Fernando Ladeira - Especial para o Correio, Mariana Mainenti - Especial para o Correio
postado em 18/12/2017 06:00
Os indicadores econômicos apontam o processo de recuperação da atividade e evidenciam que o país saiu da recessão em que o Brasil se enfronhou, marcantemente, em 2015 e em 2016. A estimativa do Ministério da Fazenda de que o Produto Interno Bruto (PIB) registrará expansão de 1,1% em 2017, a taxa de câmbio estável, os juros decrescentes, a inflação presente controlada, com perspectiva de que se mantenha abaixo dos 4,5% ao ano, por pelo menos mais quatro anos, são sinais do novo período de desenvolvimento do Brasil.
Entretanto, esse ciclo virtuoso depende de uma série de medidas. Entre elas, está a aprovação da reforma da Previdência, a implantação de uma política fiscal austera e concretizadas outras ações, tais como a legislação que trata da insegurança jurídica e até do licenciamento ambiental. O avanço dessas medidas garantirá atração de investimentos esperados em infraestrutura e outros setores.
;Estou otimista com um pé atrás;, avalia o presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), José Carlos Martins. Para ele, as perspectivas para a economia brasileira são boas, desde que a reforma previdenciária seja realizada pelo Congresso Nacional. ;Senão a situação reverte;, alerta.
Perspectivas
Concorda com Martins o chefe interino da Divisão Econômica da Confederação Nacional do Comércio (CNC), Fábio Bentes, que demonstra preocupação com a não aprovação das mudanças nas regras para concessão de benefícios do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) em 2017. ;Como será aprovada em um ano eleitoral? E, se não tem reforma da Previdência, as contas públicas continuam desequilibradas;, enfatiza Bentes.
José Carlos Martins e Fábio Bentes participam das discussões do seminário Correio Debate ; Desafios para 2018, amanhã (19/12), no auditório do jornal. Os dois estarão presentes no Painel 2, que tem como tema ;A base para a retomada do crescimento;. Martins e Bentes conversaram sobre a conjuntura atual com o Correio. Leia abaixo os principais trechos das entrevistas.
Entrevista Fabio Bentes
Estudo recém-concluído pela Confederação Nacional do Comércio (CNC) aponta que somente sete estados brasileiros ainda não recuperaram os postos de trabalho fechados de janeiro a outubro de 2017. De todas as vagas encerradas, 84% encontram-se no Rio de Janeiro. Para o chefe interino da Divisão Econômica da CNC, Fabio Bentes, os dados confirmam que o Brasil já saiu da recessão e que a melhora será mais perceptível no ano que vem.
Bentes, que participa amanhã do painel ;A base para a retomada do crescimento; no seminário Correio Debate ; Desafios para 2018, diz que o reaquecimento da economia será via consumo. Ele afirma que a saída para o crescimento sustentado será a melhora do ambiente para os investimentos. ;Artificializar o consumo é inflação em longo prazo;, adverte nesta entrevista ao Correio.
Com a melhora das expectativas dos analistas para o Produto Interno Bruto (PIB) de 2017, podemos considerar que saímos da recessão, correto? Essa base melhor poderá também impulsionar o PIB de 2018?
Acho que já saímos da recessão. O Brasil, sim, crescerá mais em 2018. Um dado muito interessante é o comportamento do mercado de trabalho. Estudo que acabamos de concluir na CNC mostra que 20 estados do país já recuperaram seus postos perdidos de janeiro a outubro deste ano. De todas as vagas que foram fechadas nos outros sete estados no período, o Rio de Janeiro responde por 84% delas. As oportunidades estão aparecendo para os jovens e pessoas com qualificação acima da média. A inflação será maior, entre 4% e 4,5% ao ano, mas bem perto do centro da meta e a taxa de juros deve continuar caindo. Via consumo, o estímulo ao crescimento será maior. Com este PIB de 2017, que prevemos ficar em 1,1%, as pessoas não conseguem sentir diferença porque a própria população cresce a uma taxa muito próxima, de 0,9%, e o PIB per capita mantém-se estável. No ano que vem, o crescimento de 2% a 2,5% vai favorecer a sensação de que as coisas melhoraram.
Qual é o papel do comércio nesta retomada do crescimento?
O papel é importantíssimo, porque o comércio responde por 20% do emprego no Brasil. De cada cinco trabalhadores, um trabalha no varejo, que tem um peso de 11% no PIB. No supermercado, na farmácia, no posto de combustível é onde o consumidor percebe a expansão ou a contração da economia. O varejo sofreu muito durante a crise. Foi o setor com pior desempenho muitas vezes entre os 12 que o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) acompanha. Agora, no terceiro trimestre, foi o melhor. O varejo tem papel importante como fonte de renda e emprego, além de receita para o governo. E é onde o consumidor acaba percebendo a melhora ou a piora da economia. E é muito mais fácil o eleitor olhar com mais carinho para a oposição quando percebe a piora na economia.
Mas a volatilidade do câmbio, comum a cenários eleitorais indefinidos como este, acarreta pressões inflacionárias. Uma inflação maior pode afetar novamente o poder de compra do brasileiro?
Os analistas estão reféns dos políticos. Falamos do descasamento entre investimento e consumo. O consumo aumenta a pressão sobre a inflação e pode aumentar também se o dólar oscilar. A nossa vulnerabilidade tende a crescer e a economia acaba sentindo. É muito difícil prever isso. Agora, com a não votação da reforma da Previdência, o dólar subiu e a bolsa caiu. Em 2018 podemos ter isso com mais frequência. Aí o poder de compra fica corroído pela inflação.
Que lições precisaremos aprender em 2018 para que o país tenha um crescimento sustentado nos próximos anos? A reforma da Previdência?
O que me preocupa é que se ela não foi aprovada em 2017, como será aprovada em um ano eleitoral? E, se não tem reforma da Previdência, as contas públicas continuam desequilibradas. O governo vai ter que continuar atraindo detentores da dívida pública com juros elevados. Os juros reais estão em 4%, muito próximos do que estavam no auge da crise, em 2015/2016, com inflação de 10% e Selic (taxa de juros básica da economia) a 14,25%. A conta de juros da dívida pública fica muito salgada. Isso acaba afugentando investimento. Para que alguém vai investir correndo o risco de perder dinheiro ?
E por essa razão alguns analistas afirmam que não se pode mais atrelar o crescimento do país ao consumo e que é necessário elevar o nível dos investimentos. Você concorda com essa análise?
Artificializar o consumo é inflação em longo prazo. Defendo isto aqui dentro da CNC. O país precisa de mais investimentos. Vimos o que aconteceu no fim do governo anterior. Boa parte do que foi gerado nos anos de consumo perdeu-se durante a crise.
Entrevista José Carlos Martins
O presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), José Carlos Martins, avalia que a economia está em recuperação e com boas expectativas para crescer, mas a consolidação desse processo depende da aprovação da reforma previdenciária. Para o setor da construção, no entanto, ainda há obstáculos como, a insegurança jurídica e a falta de investimentos. Na opinião de Martins, medidas microeconômicas, para fortalecer os diversos setores da economia, também são fundamentais para tornar o país mais competitivo e para estimular a geração de empregos.
Como o senhor avalia o atual momento da economia?
As expectativas estão boas. Os índices da economia melhoraram, as taxas de juros baixaram e estimularam a economia, cuja curva subiu, e há manifestação de interesses em fazer investimentos. Agora, se a reforma da Previdência não sair, essa situação reverte. Se a Previdência não se consolidar, o problema vai estourar mais à frente, nós teremos grandes problemas.
O senhor avalia que 2018 será um ano melhor?
Acompanhamos em 2017 um passo a passo em medidas adotadas, aprovação de reformas, implantação de ajustes, mas posso dizer que a tendência é ;otimista com um pé atrás;. Até agora a situação melhorou tendo a agricultura por âncora, pois a alta produção baixou os preços e segurou a inflação, e em consequência houve aumento do consumo, mas é uma situação que não se sustenta. Precisaria, agora, que fossem feitos investimentos, mas não é o que está acontecendo, e a tendência é de, mais à frente, subirem os juros para segurar a economia.
Mas investidores não tomam decisões baseados apenas em confiança...
Estivemos há poucos dias no Palácio do Planalto para pedir o apoio do governo a projetos de nosso interesse que tramitam no Congresso Nacional e devem ajudar a melhorar o desempenho do setor, e recebemos o compromisso de apoio. Na ocasião, durante a conversa com o presidente Temer, eu disse a ele: ;entendemos suas boas intenções, mas é necessário promover mais avanços;. Lembrei que temos estudo do Programa de Aceleração de Crescimento (PAC) no período de 2007-2014, e, dos projetos na área de saneamento, apenas 6,8% foram executados. Foi um período em que não faltou dinheiro, mas a execução de projetos também não andou. E o que impediu? Eu disse ao presidente que é o mesmo que impede ainda hoje, a insegurança jurídica, projetos malfeitos, tributação, e outros que se repetem.
E que projetos são esses para os quais foi pedido apoio do governo?
São os que facilitam o licenciamento ambiental, que reduz a insegurança jurídica, que estabelecem critérios para paralisações de obras, a lei de licitações, e a lei geral da micro e pequena empresa no tópico ;empate ficto; (recurso que permite pequena empresa que perdeu licitação reduzir preço e obter o contrato).
E quanto à nova fase de investimentos?
Bem, vivemos duas situações a serem resolvidas, pois investimentos estão ligados a confiança no futuro, e o raciocínio é de que se a Previdência vai quebrar não vou investir, e 50% dos investimentos têm locação na construção civil. A primeira situação é a do distrato. Compro um imóvel e se não estou conseguindo pagar devolvo o imóvel, e, no terceiro trimestre de 2017, o estoque de imóveis caiu em 13%, a venda caiu em 1,5% e os lançamentos, em 8,6%. Por quê? Devido ao crédito e vinculado ao distrato. O empreendedor vai ao banco e consegue o empréstimo para o lançamento, mas acontece o distrato e ele fica sem o dinheiro em mãos para pagar o financiamento, ou seja, endividado. A segunda situação é da Caixa Econômica Federal, que parou de financiar, mas detém 70% do mercado. Ela tem carteira de crédito própria, mas, nos últimos anos, o governo pediu para ela acelerar os empréstimos e também emprestou ao Tesouro Nacional, raspando seu caixa. É uma solução técnica que precisa ser resolvida pelo governo.
Nos últimos dias, foi assunto a necessidade de recursos externos e convites a empresas do exterior para alavancarem a infraestrutura do país.
Recursos externos, com certeza, são necessários. Quanto a empresas acredito que não, pois há capacidade instalada suficiente aqui.
Finalmente, as eleições em 2018 podem atrapalhar a implantação de medidas necessárias na economia?
O Brasil está bem maduro, não acredito em aventuras. E há poucos players nas eleições. Podem até utilizar discursos pré-eleitorais contrários, mas vão ter que adotar as medidas. É matemática. Com apenas meio tanque de gasolina, você vai parar na metade do caminho, mas com o tanque cheio, não.