São Paulo ; A decisão do governo de aprovar o leilão de seis distribuidoras de energia da Eletrobras, anunciada na última sexta-feira (15/6), pode ter sido tomada em um momento nada favorável e influenciar negativamente no preço que se pretende obter com a venda das companhias. A avaliação dos economistas é de que, apesar de a venda ser necessária, perdeu-se o melhor momento. Agora, além do agravamento da crise política, o país passa por dificuldades em sua agenda econômica, especialmente na questão cambial.
A apresentação das propostas junto à B3 está agendada para 26 de julho, mas pode sofrer mudanças, caso o governo não consiga uma série de aprovações para cumprir os trâmites legais. O edital já está disponível no BNDES. Segundo o edital de licitação, juntas as empresas acumulam prejuízo de R$ 15,436 bilhões em cinco anos até 2016. Serão vendidas as distribuidoras Amazonas Energia (AM), Ceron (RO), Ceal (AL), Boa Vista Energia (RR) e Eletroacre (AC).
Favorável às privatizações, Sérgio Vale, economista da MB Associados, avalia que o governo terá problemas ao optar por fazer a venda no meio do que ele chama de ;turbulência; cambial e política. ;Com poucos interessados, o leilão pode ;micar;;, avalia. A decisão, segundo ele, deveria ter sido tomada antes. ;Agora o país está quase parado e o grau de incertezas é muito grande. O resultado pode ser muito aquém do que se poderia obter sob outras condições;, explica.
O edital prevê que poderão participar do leilão empresas nacionais e estrangeiras, instituições financeiras, fundos de investimento em participações (FIPs), além de entidade de previdência complementar ; por meio de consórcio ou individualmente. O valor mínimo determinado pelo BNDES é de R$ 50 mil, já que a Eletrobras, presidida por Wilson Ferreira Junior, terá de elevar o capital social das distribuidoras para tornar o processo viável.
Estatizantes
Segundo o economista da MB Associados, além da crise política e das dificuldades na economia, os investidores podem ter receio de participar do leilão das distribuidoras por causa do atual cenário pré-eleitoral. Ele lembra que dois dos candidatos com mais intenções de voto nas pesquisas, Jair Bolsonaro e Ciro Gomes, são estatizantes. Com isso, há o temor de que o processo de privatização da Eletrobras não avance no novo governo e de que seja adotada uma política intervencionista na companhia. ;Esse já é um setor escaldado com medidas de governos anteriores e pode ficar receoso de entrar mais pesadamente sem saber o que vai acontecer. Esses leilões deveriam ter acontecido antes;, acrescenta Vale.
Assim como Vale, André Perfeito, economista-chefe da Spinellii Corretora, também avalia que o cenário eleitoral poderá pesar negativamente na decisão dos investidores por arrematar as distribuidoras. ;Ciro Gomes já disse que é contra a venda da Eletrobras. Já Bolsonaro e Marina Silva são duas pessoas sem muita capacidade de articulação política. Fica difícil imaginar que eles consigam aprovar o leilão da Eletrobras;, afirma.
Perfeito avalia que este não seja um bom momento para o leilão das distribuidoras. ;O Brasil está muito malvisto e com tudo que está acontecendo é de se esperar que as empresas sejam vendidas por um valor baixo. O governo vai vender um patrimônio público de graça e só tomou essa decisão agora para criar factoides, diante de tantos problemas, como o câmbio, para ganhar tempo;, critica o economista.
Apesar de acreditar que o momento não é o melhor para o leilão, o economista da Órama, Alexandre Espírito Santo, diz que esse pode ser um sinal que o governo dá ao mercado de que não está inerte. ;O governo está acuado por uma série de fatores, como a pressão cambial. Diante disso, é preciso buscar o que é menos ruim para o momento. ;, explica.
O economista da Órama acha difícil que o leilão consiga atingir bons resultados financeiros para os cofres públicos. ;Não são ativos extremamente atraentes porque se trata de empresas que demandam investimentos pesadíssimos. Racionalmente, quem decidir botar dinheiro no negócio vai ter de encontrar um desconto bem alto;, diz Espírito Santo.
Roberto Padovani, economista-chefe do Banco Votorantim, também acredita que a decisão de leiloar as distribuidoras agora foi a melhor para o momento. ;Um momento ideal talvez não chegue nunca. O governo precisa fazer a agenda caminhar, independentemente do desafio fiscal enorme que tem nas mãos;, afirma. Para ele, esse tipo de negócio tem como característica atrair investimentos de longo prazo, por isso pode ser que os problemas políticos e econômicos tenham um peso menor na equação.
O ativo mais atraente, segundo Paulo Cunha, consultor da FGV Energia, é a da Ceal, de Alagoas, que tem um negócio mais estruturado em relação às outras distribuidoras. Para o especialista, o interesse dos investidores vai depender muito da modelagem para o setor que for aprovada no Congresso Nacional. ;Mas esses ativos, de uma forma geral, têm como atrativo o potencial de melhoria, que é muito grande. Com habilidade e expertise é possível melhorar bastante o desempenho dessas empresas;, diz.
No negócio de distribuição de energia, que no Brasil passa por processo de consolidação, depende da proximidade entre as operações para aumentar os ganhos com escala. Com a falta de ativos disponíveis, uma alternativa para as operadoras desse setor é justamente crescer e melhorar resultados por meio de aquisições, explica o consultor da FGV Energia.
Por outro lado, no caso das distribuidoras da Eletrobras, os investidores precisarão ter fôlego financeiro para reequipar as operações, montar equipes e renegociar dívidas com o objetivo de melhorar o desempenho. ;Por isso, esse deve ser o tipo de ativo que fará mais sentido para quem já atua no segmento, não para investidores;, afirma Cunha.