Economia

Governo federal revisa contas e prevê rombo fiscal ainda maior

Projeção de deficit do governo central no ano que vem sobe 63% e passa para R$ 129 bilhões. Segundo o ministro da Fazenda, piora dos números reflete a crise na economia e não tem relação com mudanças na proposta de reforma da Previdência

Rosana Hessel, Julia Chaib
postado em 08/04/2017 08:00
Um dia após o presidente Michel Temer ceder às pressões da base aliada e aceitar mudanças na proposta de reforma da Previdência, a equipe econômica antecipou o anúncio da alterações nas metas fiscais de 2018 e de 2019. O deficit do governo central (Tesouro Nacional, Banco Central e Previdência) estimado para o próximo ano passou de R$ 79 bilhões para R$ 129 bilhões, um aumento de 63,3%. Já o resultado primário de 2019, que era zero, virou um saldo negativo de R$ 65 bilhões. O governo acredita que somente em 2020 as contas ficarão no azul, com um magro superavit de R$ 10 bilhões.

A expectativa era de que a divulgação dos indicadores do Projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) do próximo ano ocorresse apenas na semana que vem, antes do feriado da Semana Santa. Mas, depois de uma reunião de Temer com os ministros Henrique Meirelles (Fazenda) e Dyogo Oliveira (Planejamento), que não estava na agenda, as novas metas foram anunciadas, confirmando que, até 2019, as contas públicas completarão seis anos no vermelho.

Com os rombos sucessivos, a dívida pública bruta continuará em crescimento acentuado. Pelas estimativas do mercado, ela ultrapassará 80% do Produto Interno Bruto (PIB) no próximo ano, e, se a taxa básica de juros (Selic) continuar no patamar atual, de dois dígitos, o país ficará à beira da insolvência. Meirelles não quis fazer projeções sobre a evolução do endividamento do governo.

Deterioração


A projeção fiscal para 2017, que prevê deficit de R$ 139 bilhões, não foi alterada. Especialistas ouvidos pelo Correio, no entanto, acreditam que, no segundo semestre, ela também será modificada, devido à deterioração das projeções econômicas. ;As previsões de crescimento do PIB estão constantemente sendo revisadas para baixo. O governo está recuando muito nas reformas e, dessa forma, não terá outra saída a não ser mudar novamente as metas;, comentou o economista Istvan Kasznar, professor da Fundação Getulio Vargas (FGV). Nas projeções divulgadas ontem, a estimativa de crescimento do PIB neste ano caiu de 1,6% para 0,5%. Com isso, a arrecadação tributária será menor do que o esperado, o que deve agravar a situação das contas públicas.

;O governo fraquejou ao flexibilizar a reforma da Previdência, e a equipe econômica não está conseguindo ajustar a economia porque os consumidores continuam pagando juros altos demais;, criticou Kasznar. Para ele, apesar de ter anunciado um corte de R$ 42,1 bilhões no Orçamento, o governo está comprometido com a liberação de emendas parlamentares para aprovar a reforma. ;O fato é que o Executivo fez um contingenciamento muito grande e não consegue se mover. A queda na arrecadação deverá continuar porque a economia atravessa uma recessão muito forte, e o governo não conseguirá reduzir o tamanho do deficit;, completou.

Na avaliação de Newton Rosa, economista da SulAmérica Investimentos, o mercado não deve reagir negativamente, porque as previsões ficaram mais realistas, mas será difícil cumprir a meta fiscal deste ano. ;É possível que ocorram novas alterações nas projeções, conforme avancem as discussões das reformas no Congresso;, disse. Para o economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale, a revisão das metas foi positiva porque é um sinal de transparência do governo. ;Se há riscos para o resultado do ano que vem, melhor ajustar agora. Mas esse é o menor dos problemas, porque, se a reforma da Previdência não vier, eles vão ter que revisar esse deficit para pior, ou promover um enorme aumento de arrecadação, o que faria a recessão voltar;, disse.

Negociação


Meirelles disse que as mudanças na LDO decorrem da crise vivida pelo país e negou que a piora das metas fiscais esteja relacionada ao recuo de Temer na proposta da reforma previdenciária. ;As mudanças feitas na Previdência estão dentro do espaço considerado como necessário para uma negociação democrática;, afirmou. Segundo ele, as alterações estavam ;precificadas pelo mercado;.

Apesar de o ministro afirmar que os gastos devem cair com a PEC do Teto, dos atuais 20% do PIB para 17,80%, em 2020, especialistas não têm certeza de que isso realmente ocorrerá. ;O ajuste fiscal está sendo feito pelo mercado privado, que demitiu mais de 13 milhões de trabalhadores. Mas o governo, até agora, não convence que está fazendo ajuste, porque a máquina do Estado é inchada e ineficiente e ele não faz nada para corrigir isso;, criticou Kasznar, da FGV.

Alberto Ramos, economista do Goldman Sachs, avaliou que os deficits maiores em 2018 e 2019 refletem ;o fraco desempenho da receita projetada devido à queda acentuada da atividade econômica e à expectativa de recuperação superficial pouco inspiradora, mas também ao fato de que os gastos públicos, já altos, continuam crescendo em termos reais;.

* Estagiário sob supervisão de Odail Figueiredo


  • Perda de até R$ 160 bilhões

    Para Meirelles, as modificações na proposta de reforma da Previdência anunciadas na quinta-feira vão provocar uma redução de 15% a 20% na economia de despesas com as quais o governo contava nos próximos 10 anos, a partir da mudança do sistema. Nesse período, a equipe econômica esperava poupar entre R$ 750 bilhões e R$ 800 bilhões. Agora, terá que abater entre R$ 112 bilhões e R$ 160 bilhões dessa conta. O ministro descartou medidas para contornar o problema. ;Algumas mudanças estão dentro das nossas previsões, portanto, não temos nenhuma visão de medidas ou propostas compensatórias;, garantiu.

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