Economia

DF produz leite para alérgicos

Parceria de fazenda de Planaltina com a Embrapa deve levar ao mercado inovação destinada a pessoas que têm intolerância a proteínas, e chega a custar R$ 8 por litro

Marlene Gomes - Especial para o Correio
postado em 28/08/2017 06:30
Nos testes, mais de 90% das vacas apresentaram a modificação genética necessária para que se possa chegar à industrialização
O leite é um dos produtos mais importantes na mesa dos brasileiros. O produto, e seus derivados, ajudam a impulsionar, no Brasil, a geração de empregos e renda, contribuindo com 24% do Valor Bruto da Produção gerado pela pecuária. Estima-se que cerca de quatro milhões de pessoas trabalhem no campo, com a ordenha e o manejo do gado, e nas indústrias de laticínios. Dados da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) indicam que a produção de leite neste ano no país será de 34,9 bilhões de litros, e o faturamento totalizará R$ 46,8 bilhões.

Os números poderiam ser ainda maiores. Uma parcela da população brasileira não pode consumir o produto por causa de uma reação alérgica às proteínas. É uma realidade que começa a mudar a partir da produção no país de um tipo de leite especial.

Pesquisas para a produção do leite de vaca não alergênico estão avançadas no Distrito Federal, por meio de uma parceria entre a Fazenda Hermínia e a Empresa Brasileira de Produção Agropecuária (Embrapa). É possível que o leite A2 esteja no mercado já no próximo ano. O projeto para a produção desse tipo de leite, a partir de manipulação genética com o gado da raça Gir Leiteiro, é do proprietário da fazenda, Paulo Horta, cirurgião cardiovascular que realizou a primeira operação de ponte de safena da região Cento-Oeste, em 1973. Aos 82 anos, aposentado, ele acompanha com entusiasmo os estudos realizados pela Embrapa, desde 2014.

Nos testes de genotipagem realizados com o gado da fazenda, mais de 90% das vacas apresentaram a variante A2 A2 da proteína Beta Caseína, ou seja, estão aptas a produzir um tipo de leite que não causaria alergia ao ser humano. A qualidade na produção depende também da observação de normas de manejo, como a criação dos animais sem confinamento, com o livre acesso ao pasto e à luz solar.
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Nutrição
A importância nutricional do leite é grande, já que o produto tem ótima concentração de cálcio e fósforo, minerais essenciais para a formação e manutenção dos ossos. A alergia ao produto e a intolerância à lactose são manifestações diferentes. Essa reação ao açúcar do leite se dá por falta da lactase, a enzima que digere a lactose. Já a alergia é uma reação imunológica do próprio corpo às proteínas. ;A alergia pode até diminuir com a idade. Mas, para uma criança, é uma questão primordial, pois causa problemas digestivos, circulatórios e outras complicações mais graves. No adulto, pode produzir diabetes mellitus, cardiopatia isquêmica e alterações cognitivas;, explica Paulo Horta.

Além do Gir Leiteiro, a pesquisa da Embrapa envolve os zebuínos da raça Sindi, cujo leite apresenta grandes possibilidades de ter a variante A2 A2 da proteína Beta Caseína. A base da informação genética dos animais está no DNA. Por meio de testes de genotipagem, os pesquisadores da Embrapa identificam os polimorfismos do DNA, responsáveis por características importantes para a produção animal, como ganho de peso, produção láctea, constituição de carcaça, resistência a doenças e fertilidade.

Os testes de genotipagem identificam as variantes A1 ou A2, sendo necessários esses exames mesmo em animais de uma mesma raça. ;Com base nessas informações, são realizados os acasalamentos e, por meio de biotecnias de reprodução (fecundação in vitro e clonagem), é feita a seleção de fêmeas para que nasçam com a liberação da Beta Caseína no leite;, explicou Carlos Frederico Martins, pesquisador da área de reprodução animal da Embrapa.

A produção de antialergênico é uma realidade em vários países. A Nova Zelândia, que já registrou o nome ;A2 Milk;, certifica as fazendas com rebanhos que produzem exclusivamente o leite A2, além de laticínios derivados desse tipo de leite. O produto também já é encontrado em gôndolas de estabelecimentos comerciais dos Estados Unidos e Austrália.

Parcerias
A parceria da Fazenda Hermínia com a Embrapa já é antiga. Do trabalho conjunto, resultou a utilização do touro Uísque A2A2 nos principais acasalamentos. Ele é um dos destaques nacionais da raça Gir Leiteiro, sendo considerado um dos principais animais na produção de leite A2 no Brasil e um dos melhores touros provados da região Centro-Oeste. Atualmente o animal está na Central de Sêmen Alta Genetics, em Uberaba, Minas Gerais, onde seu material genético é coletado para exportação.

Localizada no Núcleo Rural de Tabatinga, região administrativa de Planaltina, a Fazenda Hermínia possui rebanho de 120 animais e, desde 1982, cria gado leiteiro. Além disso, a esposa de Paulo Horta, Lindalva, faz três tipos de queijos procedentes do leite A2: Minas padrão, Minas frescal e Chanclish (árabe). A propriedade de 100 hectares é atendida pela Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Distrito Federal (Emater-DF) há pelo menos duas décadas. ;O foco do nosso trabalho é o desenvolvimento rural sustentável e o atendimento inclui assistência ambiental, social e econômica. É um trabalho contínuo;, explica o engenheiro agrônomo Lucas Pacheco, gerente da Emater no Núcleo Rural de Tabatinga.



Conheça os números da produção láctea no país


156 litros é o consumo per capita

90 produtos têm o leite ou a proteína de leite na sua composição

2016

33 bilhões de litros
R$ 27 bilhões de faturamento
1,2 milhão de produtores
4 milhões de empregos
40% dos postos de trabalho no meio rural
R$ 1,34 de preço médio bruto por litro pago ao produtor

2017

34,9 bilhões de litros, produção estimada
R$ 46,8 bilhões de faturamento

Fonte: Ministério do Trabalho e Emprego / Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil / Secretaria de Agricultura, Abastecimento e Desenvolvimento Rural

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