 bilhões da dívida interna e R$ 6,5 bilhões da externa. As emissões somaram R$ 78,4 bilhões. ;Sempre há um volume grande de títulos com vencimento em janeiro, o que faz o estoque caia temporariamente;, explicou o coordenador-geral de Operações da Dívida do Tesouro, José Franco Medeiros de Morais. No entanto, ele avisou que a tendência é de aumento. Neste ano, a dívida pode chegar a R$ 3,3 trilhões, conforme o Programa Anual de Financiamento (PAF) do governo.

Morais minimizou a possibilidade de calote. ;Não existe risco nenhum;, assegurou. Ele negou que haja dificuldade para rolar a dívida e garantiu que o Tesouro tem um colchão de liquidez que dá ao órgão ;folga para escolher o momento mais adequado para novas emissões;, se necessário. Especialistas observam que, como 95% dos títulos são devidos em reais, em caso de dificuldade, o governo teria a opção de emitir dinheiro para pagar os títulos que forem vencendo no mercado doméstico. Só que a consequência disso todo mundo conhece: a volta da hiperinflação.

;Ainda é cedo para falar em calote, mas ele pode ser possível dentro de três a quatro anos, se o governo não conseguir conter o aumento da dívida púbica. Por isso, há muito espaço para a inflação subir, o que não deixa de ser preocupante, porque o custo será bem alto para o brasileiro;, alertou Monica de Bolle, pesquisadora do Peterson Institute for International Economics, em Washington. Pelos cálculos da especialista, a inflação no Brasil não vai ceder. Ficará na faixa de 10% a 20% ao ano até 2018. ;O dado de janeiro e a prévia de fevereiro mostram que o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) não caiu. Ele está em curva ascendente;, alertou.

O economista Simão David Silber, professor da Universidade de São Paulo (USP), também evita o tom alarmista de um calote imediato do governo. ;A dívida externa é muito pequena, perto dos US$ 370 bilhões de reservas internacionais, portanto, essa possibilidade é inexistente;, disse. No plano interno, avaliou, antes de uma moratória, o governo promoveria novos cortes no Orçamento, atrasando o pagamento de obras, benefícios e até salários, a exemplo do que alguns estados superedividados, como o Rio Grande do Sul, foram obrigados a fazer.

Alerta


O presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (Cbic), José Carlos Martins, alerta que alguns órgãos da União já começou a adiar pagamentos. ;Os atrasos do Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes) são de, no mínimo, 60 dias, e a dívida soma R$ 2,8 bilhões;, informou ele, acrescentando que o mesmo ocorre no Ministério das Cidades, com exceção do Programa Minha Casa Minha Vida, que está ;em dia;.

Não é à toa que as expectativas para o país pioraram, principalmente, depois de o governo anunciar um corte de apenas R$ 23,4 bilhões no Orçamento deste ano e propor a criação de uma banda fiscal para poder terminar o ano com deficit de até 1% do PIB. Dessa forma, será difícil evitar que o endividamento continue a crescer, algo muito perigoso para um país que paga uma das maiores taxas de juros do mundo e, por conta disso, tem um custo da dívida elevadíssimo, e que não para de subir. Em janeiro, a taxa média ficou em 16,44%, acima dos 16,07% de dezembro de 2015, e dos 11,84% de dezembro de 2014, conforme dados do Tesouro.

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