Economia

Governo busca novo modelo para ferrovias para melhorar transporte de carga

Prorrogação de cinco concessões e divulgação de editais para obras em outros trechos, prometidas para este ano, são apostas para dinamizar o setor e melhorar o transporte de carga no país. Potencial de investimentos é de R$ 45 bilhões em 30 anos

Simone Kafruni
postado em 21/05/2018 06:00
Prorrogação de cinco concessões e divulgação de editais para obras em outros trechos, prometidas para este ano, são apostas para dinamizar o setor e melhorar o transporte de carga no país. Potencial de investimentos é de R$ 45 bilhões em 30 anos
O transporte ferroviário foi relegado a segundo plano por tempo demais no Brasil e nunca decolou, apesar de ser o modal de cargas mais competitivo em um país que exporta, sobretudo, grãos e minério de ferro. Agora, o governo de Michel Temer promete aprovar a prorrogação de cinco concessões e publicar os editais das ferrovias Norte-Sul, Ferrogrão e Integração Leste-Oeste (Fiol). Para os especialistas, não será possível tirar décadas de atraso em um único ano ; muito menos em 2018, com eleições ;, mas dá para preparar o terreno e costurar uma modelagem mais viável para o setor. Um ambiente sem tantas amarras e regulação, apostam, estimularia a iniciativa privada a aportar os investimentos necessários, que são bilionários.

Para o presidente da Macroplan, Cláudio Porto, o país acumulou erros nesta área desde a primeira privatização. ;A malha ferroviária é muito peculiar, foi um aprendizado. Mas todas as tentativas seguintes de aumentar a competição falharam, por serem caras e ineficazes. Quando o setor público assumiu os projetos, como no caso da Norte-Sul, que está em obras há mais de 20 anos, conseguiu juntar incapacidade com corrupção e travas burocráticas;, afirma.

A prorrogação de cinco concessões, que devem gerar R$ 45 bilhões em investimentos em três décadas, sendo R$ 25 bilhões nos primeiros cinco anos, segundo a Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários (ANTF), é uma fórmula eficaz para acelerar o crescimento do setor. ;Isso, porém, não deve servir como modelo definitivo. Temos que reduzir os passivos, mas buscar alternativas. Estamos perdendo muito tempo;, diz Porto, que defende a desregulação do setor. ;Quando se criam travas excessivas, estimula-se a judicialização, que é o pior dos mundos e se reduzem a qualidade do serviço e o interesse do setor privado. Além disso, abre-se margem para a corrupção.;

Salto

Uma modelagem estável e gestão eficiente da implantação dos projetos podem garantir o salto que o setor merece, na avaliação do presidente da Inter.B Consultoria Internacional de Negócios (Inter.B), Cláudio Frischtak. ;Apesar de o governo mostrar boa vontade, acho muito difícil conseguir resolver tudo neste ano eleitoral. A anuência dos órgãos técnicos e de controle é necessária;, explica. ;O governo quer se certificar de que as empresas darão direito de passagem a outras companhias. Quanto mais abertos os trilhos, melhor, desde que a remuneração seja justa para se ter uma boa manutenção;, aponta.

;As prorrogações sairão este ano. Não vão ficar para o ano que vem;, assegura Tarcísio Gomes de Freitas, secretário de Coordenação de Projetos do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI). ;As consultas públicas serão realizadas em junho. Os projetos da Rumo Malha Paulista (mais avançados das cinco prorrogações em estudo) já estão em fase final de análise. O processo seguirá para o TCU (Tribunal de Contas da União);, ressalta.

O diretor da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), Mário Rodrigues, diz que as prorrogações vão permitir corrigir distorções, como a existência de trechos não usados. ;Outro passo fundamental são as novas concessões. O edital da Ferrovia Norte-Sul será lançado no segundo semestre. Estamos começando a priorizar a Ferrogrão para finalizar até o fim do ano;, afirma. ;Temos a meta de incluir a Fiol em 2018;, arrisca o ministro dos Transportes, Portos e Aviação Civil, Valter Casimiro Silveira.

Júlio Fontana Neto, presidente da Rumo, está confiante em que o cronograma da ANTT para as concessionárias que querem prorrogação vai se cumprir. ;O nosso projeto foi o primeiro. Tivemos que montar o processo, que é complexo, por isso demorou mais. Agora, a pinguela está aberta;, diz. O executivo revela que o projeto da Rumo pretende mudar o modelo de trem usado para atingir a expansão prometida. ;Vamos sair de trens de 80 vagões para 120 vagões, então temos que investir em pátios, para tudo estar pronto em 2020. Serão R$ 8 bilhões para dobrar a capacidade;, conta.

Setor quer lexibilidade

Para o diretor-executivo da Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários (ANTF), Fernando Paes, após 21 anos de implantação do sistema de concessão de ferrovias à iniciativa privada, o processo deu certo, mas precisa avançar para que a qualidade e a eficiência dos serviços melhorem.

;Os números são favoráveis. A quantidade de carga aumentou mais de 100%. Os acidentes se reduziram em 85%. O caminho para desafogar a logística no Brasil passa pela ampliação das ferrovias. É preciso pensar num novo modelo, menos regulado;, defende Paes.

O executivo comenta que o exemplo dos Estados Unidos, que abriu o setor na década de 1980, aponta para ganho de eficiência e mais investimentos. ;Lá, eles têm total liberdade tarifária e contratual. Isso está longe da nossa realidade. Mas, em alguns pontos, temos paralelo no Brasil;, afirma.

Pleitos

Quando os Estados Unidos flexibilizaram a regulação, as empresas podiam abandonar as linhas antieconômicas. ;Isso fez surgir a indústria das pequenas ferrovias. Alguns trechos podem não ser viáveis para as grandes transportadoras, mas fazem sentido em outro modelo de negócio;, avalia. Por isso, um dos pleitos do setor, no Brasil, é que os trechos que sejam economicamente inviáveis possam ser devolvidos ao poder concedente, ou seja, à União.

;O governo tem de desenvolver um formato diferente de exploração, que não seja tão rígido como concessão, um modelo com custo operacional mais baixo;, argumenta Paes.

Estudos

Nos Estados Unidos, continua Paes, depois da flexibilização do modelo, surgiram aproximadamente 600 shortlines, pequenas linhas ferroviárias que carregam 40% da carga, enquanto seis grandes companhias puderam baratear as tarifas dos troncos ferroviários.

;No Brasil, podemos adaptar minimamente esse modelo. o sistema de concessões funcionou, e os números mostram isso, para os principais corredores. Os secundários foram deixados em segundo plano, porque o nosso arcabouço regulatório é muito pesado;, afirma.

O diretor da ANTF explica que as empresas estão realizando estudos para ajudar o governo a saber o que fazer com esses ramais. ;Para isso funcionar, é preciso que o custo seja menor e que a regulamentação seja mais leve.Queremos contribuir e apontar o caminho;, acrescenta.




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