Paula Pacheco/Estado de Minas
postado em 06/02/2018 06:00 / atualizado em 19/10/2020 13:22
São Paulo — Nas últimas semanas, empresários de diversos setores se tornaram vozes importantes nos debates que envolvem a reforma da Previdência. Um dos representantes do empresariado mais ativos na defesa da votação do texto é Olavo Machado Júnior, presidente da Federação das Indústria do Estado de Minas Gerais (Fiemg), que lamenta a demora na mudança das regras atuais. “Estamos perdendo tempo”, alerta. Machado critica a maneira como o projeto da reforma da Previdência vem sendo atacado por seus opositores, que, segundo ele, têm distorcido a proposta por interesses meramente pessoais.
O presidente da federação mineira explica que os empresários não terão ganhos com as novas regras para a aposentadoria pública, já que eles apenas descontam do salário do trabalhador o valor referente ao INSS e o repassam para os cofres do governo. Mas ele afirma que todo o setor produtivo — e a sociedade em geral – será beneficiado, já que as reformas são fundamentais para o ajuste das contas públicas. Sem elas, diz, o Brasil não passará mais confiança ao mercado internacional, o que terá efeitos nefastos para o futuro do país.
Por que a Fiemg defende que a reforma da Previdência seja feita agora e não fique para o próximo governo?
Defendemos que seja feita agora porque ela deveria ter acontecido há muito tempo, dada a sua importância para o Brasil e para os brasileiros. E o que vemos agora é que mais uma vez estamos perdendo tempo e uma boa oportunidade, já que o presidente Temer se dispôs a fazer a reforma e não vai colher nenhuma vantagem no governo dele. Se a reforma não for feita agora, será cada vez mais difícil. Mas não tem jeito, porque ela terá de ser feita em algum momento, não tem como fugir.
E o que pode acontecer sem a reforma?
Nós temos um desiquilíbrio de contas que fatalmente será pernicioso, principalmente para quem hoje já é aposentado. Por isso a federação e as entidades de classe, não só de Minas, mas da maioria do Brasil, têm batido muito nesse tema para mostrar a deputados e senadores qual é a importância disso para o Brasil.
Como as entidades da indústria têm feito o corpo a corpo para sensibilizar os parlamentares?
Os deputados, pelo envolvimento com os grandes temas brasileiros, sabem da importância de fazer esse ajuste e é nessa tecla que temos batido. Mas nós também sabemos que, por trás desse debate todo, há interesses em jogo. Muitas pessoas gostariam que a reforma fosse protelada. São pessoas que se locupletam com a Previdência do tamanho que está. Para o cidadão que paga a Previdência, ficar do jeito que está só traz riscos. Além de pagar caro por uma Previdência precária, com um salário de R$ 5 mil de teto, o cidadão sofre com um país pior.
Mas há uma campanha grande para que os deputados não votem agora, do contrário sofreriam possíveis efeitos nas eleições de outubro. Como convencê-los?
Os deputados têm ciência do que está acontecendo, e nós, também, por isso temos feito uma campanha para esclarecer, principalmente funcionários das indústrias e do comércio. A divulgação que o governo fez sobre a reforma não foi bem colocada no começo e acabou trazendo uma série de dúvidas para quem está aposentado. Por isso temos deixado claro que quem já é aposentado é que corre mais risco de não receber se faltar dinheiro. Tem uma série de distorções por corporações que têm outros interesses e que colocam isso para cima dos deputados. Mas os que estão conscientes sabem que, se a reforma não passar, o país vai ter muitos problemas.
O empresário ganha ao apoiar a reforma da Previdência?
O empresário só se limita a descontar o INSS do salário do trabalhador e repassá-lo ao governo. Ele não ganha nenhum tostão de vantagem sobre esse valor. Mas, se o Brasil não passar a imagem de credibilidade, com uma Previdência sólida, baseada em novas regras, corremos o risco de nos transformarmos em uma Grécia ou Portugal, sujeitos a juros mais altos por não sermos considerados um país sério, que se preocupa com suas contas. O próprio Banco Mundial já falou sobre esse risco.
E se a reforma passar?
Se fizermos nossos ajustes, a produção brasileira vai poder concorrer em condições mais favoráveis no mercado internacional. A Previdência, mesmo que de forma indireta, influencia nisso. E o trabalhador que não faz parte dessas corporações ou é funcionário público não vai tomar um calote quando chegar a época da sua aposentadoria. Outro problema é que quem não recolheu para o INSS, de repente, está recebendo aposentadoria de alguém que pagou graças a algumas políticas dos últimos 10, 15 anos. Essa conta é do Tesouro Nacional. É um emaranhado de interesses políticos e quem vai pagar a conta é aquele que trabalhou e que recolheu por mais de 30 anos. Quando o deputado é assediado e corre risco de não se reeleger, no seu interesse particular, ele pode achar que não está na hora de mexer com a reforma. Mas, se esse adiamento acontecer, tudo vai ficar ainda mais difícil.
A aprovação da reforma da Previdência pode acelerar a retomada da recuperação da economia?
Essa é a maior vantagem para o empresário e a população brasileira. Com a reforma da Previdência, o mercado fica mais disposto a investir, a criar novas oportunidades, lançar novos produtos e atrair investidores estrangeiros. Do jeito que está não pode continuar, pois o país só passará por mais dificuldades. Mas aí vemos o Sindifisco (Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil) fazendo ameaça ao dizer aos deputados que, se houver reforma, serão punidos pela população. Está tudo errado. Deveriam estar preocupados em aumentar o volume de negócios no país para arrecadar mais e melhorar as contas públicas.
A indústria registrou em dezembro um ensaio de recuperação da atividade. Quando isso vai se refletir na geração de empregos, que é um dos problemas que mais têm afligido o brasileiro?
Isso deve acontecer quando a capacidade de produção estiver com uma ocupação maior. Aqui em Minas Gerais, já começamos a ver essa recuperação do emprego em algumas cidades. Em Nova Serrana, por exemplo, que é polo de fabricação de calçados, há uma oferta maior de empregos do que de trabalhadores desempregados. Isso aconteceu porque eles conseguiram crescer o volume de vendas. Mas o processo de recuperação é lento. Não fizemos 12 milhões de desempregados de um dia para o outro. Ficamos quase 10 anos desempregando gente, criando dificuldades, quebrando empresas, por isso não dá para esperar que essa situação mude de um dia para o outro. Mas esperamos que 2018 seja melhor que 2017.
Existe a expectativa de um ano melhor mesmo com as eleições de outubro? O que é possível esperar em um ano eleitoral? Há espaço para não políticos?
O nosso papel como eleitor é que grande parte dos problemas que estamos passando foram originados nas más escolhas políticas que fizemos. Temos a oportunidade e a obrigação de pensar mais em quem vamos votar. Podemos conversar com cada trabalhador para ter mais consciência e não votar em alguém porque é amigo, mas porque é competente e honesto. Precisamos colocar gente melhor sim. E muitos estão no meio político. Precisamos dar valor para quem tem valor e trazer gente nova, que não pensa só em vantagem. Desde que o candidato tenha preparo, não vejo por que só os que estão aí devam ser ungidos como salvadores da pátria. Precisamos de quem tenha vontade e dom para unir o país, fazendo um pacto em prol de uma grande nação. O mal que está aí foi feito pela falta de compromisso, mas isso precisa ser revertido logo.
A Confederação Nacional da Indústria (CNI) divulgou um estudo em que mostra que mais de a metade da indústria brasileira sofre com a defasagem tecnológica em relação aos competidores estrangeiros, o que compromete muito o desempenho no mercado internacional. Como resolver esse problema?
Com investimento em educação. A indústria vive de engenheiros e técnicos, por isso é preciso dar atenção à formação dessas pessoas, desde a faculdade até os cursos técnicos. Com pessoas bem preparadas, nós podemos melhorar o parque fabril, apesar de toda a obsolescência. A indústria 4.0 não deve ser temida, desde que haja determinação, regras claras e acesso a crédito. O governo, quando está sem dinheiro, só enxerga a possibilidade de faturar, mas precisa gerar condições para o Brasil ser mais competitivo e se colocar nas mesmas condições de outros países.