Economia

Na BR-040, a única coisa que funciona é o pedágio, reclamam motoristas

Sem caixa para tocar o empreendimento, com um dos sócios envolvidos na Lava-Jato, consórcio responsável pela duplicação da rodovia que liga o DF ao Rio de Janeiro paralisa as obras. Empresa reclama da demora na emissão de licenças

Simone Kafruni
postado em 12/03/2017 08:00
Atraso na modernização da estrada prejudica 35 municípios. No km 27, trecho que deveria estar pronto para os carros é usado por ciclistas

Enquanto o governo tenta alavancar investimentos em infraestrutura para aquecer a economia, lançando pacotes de concessão, rodovias cedidas ainda em 2013 estão com obras paradas e sem perspectiva de retomada. A duplicação da BR-040, estrada que liga o Distrito Federal ao Rio de Janeiro, está paralisada, atrasando o desenvolvimento de 35 municípios. No entanto, as 11 praças de pedágio instaladas ao longo dos 936,8 quilômetros do trecho entre Brasília e Juiz de Fora (MG), sob responsabilidade da Via 040, operam normalmente e cobram, cada, R$ 4,80 por eixo de veículos longos e por carros de passeio.

O caminhoneiro Antônio Welson Ferreira, 34 anos, oito como motorista de uma transportadora de veículos, se surpreendeu com as condições da rodovia. Ele e 28 colegas de um comboio de cegonhas carregados de carros importados viajaram 1,4 mil quilômetros entre Vitória (ES) e Anápolis (GO), a maior parte pela BR-040. ;Esperava mais trechos duplicados. Mas só passei por uns poucos quilômetros de pista dupla;, conta. Com cinco eixos, o caminhão de Antônio deixou R$ 264 nos pedágios da rodovia e, ao chegar próximo de Cristalina (GO), tinha percorrido apenas 21 km duplicados.

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Isso porque, do total da concessão, 8,4 km estão no DF, 157,3 km em Goiás e 771,1 km em Minas Gerais. Porém, apesar de 10 das 11 praças de pedágio estarem em território mineiro, a maior parte duplicada fica em Goiás. A Via 040 explica que executou 73 km de obras entre Luziânia (GO) e João Pinheiro (MG). ;Os trechos duplicados representam 13,1% do segmento total de pistas simples a serem modernizadas, superando a meta estabelecida pelo contrato, que é de 10%;, afirma.

A Invepar, empresa responsável pelo consórcio, cujos sócios são a OAS, envolvida na Lava-Jato, e os fundos de pensão do Banco do Brasil (Previ), da Petrobras (Petros) e da Caixa Econômica Federal (Funcef), não tem caixa para tocar o empreendimento. A OAS está em processo de recuperação judicial e os fundos de pensão não querem aportar mais dinheiro na sociedade. Além disso, a empresa depende de licenças ambientais e de financiamento. O empréstimo de quase R$ 1 bilhão prometido pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) em 2014 ainda não saiu.

Praça de pedágio em Cristalina (GO): usuários reclamam que pagam caro para usar infraestrutura ainda precária

O início da operação da rodovia foi em 22 de outubro de 2014. Desde então, a Via 040 diz oferecer uma série de serviços, como socorro mecânico, com a utilização de guinchos leves e pesados, atendimento médico de emergência, sistema de combate a incêndios e apreensão de animais, presença constante de inspetores de tráfego na rodovia e manutenção. De fato, a operação tapa-buracos está ativa. Vários trechos estão remendados, funcionários da empresa cortam grama e roçam o mato e há, nos postos do consórcio ao longo da estrada, equipamentos e veículos de socorro.

A eficiência no atendimento, no entanto, é contestada pelos usuários. Edílson Moreira Júnior, 23, motorista de caminhão que percorre o trajeto entre Luziânia (GO) e Paracatu (MG) com frequência para transportar silos, grãos e areia entre as propriedades da região, diz que já ficou esperando por mais de três horas pelo resgate da Via 040. ;Eu tive um problema no filtro e pedi ajuda lá pelas 18h. O guincho chegou depois das 21h e o posto nem era longe de onde eu estava parado;, reclama.

Os caminhoneiros não são os únicos a se queixarem da Via 040. Com um restaurante à beira da estrada, no km 139, em trecho ainda não duplicado a 55 quilômetros de Paracatu, a empresária Ilda Alves dos Santos, 45, conta que foi ameaçada por funcionários do consórcio. ;Recebi documentos da empresa exigindo que eu faça sinalização na frente do restaurante e instale quebra-molas e faixas. Pesquisei, e isso custaria cerca de R$ 50 mil;, diz. ;Eles disseram que, se eu não fizesse as obras em 30 dias, fechariam a entrada do meu estabelecimento;, revela. ;Eu acho que isso não é de minha responsabilidade. Questionei a empresa e avisei que ia procurar a Justiça. O prazo que me deram já passou e nunca mais veio ninguém aqui;, acrescenta.

Ilda acredita que as obras de duplicação, que estão atrasadas e ainda distantes do restaurante dela, vão prejudicar seu negócio. ;Eles (a Via 040) não querem fazer um retorno. Ameaçam construí-lo muito longe daqui. Então vou perder a maior parte dos meus clientes, porque só vão parar aqueles que viajam de Brasília ao Sul. E o fluxo maior é no sentido contrário;, lamenta.

Dona de um restaurante no km 139, em Paracatu (MG), Ilda Alves do Santos teme que o negócio seja prejudicado

Licenciamento

A paralisação nas obras de duplicação foi causada pelo atraso no processo de licenciamento ambiental, cuja responsabilidade é da Empresa de Planejamento e Logística (EPL), estatal vinculada à secretaria executiva do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), alega a Via 040. ;A continuidade das obras de duplicação e a conversão dos trechos de multifaixas em pista duplicada, de aproximadamente 629 km, estão vinculadas à emissão e transferência do licenciamento ambiental de todo trecho concedido à Via 040;, informa a empresa, por meio da assessoria.

;Todas as solicitações de informações da EPL à Via 040 foram respondidas. O prazo para a conclusão do projeto de modernização da BR-040 previsto em contrato é de até 60 meses, contados a partir do recebimento da licença ambiental em nome da concessionária. As obras de ampliação e melhorias estão dentro do prazo acordado;, emenda o consórcio.

A concessão, iniciada em 2014, tem prazo contratual de 30 anos e fez parte da 3; etapa dos leilões realizados pelo governo federal em dezembro de 2013. Pelo contrato, devem ser investidos R$ 8 bilhões no período. Conforme a Via 040, até dezembro de 2015, foi aplicado R$ 1,07 bilhão.

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