Economia

Falta de investimento em tecnologia meteorológica ameaça agronegócio

Agronegócio depende de ferramentas para prevenir impacto de intempéries nas colheitas. Mas a falta de investimento do governo em supercomputadores pode provocar apagão meteorológico nos próximos anos

Marlene Gomes - Especial para o Correio
postado em 22/01/2018 06:00
Equipamentos de última geração e sistema de assessoria fornecem a previsão do tempo para uma semana, com dados atualizados duas vezes por dia, acessíveis por aplicativo no celular

O Brasil tem uma atividade agrícola intensa. Para manter a produção a pleno vapor, no entanto, é necessário se prevenir das intempéries que ameaçam colheitas em todo o país. Uma ferramenta fundamental para isso é a previsão do tempo. Mas a falta de investimento do governo pode provocar um apagão meteorológico nos próximos anos. Um símbolo desse desleixo é o supercomputador Tupã, do Instituto Nacional de Pesquisas Especiais (Inpe). A máquina, que já foi a mais potente do hemisfério Sul para previsão de tempo e estudos em mudanças climáticas e a 29; colocada da lista das mais poderosas em atividade em todo mundo, só voltará a operar com toda a capacidade a partir de março.

O Tupã passa por uma atualização, que vai garantir sua sobrevida por mais dois anos. Não voltará a figurar no TOP500, o ranking mundial dos supercomputadores. Outras máquinas já ultrapassaram o aparelho brasileiro, ligado ao Inpe e instalado no Centro de Previsão de Tempo e Meteorologia (Cptec), no município de Cachoeira Paulista (SP). Mesmo assim, é bom não duvidar do poder de Tupã, que ainda faz previsões de tempo com melhor qualidade, maior rapidez e grande prazo de antecedência.

O supercomputador prevê situações extremas, como calor, secas, geadas ou chuvas intensas, e dá prognósticos, com até uma semana de antecedência, sobre qualidade do ar e previsões ambientais. O supercomputador do Cptec faz cálculos de 258 trilhões de operações por segundo. Porém, com a falta de atualização, existia a real possibilidade de a máquina parar no final de 2016. ;Agora, o Tupã vai ter mais capacidade de memória e vai melhorar a performance, fazendo mais cálculos em menos tempo e com menor gasto de energia;, avalia o pesquisador do Inpe, Gustavo Escobar.

Fabricado pela empresa americana Cray Supercomputers, o Tupã começou a operar em 2011, mas foi perdendo potência a partir do quarto ano de uso, fato previsível. A atualização, ao custo de R$ 10 milhões, envolve a substituição de algumas peças, mas o Inpe já planeja a compra de um novo supercomputador, orçado entre R$ 80 milhões e R$ 120 milhões. O primeiro passo já foi dado. ;A portaria já foi publicada, mas um processo de licitação como esse leva de dois a três anos;, revela o chefe do Serviço de Supercomputação e Suporte do Inpe, Diego Mota Siqueira.

Agronegócio depende de ferramentas para prevenir impacto de intempéries nas colheitas. Mas a falta de investimento do governo em supercomputadores pode provocar apagão meteorológico nos próximos anos

O Tupã foi comprado pelo governo, em 2010, por US$ 23 milhões. Hoje, atende aos centros de pesquisa, instituições e universidades com programas de pesquisa sobre mudanças climáticas. Pelo site Meteorologia para Agricultura, auxilia os produtores com informações sobre áreas com necessidade de irrigação, condições para tratamentos fitossanitários, condições para colheita, clima e temperatura.


Planejamento

Não existe produtividade no campo sem planejamento, que, em boa parte, é baseado na previsão do tempo e nas condições climáticas. As análises são fundamentais para que o produtor possa definir o calendário de atividades das fazendas, do plantio e manejo à colheita. Ter acesso às previsões meteorológicas auxilia no controle de pragas e a evitar prejuízos, como em situações de instabilidades climáticas ou de eventos como geadas ou enchentes.

;Criamos um produto que fornece diariamente a previsão do tempo específica para a fazenda, além da previsão para os próximos sete dias, sendo que, ao longo do dia, os dados são atualizados duas vezes e o agricultor pode consultar as informações por um aplicativo de celular ou no computador;, explica Raphael Pizzi, sócio fundador da Agrosmart, empresa que leva ao agronegócio o conceito de cultivo inteligente e fazendas conectadas. ;Existia uma carência muito grande do agricultor por um produto de previsão do tempo focado nas áreas agrícolas;, enfatiza.

A assessoria inclui previsão do tempo, informes meteorológicos voltados para fazendas específicas e linha direta com especialistas. Com um modelo regional com grade refinada, é possível focar as previsões nas regiões agrícolas de interesse. Com sensores espalhados pelas plantações, a empresa, sediada em Campinas (SP), realiza, em tempo real, a medição de mais de 14 variações ambientais, como volume de chuva, umidade do solo, propensão de pragas, entre outras, por meio de sensores de solo e imagens.


Modelo


Os modelos numéricos, base da previsão do tempo, são interpretados por três meteorologistas. O sistema integrado a uma plataforma e a um aplicativo móvel gera um relatório com informações exatas da plantação e auxilia o produtor nas tomadas de decisões, sobre irrigação ou a necessidade de uso de um defensivo agrícola, entre outros itens, ajudando, inclusive, na diminuição de gastos.

Atualmente, a solução para o cultivo inteligente da Agrosmart está presente em cerca de 200 mil hectares em todo o Brasil, em 150 fazendas. A previsão do tempo específica para cada propriedade rural possibilita a verificação do comportamento diário e horário das temperaturas do ar, do acumulado de chuva e da nebulosidade, além da verificação de possibilidades de ocorrências de eventos de tempo severo. Alguns clientes tiveram economia de até 60% no consumo de água e de energia e aumentaram a produtividade em 20%.

O sistema integrado da Agrosmart, que possibilita ao agricultor, por meio de aplicativos, acompanhar a safra, chama a atenção de empresas globais. Uma das plataformas da companhia atraiu atenção da agência espacial norte-americana, Nasa, que a convidou para participar de um programa de transferência de tecnologia. ;Temos um problema sério para a população mundial. Em pouco mais de 25 anos, se não superarmos os atuais níveis de produtividade do campo, não haverá alimento suficiente para todos. Por isso, desde já, é necessária a criação de soluções inteligentes;, afirma a presidente da Agrosmart, Mariana Vasconcelos.

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