Jornal Correio Braziliense

Economia

TCU limita prorrogação portuária de contratos antigos

Decreto de Portos assinado pelo presidente Michel Temer permitia prorrogações por até 70 anos, mas isso só valerá para concessões assinadas a partir de 2017

A polêmica sobre o Decreto dos Portos (decreto 9.048/2017), assinado pelo presidente Michel Temer em maio do ano passado, permitindo prorrogações por até 70 anos, teve um desfecho, nesta terça-feira (26/06), no Tribunal de Contas da União (TCU). O plenário da Corte decidiu limitar as prorrogações de concessões de contratos feitos antes do decreto presidencial a uma única vez e pelo o prazo estipulado originalmente nos contratos. Assim, arrendamentos de 25 anos ficam limitados a uma prorrogação de mais 25 anos, assim como os contratos de 10 anos só poderão ganhar mais 10 anos.

[SAIBAMAIS]De acordo com o ministro relator do processo, Bruno Dantas, o TCU estava avaliando três pontos do decreto: as prorrogações, a permissão de investimentos fora da parte arrendada e a possibilidade de substituição de áreas. A questão mais polêmica era justamente a das prorrogações, porque o decreto teria criado um prazo de 35 anos, inexistente na Lei dos Portos, aprovada em 2013, com possibilidade de renovação por mais 35 anos. ;Isso não estava previsto e violaria contratos assinados sob a égide da lei anterior;, explicou.

A lei anterior, que regia o setor de 1993 a 2013, permitia prazo máximo de 25 anos mais uma renovação por igual período. O decreto de 2017 pretendia regulamentar a nova Lei dos Portos, que não estipula prazo máximo. ;Com relação a esse ponto, nossa decisão foi de vetar integralmente a retroatividade do prazo para os contratos antes de 2017. A proposta de até 70 anos só vale para o que for assinado depois de 2017;, reforçou. Na prática, ainda não existem contratos após o decreto, portanto, só valerão para futuros arrendamentos.

Como o marco legal foi válido de 1993 até 2013, os ministros consideraram que acatar o voto do relator e não permitir a retroatividade da decisão do decreto de 2017. ;Havia um problema de interpretação do Ministério dos Transportes;, disse Dantas. A pasta entendeu que poderia retroagir, mas paralisou qualquer processo de prorrogação até o julgamento do TCU.

;O Tribunal fará uma representação à Procuradoria Geral da República para que proponha uma ação de inconstitucionalidade às prorrogações por até 70 anos, na ausência de previsão da lei. Como a legislação é omissa quanto ao prazo máximo, deve ser avaliado pelo STF (Supremo Tribunal Federal) se é compatível para os casos futuros;, afirmou Dantas. ;O prazo de 25 mais 25 já está em aplicação há 20 anos;, acrescentou.


Obras e áreas


Sobre os outros dois assuntos avaliados pelo TCU na sessão plenária desta terça-feira, 26/6, o ministro Bruno Dantas explicou que as obras fora da área do terminal portuário foram autorizadas, desde que obedecida uma série de condicionantes e restrições. ;O plenário acolheu minha proposta e ampliou e enrijeceu as condicionantes. Isso porque, no caso dos aeroportos, identificamos que as empreiteiras estavam formando consórcios para fazer algo que nem era sua expertise, apenas queriam superfaturar obras. A partir desse aprendizado, não queremos deixar portas abertas;, justificou.

No entanto, a Corte de contas considerou o setor público, no caso a Companhia Docas, está com orçamento cada vez menor e o governo, com restrição fiscal, portanto o setor privado pode investir em áreas comuns desde que ;o orçamento seja previamente aprovado pela autoridade portuária e a obra tenha relação direta com o serviço que é realizado pelo terminal;.

Na questão da substituição de áreas e permutas, foi consenso no TCU que há mutabilidade ao longo do tempo. ;Ainda mais quando se fala de contratos de longo prazo e, se o STF entender que é constitucional até 70 anos, é compreensível que haja mudança nos portos em período tão longo. Mas o tribunal terá que examinar caso a caso;, destacou Bruno Dantas.

No caso específico da Rodrimar, empresa suspeita de oferecer vantagens indevidas ao presidente Michel Temer por ter sido beneficiada com a assinatura do Decreto dos Portos, o contrato anterior a 1993 terá que ser relicitado, segundo o ministro.


Votos


O ministro Benjamin Zymler deu a contribuição mais valiosa ao processo do Decreto dos Portos. Zymler sugeriu criar a baliza do prazo de vigência dos contratos originais. ;Não se pode transformar 10 anos em 70. Se a lógica foi de estabelecer 10, a prorrogação é pelo mesmo prazo;, argumentou. A partir da sua fala, ficou decidido que o TCU faria uma nova redação do acórdão para ser votado ao fim da sessão, com essa determinação.

Para o ministro Walton Alencar Rodrigues, a Presidência da República outorgou uma ;gigantesca benesse; com a possibilidade de prorrogação por tanto tempo. ;Uma concessão que, por uma penada da Presidência, ganha mais anos, multiplica seu valor de mercado. É uma grande benesse para o setor este decreto;, comentou. Rodrigues elogiou as amarras criadas pelo ministro Dantas. ;Elas evitam que se possa proporcionar vantagens indevidas. A experiência brasileira é traumática;, disse.

O ministro José Mucio Monteiro e Marcos Bemquerer acompanharam integralmente o voto do relator. Vital do Rêgo disse que prazos e investimentos em áreas comuns são prerrogativas que exigem cautela por parte da administração. ;As salvaguardas são a parte mais preciosa no que diz respeito a mitigar os riscos;, afirmou.