Economia

Governo nega, mas Brasil deverá ser afetado pela crise da Argentina

Pedido de socorro do país vizinho ao FMI aumenta desconfiança de investidores com economias emergentes. Presidente Maurício Macri sofre desgaste no Congresso. Segundo especialistas, crise pode ter efeitos no Brasil

Hamilton Ferrari, Rosana Hessel
postado em 10/05/2018 06:00
O ministro Nicolás Dujovne discute termos do acordo em Washington: expectativa de forte ajuste fiscal

A decisão do presidente da Argentina, Maurício Macri, de pedir socorro ao Fundo Monetário Internacional (FMI) mexeu com os mercados no mundo, que já estavam tensos com o rompimento unilateral, pelos Estados Unidos, do acordo nuclear com o Irã ; movimento que ajudou a elevar os preços do petróleo e a derrubar as moedas de países emergentes, principalmente, o peso argentino. Para especialistas, além disso, a crise do país vizinho poderá afetar o Brasil.

Macri sofrerá desgaste político ao tentar convencer o Congresso do país a aprovar o empréstimo de US$ 30 bilhões do fundo para tentar estancar a crise cambial que fez o peso acumular queda de quase 18% desde janeiro. A Câmara dos Deputados da Argentina, que já resistia a aprovar a reforma fiscal proposta pelo governo, que prevê aumento de impostos e corte de subsídios, cobra explicações sobre o pedido de resgate.

Um forte ajuste nas contas públicas, entretanto, deverá ser condição necessária para que o FMI dê sinal positivo para o empréstimo. Ontem, o ministro da Fazenda da Argentina. Nicolás Dujovne, encontrou-se em Washington com o diretor do fundo para o Hemisfério Ocidental, Alejandro Werner, para discutir os termos da operação. Hoje, ele se reunirá com a diretora-gerente do organismo, Christine Lagarde. A expectativa é que o socorro seja liberado em julho.

Apesar de o governo brasileiro negar a possibilidade de contágio, o Brasil será afetado pela crise no país vizinho ; e não apenas nas exportações de veículos. Especialistas lembram que, mesmo com a inflação abaixo de 3% e com reservas na casa de US$ 380 bilhões, o país tem fragilidades parecidas com as da Argentina na área fiscal ; sempre olhada com lupa pelos investidores internacionais para avaliar a capacidade dos governos de honrar compromissos com credores.

Os dois países estão saindo de uma recessão e possuem deficits primários elevados que pressionam a dívida pública. Nesse ponto, o Brasil está em pior situação: o endividamento alcança 84% do Produto Interno Bruto (PIB), contra 53% no país vizinho, conforme dados do FMI.

;O desequilíbrio fiscal é um problema crônico nos dois países, mas o Brasil tem um quadro de endividamento crescente que, se não for contido, aumenta o risco de calote;, alertou o professor da Fundação Getulio Vargas (FGV) Mauro Rolim. ;O comércio exterior também poderá ser afetado se a crise na Argentina impactar as exportações do Brasil;, alertou. Segundo ele, a participação dos estrangeiros na dívida pública interna está em queda, o que reflete essa preocupação com o lado fiscal. ;Esses investidores detêm uma parcela hoje em torno de 15% da dívida pública, mas já chegaram a atingir 22% em períodos de maior euforia com o país;, explicou.

Por outro lado, o economista-chefe da Opus Investimento, José Márcio Camargo, avalia que a equipe econômica de Macri cometeu ;problemas graves;, como reduzir os juros num momento em que a inflação dava sinais de força, inclusive aumentando a meta do índice de preços. ;Além disso, o BC argentino financia parte do deficit fiscal por emissão de moeda, o que gera pressão inflacionária. O Ministério da Fazenda de lá também colocou um imposto sobre os rendimentos dos títulos, gerando fuga de capital e desvalorização cambial;, ressaltou.

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação