Paula Pacheco/Estado de Minas
postado em 17/08/2018 06:00
São Paulo ; Uma decisão liminar da Justiça do Distrito Federal, que começa a valer a partir de 3 de setembro, daqui a pouco mais de duas semanas, colocou em estado de atenção os produtores rurais, Ministério da Agricultura e a multinacional Monsanto, adquirida pela Bayer. A decisão da Justiça Federal do Distrito Federal, de 3 de agosto, suspendeu o registro dos produtos à base de glifosato dentro de 30 dias até que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária, a Anvisa, conclua o trabalho de reavaliação toxicológica do agrotóxico.
Procurado, o Ministério da Agricultura (Mapa) informou que ;não vai se manifestar neste momento, pois a questão está na Advocacia-Geral da União (AGU);. Mas durante o Congresso Mundial de Solos, no Rio de Janeiro, o ministro Blairo Maggi foi taxativo ao afirmar que não há alternativa ao herbicida e advertiu que os agricultores poderão descumprir a ordem judicial porque, segundo ele, não há uma solução para substituí-lo. Ele reformou ainda que a AGU vai recorrer da liminar da Justiça do DF.
A afirmação de Maggi, um dos maiores produtores de soja do país, soou como uma ameaça: ;É muito importante dizer: não há saída sem o glifosato. Ou a gente não planta ou faz uma desobediência da legislação ou da ordem judicial. O glifosato é que dá toda a viabilidade de fazer o plantio direto e seguir com as culturas;.
Quem também reagiu foi a Aprosoja, entidade que representa os produtores de grãos. A associação cobra para que a AGU seja ágil em seu recurso e assim tente derrubar a liminar antes que a proibição do uso do glifosato entre em vigor. O plantio da safra de soja 2018/2019 começa em setembro. O Brasil é o maior produtor mundial dessa cultura. Para a Aprosoja, sem o herbicida não haverá a próxima safra.
A Monsanto informou que os agricultores usam produtos à base de glifosato há mais de 40 anos no controle de plantas daninhas. ;Como todos os produtos herbicidas, o glifosato é revisado rotineiramente pelas autoridades regulatórias para garantir que ele possa ser usado com segurança. Em avaliações de quatro décadas, a conclusão de especialistas em todo o mundo ; incluindo a Anvisa, autoridades reguladoras nacionais nos EUA, Europa, Canadá, Japão e outros países, além de organizações internacionais de ciência e saúde ; tem sido que o glifosato pode ser usado com segurança;, explicou por meio de nota.
A AGU pediu mais informações ao Mapa para avaliar se vai tentar derrubar a liminar. Dias depois da decisão do DF sobre o uso do herbicida no país, a Corte Superior do estado da Califórnia (EUA) condenou a Monsanto a pagar uma indenização de US$ 289,2 milhões a um homem que, em fase terminal, afirma ter desenvolvido câncer por conta da exposição a um herbicida com glifosato produzido pela companhia (entre eles o Roundup). Dewayne Johnson acusou a multinacional de não ter informado sobre os riscos à saúde causados pelo uso contínuo ; ele trabalhou por dois anos como jardineiro de uma escola. A condenação foi anunciada no dia 10.
Processos
A Justiça americana tem cerca de 5 mil processos semelhantes envolvendo a Monsanto. Por meio de nota, a subsidiária brasileira da companhia afirmou que a decisão sobre o caso de Johnson ;não muda o fato de que mais de 800 estudos e análises científicas ; e conclusões da Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos, dos institutos nacionais de saúde americanos e autoridades regulatórias em todo o mundo ; apoiam o fato de o glifosato não causar câncer, e não foi a causa do câncer do senhor Johnson;. A multinacional vai apelar da decisão.Na última segunda-feira, após a decisão da Corte da Califórnia, as ações da Bayer, que comprou a Monsanto por US$ 63 bilhões, despencaram. Os papéis da companhia chegaram a cair 14%, com perdas de US$ 14 bilhões de valor de mercado, mas encerraram o pregão em baixa de 10,3%.
Os analistas não veem dias muito fáceis para a empresa alemã. Segundo a agência Reuters, a Barclays avalia que a Bayer está com ;dor de cabeça litigiosa;, já que ;um grande número de casos semelhantes pendentes provavelmente se multiplicará.; Já um analista da Berenberg avaliou que a solução do problema do glifosato poderá custar à Bayer US$ 5 bilhões, colocando em risco o faturamento futuro.
Globalmente, o uso ou a proibição do glifosato não tem consenso e ainda são objeto de pesquisas. Nos EUA, por exemplo, a Agência de Proteção Ambiental (EPA) não incluiu o glifosato na lista de cancerígenos. Já as autoridades da Califórnia, sim. Com isso, obrigou que os fabricantes estampem um alerta nas embalagens. Desde 2015, a substância é classificada como ;provavelmente cancerígena; pelo Centro Internacional de Pesquisa do Câncer, braço da Organização Mundial da Saúde (OMS). No entanto, a Agência Europeia de Segurança Alimentar (EFSA) e a Agência Química Europeia (ECHA) discordam dessa classificação.