Jornal Correio Braziliense

Economia

Rombo fiscal só cai na próxima década, diz instituição do Senado

Instituição Fiscal Independente afirma que projeções do governo para as contas públicas são excessivamente otimistas e prevê que dívida permanecerá elevada até 2030. Para a entidade, é preciso rediscutir gastos obrigatórios


O Relatório de Avaliação Fiscal da IFI prevê rombos de R$ 160,9 bilhões, em 2019, e de R$ 136,8 bilhões em 2020. Quando a equipe econômica admitiu que as metas atuais não seriam cumpridas e informou, em agosto, a necessidade de mudança nas LDOs de 2017 e de 2018, para evitar crime de responsabilidade fiscal, as previsões eram de resultados primários negativos nas contas do governo federal até 2020, sendo de R$ 139 bilhões, em 2019, e de R$ 65 bilhões, no exercício seguinte.

Com a alteração da LDO, o governo deverá cumprir as metas fiscais deste ano, de acordo com a IFI. No entanto, para que o objetivo seja atingido em 2018, serão necessários R$ 30,5 bilhões de contingenciamento de gastos, porque o orçamento prevê R$ 20,6 bilhões de receitas incertas, que dependem de autorização do Legislativo. É o caso, por exemplo, da tributação sobre fundos de investimento, do adiamento dos reajustes dos servidores para 2019 e da reoneração da folha de pagamento de vários setores empresariais beneficiados no governo anterior.

Endividamento

Um grave problema que esses deficits consecutivos geram é o aumento do endividamento público, porque a União precisará emitir títulos no mercado financeiro para cobrir o rombo de R$ 615,7 bilhões que deve ser acumulado entre 2017 e 2020. A IFI prevê que, em 2024, a dívida pública bruta do país chegará a 93,3% do Produto Interno Bruto (PIB), permanecendo em patamares elevados, pelo menos, até 2030, quando ficará em 85,5% do PIB.

A equipe de economistas liderada por Felipe Salto, diretor executivo da IFI, avisa que esse dado será pior se o governo não conseguir conter o forte crescimento de gastos, principalmente daqueles considerados obrigatórios. ;Essa evolução dependerá fortemente de geração de deficits primários decrescentes e, já a partir de 2024, de superavits primários, o que só ocorrerá mediante alterações nos gastos compulsórios do governo federal;, afirma o relatório.

Vale lembrar que o descompasso entre a arrecadação e os gastos, que se agravou perigosamente durante o governo da ex-presidente Dilma Rousseff, continua preocupante. Com a recessão gerada pela política econômica anterior, a receita líquida do governo continua encolhendo. A retração foi de 3,1% de janeiro a julho, e, apesar de as despesas totais terem recuado 0,2% no mesmo período, os gastos com pessoal cresceram 10,9% e as despesas com a Previdência, 5%.

Na apresentação do RAF, Salto sinaliza que a revisão das desonerações será um dos temas que precisam ser debatidos para tornar o ajuste fiscal mais eficaz. ;Até julho deste ano, último dado disponível, foram R$ 50 bilhões em renúncias tributárias. Esse é um tema que deve ser amplamente discutido;, sentencia.

Recuperação lenta

A IFI é conservadora e prevê que o crescimento da economia, que poderia elevar as receitas públicas, ficará abaixo de 2% até 2020. A entidade manteve a previsão de 0,46% para a expansão do PIB neste ano, apesar de muitas entidades e instituições financeiras terem elevado as projeções após o resultado do segundo semestre. O avanço de 0,2% entre abril e junho, na comparação com os três meses anteriores, foi a segunda consecutiva, o que sinalizou, tecnicamente, o fim da recessão.

Mas alguns analistas afirmam que ainda não dá para comemorar. O economista-chefe da Austin Rating, Alex Agostini, é cauteloso em cravar que o país saiu da recessão. Ele lembra que, na comparação com o mesmo trimestre do ano anterior, o resultado foi positivo pela primeira vez, o que mostra interrupção da queda. Mas, considerando o acumulado em quatro trimestres, a economia ainda não saiu totalmente do buraco.

Nessa base de comparação, o PIB ainda mostra retração de 1,4% em 12 meses. O recuo no trimestre anterior foi levemente superior, de 2,3% indicando uma tendência de diminuição no ritmo de queda, o que é um alento. ;Essa é a melhor forma de olharmos se o país saiu mesmo da recessão, porque mostra a tendência. A economia brasileira pode ter deixado a UTI e ido para o quarto, mas ainda inspira cuidados, porque segue respirando com aparelhos;, compara Agostini. ;O país ainda não saiu do fundo do poço e, sem o ajuste fiscal, principalmente da Previdência, o próximo presidente terá dificuldade em arrumar um ministro da Fazenda;, completa o economista José Matias-Pereira, professor da Universidade de Brasília.