As famílias estão levando sova da inflação. Em 12 meses, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) cravou em 8,97%, segundo divulgou ontem o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O resultado ficou acima do observado nos 12 meses imediatamente anteriores, de 8,74%. Para analistas, é um sinal de que o custo de vida segue resistente, carregando a herança da alta de preços de 2015. Dessa forma, é cada vez mais provável que a carestia feche o ano próximo da expectativa do mercado financeiro, de 7,34%. No ano, a taxa acumula alta de 5,42%.
Nem mesmo o recuo mensal da inflação representa um alívio. Em agosto, o IPCA ficou em 0,44%, abaixo do resultado de 0,52% observado em julho, mas o maior resultado para o mês desde 2007. O índice de difusão, que mede a disseminação da alta de preços no mercado consumidor, ficou em 63,5%. Isso significa que, a cada 100 bens e serviços, quase 64 apresentaram elevação de preços. Para analistas, o aumento no número de produtos que ficaram mais caros é o principal sinal de resiliência da inflação. O indicador estava em queda entre março a junho, mas voltou a subir nos últimos dois meses.
Para o economista-sênior da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), Fábio Bentes, o crescimento da difusão é preocupante. Diferentemente da disseminação observada entre novembro de 2015 a fevereiro deste ano, quando ficou acima dos 70% em decorrência da alta dos preços administrados, o alastramento atual é causado por pressões exercidas por preços livres. Ou seja, nem mesmo a queda do consumo provocada pela recessão está sendo suficiente para segurar os aumentos.
Feijão
Entre os gastos que contribuíram para pressionar a inflação, Bentes destaca os com despesas pessoais, alimentação e educação. Somente os custos médios com hotéis, empregado doméstico, ensino superior, leite longa vida, mamão, arroz e leite em pó contribuíram juntos com 0,21 ponto percentual do IPCA em agosto, ou seja, responderam por 47,7% do indicador. ;É natural que os consumidores estejam sentindo no bolso o aumento de gastos com feijão, mas o drama da inflação vai muito além desse tipo de produto. De alguma forma, os preços dos alimentos e de alguns itens da cesta de consumo das famílias estão contaminando outras classes de despesas;, disse.
O auxiliar de escritório Severino da Silva, 42 anos, tem sentido no bolso a disseminação de preços na economia, principalmente no consumo de alimentos. ;Às vezes é até difícil de acreditar que os preços estejam subindo tanto. Faço o possível para comparar os valores dos produtos, mas sinto que é em vão. Seja em qual supermercado vou, a sensação é de tudo está muito caro;, lamentou. A situação financeira da família dele piorou depois que a mulher ficou desempregada, em julho. ;Sem o salário dela, a renda familiar caiu quase 40%. Desde então, cortamos ainda mais os supérfluos e estamos vivendo estritamente do básico;, disse.
Em agosto, os gastos com alimentação e bebidas subiram em média 0,30%, abaixo do resultado de 1,32% registrado em julho. O IBGE atribuiu o movimento aos gastos com batata-inglesa e feijão-carioca, que recuaram 8% e 5,6%, respectivamente. Em contrapartida, as frutas subiram 4,94%, com a maior contribuição para alta dessa classe de despesas, de 0,05 ponto percentual. O preço da banana-d;água, por exemplo, subiu 15,1%. ;Até para comer de forma saudável está difícil. As frutas estão pela hora da morte;, reclamou.
Mas se houve desaceleração na alta dos preços de alimetos, os gastos com educação deram um salto. O grupo saiu de uma elevação de 0,04% em julho para 0,99% em agosto, segundo a gerente do IPCA, Irene Machado. ;Há cursos diversos que normalmente têm as mensalidades reajustadas no segundo semestre;, disse. Houve pressão no bolso também por conta das despesas pessoais, que subiram 0,96%, ante um crescimento de 0,70% observado no mês anterior. O principal motivo para o aumento foram os Jogos Olímpicos. As diárias com hotéis, no período, subiram 11,58%, puxadas pelo aumento de 111,23% captado apenas no Rio de Janeiro.
A carestia resiste há tanto tempo que até mesmo quedas mensais como a do feijão-carioca, por exemplo, não são sentidas ou comemoradas pelos consumidores. O empresário Dydier Fernandes, 33, foi categórico: ;Não tem como achar barato o quilo do feijão a um valor de aproximadamente R$ 10, como alguns supermercados estão cobrando;. Na opinião dele, por mais que esteja menos caros do que em meses anteriores, o preço continua absurso quando comparado ao de um ano atrás. A vendedora autônoma Laura Cutrim, 28, também se queixa do feijão. ;Os valores continuam muito altos. E mal adianta substituir um produto pelo outro, porque outros tipos também estão com custos elevados;, disse. Em 12 meses, o valor pago pelo feijão-carioca subiu 160,2%. É o item de maior variação entre os pesquisados pelo IPCA, seguido de perto pelo tipo mulatinho, com alta de 129,9%, e o preto, de 94,4%.
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