Economia

Plástico: Abiplast prepara consulta ao Cade sobre venda da Braskem

Representante da indústria do plástico quer aproveitar o momento para derrubar barreiras que encarecem o produto importado e garantem o monopólio à petroquímica controlada pela Odebrecht

Paula Pacheco/Estado de Minas
postado em 20/07/2018 06:00
Unidade da LyondellBasell nos Estados Unidos: interesse da holandesa pela Braskem foi confirmado há pouco mais de um mês pela controladora Odebrecht

São Paulo ; A venda do controle da Braskem para a holandesa LyondellBasell ainda depende de uma série de detalhes, como o resultado da due diligence, que está escaneando cada detalhe da situação financeira e industrial da petroquímica brasileira. Apesar de o contrato entre as duas companhias ainda não ter sido assinado (o que pode acontecer até outubro), a Abiplast, entidade que representa as empresas do setor do plástico, avisa que vai entrar com um pedido junto ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) para ser parte interessada no processo que vai avaliar os impactos do negócio, que deverá gerar a maior empresa petroquímica do mundo.

O presidente da Abiplast e interinamente no comando da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), José Ricardo Roriz Coelho, reclama que pelas atuais regras há hoje uma proteção no mercado de resinas que favorece a Braskem e prejudica o mercado interno. ;Ela aumenta seus preços o quanto quer. Hoje a Braskem conta com a ajuda de um imposto de importação elevado para alguns de seus produtos, o que inviabiliza a importação a preços competitivos e ainda conta com regras de antidumping para o PVC importado;, explica.

Para Roriz, a transferência do controle para a LyondellBasell pode representar riscos para os clientes da Braskem. ;Estamos preocupados quanto ao futuro do mercado brasileiro caso esse negócio seja concretizado, porque o controle dessa empresa que hoje detém o monopólio poderá passar para as mãos de uma companhia estrangeira;, avalia. Com a venda, a multinacional holandesa passará a ser a única fornecedora nacional de polietileno (PE) e de polipropileno (PP).

O representante do setor, formado por cerca de 12.500 empresas e que emprega por volta de 380 mil pessoas, reclama que hoje a Braskem já tem mantido uma relação delicada com seus clientes. Isso se agravou nos últimos meses por causa dos aumentos de preço. A empresa é a única produtora de poliolefinas e a principal fabricante de PVC no Brasil.

José Ricardo Roriz Coelho, presidente da Abiplast:

No final de junho, anunciou um reajuste de 7%, a partir deste mês, para o polietileno (PE). A alta para o polietileno de baixa densidade (PEBD e PEBDL, que inclui o linear) fixou o valor da tonelada em R$ 500 e do PP e do polietileno de alta densidade (PEAD) em R$ 600 a tonelada. ;A Braskem está ganhando dinheiro absurdamente, enquanto seus clientes passam por condições financeiras difíceis;, diz.

A Abiplast deve aproveitar o aumento dos preços para encorpar sua pauta junto ao Cade. As principais resinas, de acordo com a entidade, têm tido seus preços corrigidos mais intensamente a partir de 2017. Esses reajustes seriam acima da variação das cotações internacionais.

Segundo a associação, desde o início de setembro do ano passado, quando as operações da indústria petroquímica americana apresentavam sinais de recuperação depois da passagem do furacão Harvey, os preços em reais das matérias-primas subiram entre 24,55% (PBDL) e 36,79% (PVC). Nos Estados Unidos, no entanto, os preços recuaram 10,31% (para polietileno de alta densidade referência injeção). Já o polipropileno teve um aumento de 31,28% (PP). Em 2018, informa a entidade, os aumentos nos preços domésticos chegam a 24%.

Atualmente, com a queda da atividade econômica, a capacidade ociosa da indústria de transformação do plástico é de 30%. ;Não estamos gerando caixa para pagar a conta. Hoje não temos opção, não temos de quem comprar porque o produto importado, por causa das condições criadas para proteger a Braskem, chega a um preço muito elevado;, analisa o representante da Abiplast.

Jogo

Ao recorrer ao Cade, órgão governamental responsável por garantir as condições de concorrência no mercado brasileiro, Roriz espera mudar as atuais condições do jogo, como a alíquota de importação de 14% e as tarifas antidumping, e assim contar com outros fornecedores em um setor em que a Braskem reina sozinha. O governo brasileiro aplica regras antidumping às importações de PP, PVC e resina PET. No caso do PVC, isso acontece há 28 anos.

;Estamos preparando nossa exposição de motivos e deveremos apresentar as informações necessárias ao Cade para que ele aprecie os possíveis impactos que esse negócio pode ter na indústria de transformação do plástico;, afirma.

Por meio de nota, a Braskem se limitou a comentar que sua política comercial ;não teve alterações nos últimos anos. Ela sempre seguiu a relação das referências internacionais de preços nos principais mercados de resinas e do câmbio quando traduzidos em moeda local, como ocorre com qualquer commodity.;

O interesse da LyondellBasell pela Braskem foi confirmado há pouco mais de um mês pela controladora Odebrecht, que estaria em fase preliminar de conversa com a holandesa. Não se sabe ainda se a oferta para aquisição de ações será estendida aos outros sócios da Braskem, em especial a Petrobras. Segundo o que foi informado pelas companhias até agora, a Odebrecht ficaria com uma participação minoritária na LyondellBasell.

Avaliação

A Braskem tem como principais acionistas a Odebrecht, com 50,11% das ações ordinárias e 22,92% das preferenciais, e a Petrobras, com 47,03% e 21,93%, respectivamente. Na última terça-feira, a estatal informou à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) que os termos e condições de uma possível oferta da LyondellBasell pelo controle acionário da Braskem serão avaliados para que só então a companhia possa decidir sobre o que pretende fazer com sua participação na petroquímica.

A declaração foi feita depois de o presidente da Petrobras, Ivan Monteiro, declarar em entrevista recente à Folha de S. Paulo que a estratégia de venda da participação que tem na Braskem poderá ser reavaliada em caso de transferência do controle da empresa para a gigante holandesa.

Na análise de João Luiz Zuñeda, sócio da MaxiQuim, não há razão para que os clientes da Braskem se preocupem com a possível transferência do controle da companhia para a empresa holandesa. Para o especialista, o negócio não deverá ter impacto nos preços das resinas no mercado interno.

Zuñeda, ao contrário, acredita que a venda da Braskem poderá gerar uma série de benefícios. Tanto no caso da Odebrecht quanto no caso da Petrobras, ambas poderão contar com um reforço de caixa caso a venda aconteça de fato. A estatal tem adotado desde a época do ex-presidente Pedro Parente uma estratégia de desinvestimento e colocado alguns ativos à venda. Para o grupo de Emílio Odebrecht, essa seria uma oportunidade de fazer dinheiro sem se desfazer completamente do negócio, já que passaria a ter uma fatia menor da LyondellBasell.

;O medo do setor plástico talvez seja o de perder um interlocutor com a chegada de um novo controlador;, opina o especialista. Mas, segundo Zuñeda, os clientes da Braskem poderão se beneficiar, em tese, até mesmo da produção de outras resinas no Brasil com a mudança do controle da petroquímica. ;Se o negócio acontecer, começará um novo ciclo para a indústria petroquímica brasileira, com uma empresa nacional, hoje presente também no México e nos Estados Unidos, aumentando o seu alcance para outros mercados importantes;, diz.

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