Economia

Contas do governo têm primeiro quadrimestre vermelho

De janeiro a abril, o resultado do governo central ficou deficitário em R$ 8,5 bilhões, o pior da série histórica iniciada em 1997. Superavit de abril foi considerado ponto fora da curva por analistas que esperam rombo ainda maior no ano

Rosana Hessel
postado em 31/05/2016 06:00


As contas do governo central, que reúne Tesouro Nacional, Banco Central e Previdência Social, fecharam o quadrimestre pela primeira vez no vermelho desde 1997, início da série histórica. O deficit foi de R$ 8,5 bilhões. Em abril, no entanto, houve superavit primário (economia para o pagamento dos juros da dívida pública) de R$ 9,7 bilhões, o valor mais baixo para o mês desde 2013.

Tradicionalmente, abril é um mês de aumento na arrecadação, mas não foi o que aconteceu em função da recessão econômica. A receita líquida do governo central encolheu 6,9%, em valores reais (descontada a inflação), na comparação com o mesmo intervalo de 2015, para R$ 103,6 bilhões.

De acordo com os dados divulgados ontem pelo Tesouro, nem mesmo o Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF), cujo prazo de entrega das declarações terminou no mês passado, ajudou a reverter a queda de receita. O recolhimento do IR cresceu apenas R$ 329 milhões em relação ao mesmo período de 2015, apesar de a correção da tabela ter ficado abaixo da inflação, obrigando mais contribuintes a prestar contas ao Fisco. A Contribuição sobre o Lucro Líquido (CSLL) foi uma das raras exceções com alta de arrecadação. Cresceu 15,7%, em termos reais, para R$ 7,8 bilhões no mês passado.

Enquanto isso, as despesas diminuíram em um ritmo menor, de 6,4% em abril, para R$ 93,9 bilhões, na comparação o mesmo período de 2015. Desde janeiro, o descompasso entre arrecadação e despesa foi maior. A receita no quadrimestre cresceu 4,1%, principalmente devido às receitas extraordinárias de R$ 11 bilhões com concessões. Já as despesas cresceram 2,2%, o que confirma a teoria dos analistas de que esse resultado positivo de abril é um ponto fora da curva.

;Não dá para comemorar porque todo mundo sabe agora o tamanho do rombo fiscal deste ano. Esse saldo positivo de abril não vai refrescar o deficit esperado para o ano, que será próximo ao da nova meta fiscal, de R$ 170,5 bilhões;, avisou o economista-chefe da Sul América Investimentos, Newton Rosa. Ele acaba de elevar a previsão do rombo fiscal do setor público de 2,2% para 2,7% do Produto Interno Bruto (PIB), alinhando a estimativa com o novo objetivo fiscal aprovado pelo Congresso Nacional na semana passada.

Na avaliação do professor de administração pública da Universidade de Brasília (UnB) José Matias-Pereira, o superavit fiscal de abril apenas mostra um cenário de economia que começa a travar. ;Esses comportamentos atípicos são comuns, mas não revelam que a economia está voltando a crescer. Ainda há muita instabilidade política e econômica e isso vai se repetir até o novo governo conseguir colocar a locomotiva de volta nos trilhos;, destacou.

O secretário do Tesouro, Otávio Ladeira, reconheceu que essa queda nas despesas de abril não deverá se repetir nos próximos meses, pois uma série de gastos foram postergados e devem impactar as contas a partir de maio, como é o caso de R$ 1,1 bilhão de dívidas de abril, do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), que foram pagos neste mês.

Além disso, despesas com subsídios, que pesaram R$ 11 bilhões nas contas de janeiro, devem aparecer nesse mesmo montante em julho, devido às mudanças no cronograma de pagamentos desde o início do ano. Somente em abril, as despesas obrigatórias com subsídios e subvenções econômicas diminuíram 38,6%, ou seja, R$ 8,6 bilhões graças a essas mudanças.

Outro desembolso que saiu do radar das contas da União foram os investimentos do Minha Casa Minha Vida (MCMV), que deixaram de custeados pelo Tesouro neste ano e passaram a ser financiados pelo Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Com isso, os gastos com esse programa despencaram 60,6% no quadrimestre, para R$ 2,2 bilhões.

Meta


A nova meta fiscal para este ano, que permite um rombo de até R$ 170,5 bilhões, segundo o secretário do Tesouro Nacional, permitirá ao governo evitar restos a pagar para 2017. Ladeira avisou que a União pretende pagar as despesas realizadas neste ano e que estão em atraso. ;Pela primeira vez, em alguns anos, vamos colocar as contas em dia, para não deixarmos a fatura e o valor devido para janeiro do ano seguinte;, afirmou. Ele destacou que, a partir de agora, o novo governo perseguirá o novo objetivo fiscal.

Rosa, Sul América Investimentos, demonstrou preocupação com a tendência de aumento das despesas em 2016 com a nova meta fiscal. Eles consideram que é importante que o governo aprove logo medidas para limitar o gasto público, e, assim, evitar aumento da trajetória da dívida pública, que deverá chegar perto de 82% do PIB no ano que vem. ;É importante que os subsídios diminuam, mas ninguém quer abrir mão das benesses para evitar aumentos de impostos. A despesa, neste ano e no próximo, deve ficar acima de 20% do PIB, enquanto as receitas patinarão em 16% a 17% do PIB;, destacou o economista.

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