Economia

"Chegou a hora da verdade", diz Carlos Kawall sobre recessão no país

Economista-chefe do Banco Safra diz que o país vive recessão sem precedentes, mas pode superar dificuldades se fizer ajuste fiscal e aprovar reformas como a da Previdência Social

Paulo Silva Pinto
postado em 13/06/2016 06:52
O economista-chefe do Banco Safra, Carlos Kawall, é um entusiasta da proposta de teto para os gastos públicos, que o governo pretende enviar ao Congresso. E não é de hoje. Como secretário do Tesouro Nacional, em 2006, início da gestão de Guido Mantega no Ministério da Fazenda, ele defendeu a proposta, que era discutida na equipe, mas nunca emplacou. A ideia atual, ele destaca, é muito melhor, porque envolve mudança constitucional, e, com isso, será possível controlar gastos determinados pela Carta Magna. Kawall não tem dúvidas de que a população, se fosse chamada a opinar, seria favorável à regra. ;A beleza é que essa ideia atrai, porque as pessoas acham que tudo tem que ter limite;, diz.

Depois dos oito meses que passou no governo, o economista se transformou em uma das principais referências como analista de mercado, primeiro no Citibank; depois, no Safra. Mesmo longe da Esplanada dos Ministérios, colaborou com a equipe do ministro Nelson Barbosa, antecessor de Henrique Meirelles, na elaboração da proposta de um depósito remunerado das instituições financeiras no Banco Central. Isso substituiria as operações compromissadas, mecanismo usado para o controle da liquidez que acaba por gerar distorções regulatórias, sobretudo na definição do tamanho da dívida pública.

Kawall nota, aliás, que a equipe de Barbosa já havia avançado bastante na discussão de um mecanismo de controle de gastos públicos, ainda sem chegar, porém, à ambição da emenda constitucional que Meirelles promete enviar ao Congresso. O economista acredita que a proposta está madura para ser colocada em prática. Mas, se for rejeitada, será uma escolha da sociedade por uma inflação mais alta. Veja, a seguir, os principais trechos da entrevista ao Correio.


Como vê o primeiro mês do governo do presidente interino, Michel Temer?
O mais importante, neste momento, é constatar que há um diagnóstico para a economia. Vamos ver propostas de reformas, que serão enviadas em breve ao Congresso. A ideia é que o país precisa enfrentar o desajuste das contas públicas de forma estrutural. Isso não se desvia radicalmente do que era proposto pela equipe anterior do Ministério da Fazenda, a qual determinou que o gasto público fosse contido sob certas condições. Ia, portanto, no sentido do teto de gastos, mas tinha o vício de não envolver dispositivo constitucional, portanto, não afetando gastos obrigatórios. Mesmo assim, já era claro para eles que a recuperação cíclica do crescimento do país não permitirá a adequação das contas públicas. Comparativamente, o Estado brasileiro gasta mais do que em outros países emergentes, e isso é incompatível com crescimento econômico.



Qual o benefício que o limite para aumento dos gastos públicos proporcionará se for aprovado pelo Congresso?
Permitirá que, independentemente de quem assumir o governo a partir de 2019, haverá uma trajetória crível em um ambiente de inflação baixa e de crescimento econômico. Pode ser que a sociedade brasileira prefira uma situação de inflação alta, e ascendente, e então será a hora da verdade. Se houver a rejeição da proposta de teto dos gastos, não haverá alternativa senão essa. A intenção da atual equipe é conciliar crescimento e inflação baixa, que fará com que tenhamos taxas de juros bem menores, que só serão possíveis se forem criadas as condições para que isso ocorra estruturalmente, não artificialmente.

É possível crescer com inflação alta?
Sim, mas será como nos anos 1980, como o famoso voo de galinha. A gente sabe que uma situação assim, de inflação alta, pune os mais desfavorecidos, há aumento da desigualdade, perdendo-se algo que melhorou muito nos últimos anos. Em um ambiente de forte aumento de preços, o crescimento é de outro padrão, com piora da distribuição de renda, desorganização da atividade produtiva e volta dos mecanismos de defesa contra a inflação. Acaba, enfim, o que achávamos que era uma conquista. Ninguém faria uma opção consciente por isso, seria inconsciente, mas, ainda assim, seria uma escolha. Se as pessoas disserem que não querem aceitar o ajuste fiscal, a solução é a inflação. Instala-se, então, a dominância fiscal, em que não se pode elevar a taxa de juros para segurar os preços porque isso afeta muito o risco Brasil.

Qual a vantagem do limite para gastos?
A ideia do teto de gastos é a melhor que surgiu nos últimos tempos. Conceitualmente, dá ao orçamento realismo, no sentido de que substituiu regras automáticas de vinculações e do crescimento de despesas, deixa claro o que é ou não prioridade, contendo o que é possível. Do contrário, tem que elevar a carga tributária, que, no Brasil, já é muito alta. O teto reverte a tendência, que existe desde 1997, de aumento dos gastos acima do crescimento do PIB (Produto Interno Bruto). Se for mantida ao longo de oito anos, poderemos voltar a ter superavit primário de 2% do PIB. O mecanismo é tão mais eficaz quanto maior for o avanço econômico. Se houver garantia constitucional do teto, é muito mais relevante para garantir crescimento e investimento com taxas de juros mais baixas.

A matéria completa está disponível aqui, para assinantes. Para assinar, clique aqui.

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação