Economia

Queda na renda das famílias mostra o valor da economia dos centavos

Escolados pela crise dos últimos anos, os brasileiros se tornam mais criteriosos na hora de comprar. Pequenas diferenças no preço dos produtos e ganho com promoções podem representar economia significativa no fim do mês

Marlla Sabino*
postado em 03/06/2017 08:00
Além de ter diminuído a quantidade de produtos que coloca no carrinho, a gerente administrativa Edna Abanas procura sempre por preços mais em conta

Com menor poder aquisitivo e renda comprometida com dívidas, os brasileiros aprenderam a apertar o cinto para controlar o orçamento. Conforme o ditado ;de grão em grão, a galinha enche o papo;, é assim que as pessoas estão conseguindo fechar as contas no fim do mês: contando os centavos, seja na hora de abastecer o carro ou de decidir o que colocar no carrinho do supermercado.

O empresário Tomás Franco, 29 anos, sente os resultados da economia no bolso. Para tentar aliviar o orçamento, já sobrecarregado com as despesas domésticas, ele sempre aproveita promoções para encher o tanque. ;Perto da minha casa, a gasolina estava R$ 3,59. Mas eu sabia que passaria por aqui hoje e consegui economizar R$ 0,30 por litro. Parece pouco, mas, calculando por 30 dias, é uma diferença grande no fim do mês;, contou ele, após abastecer o carro num estabelecimento que oferecia o combustível mais barato.

Apesar dos sinais de retomada da economia, o consumo doméstico cai há nove trimestres consecutivos, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Nos três primeiros meses de 2017, houve recuo de 0,1% em relação ao período anterior. O impacto disso é visto no carrinho de compras da técnica em enfermagem Valéria Gomes, 50 anos. ;Estou sempre experimentando marcas novas que têm preços menores;, disse ela, enquanto examinava as prateleiras de um supermercado do qual é cliente.

;O consumidor deve abrir a mente para arriscar em novos produtos. Temos uma grande variedade de marcas, é importante buscar opções mais baratas para não deixar de levar algo para casa;, aconselha o educador financeiro e idealizador do canal Eu Defino, Alexandre Arci. Nem sempre, porém, o custo cabe no orçamento. ;Em casa, trocamos a carne bovina por frangos e peixes, e nem sempre temos muita variedade. Se não economizar aqui, no fim do mês a conta não fecha;, desabafou Valéria.

Além da quantidade, o preço se tornou o fator principal que o consumidor considera na hora de comprar. O economista sênior da Confederação Nacional do Comércio (CNC), Fábio Bentes, explicou que rever as despesas é uma atitude natural das pessoas em meio às dificuldades financeiras e à falta de emprego. ;O brasileiro passou a contar os centavos, pois qualquer economia é bem-vinda;, destacou.

Posto de gasolina em Taguatinga: redes buscam atrair o consumidor com promoções e redução no preço do combustível

Cortar itens da lista de compras e ficar de olho no preço é a tática da gerente administrativa Edna Albanaes, 39 anos, na hora de fazer o supermercado. ;Só levo o básico e compro em diferentes estabelecimentos. Produtos de limpeza, por exemplo, busco no atacadão em grandes quantidades para obter preço mais baixo;, afirmou. Nos últimos meses, ela conseguiu cortar o orçamento de compras domésticas de R$ 700 para R$ 400. ;Reduzi a quantidade de produtos e passei a procurar promoções. Como vou a vários lugares, sempre acompanho os preços, para saber se a diferença realmente vale a pena;, ressaltou.

Para o professor de finanças do Ibmec José Kobori, a crise tornou as pessoas mais criteriosas nas decisões de consumo. Arci, especialista em educação financeira, concorda e reforça que o brasileiro precisa prestar atenção ao modo como gasta dinheiro. ;Deixamos pequenos valores de lado todo dia, no troco da padaria, na diferença entre um produto e outro. A médio e longo prazos, essas quantias podem se tornar algo grande;, apontou. ;Qualquer centavo que seja deve ser poupado;, aconselhou.

De acordo com os especialistas, se há alguma boa herança da recessão que afundou o país, é a mudança no comportamento de consumo. ;A crise ensina a rever o orçamento, a tentar calcular o valor do dinheiro. O brasileiro é um povo gastador e as dificuldades mostraram que os recursos não são infinitos;, apontou Bentes. ;O aprendizado que fica são a disciplina e o hábito de poupar, que deve ser prolongado. Mesmo quando a recessão passar e o Brasil voltar a crescer, vamos consumir com mais consciência. Aquela pessoa que teve poder aquisitivo e perdeu demora mais tempo para voltar a consumir;, complementou Kobori.

Milésimos


Em Brasília, postos de gasolina disputam a preferência do cliente por centavos. Para o consumidor, a briga entre os empresários é aliada na hora de economizar. ;Qualquer centavo é válido. Antes, era impossível encontrar um preço diferente, agora sempre que vejo, procuro abastecer;, disse o bombeiro Gláuber Sizino, 32 anos. ;A gasolina é o único preço expresso em três casas decimais. Depois do aperto, o cliente está olhando até para os milésimos de real, pois faz diferença para quem enche o tanque;, ressaltou Bentes.

Contudo, é necessário avaliar se a economia de fato vale a pena. ;Se for necessário um grande deslocamento para aproveitar uma promoção, compare o quanto pouparia e o quanto terá de gastar de combustível para chegar ao local. Às vezes, pode não compensar;, aconselhou Arci.

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* Estagiária sob supervisão de Odail Figueiredo

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