O principal desafio do próximo presidente, no entanto, independe da inclinação ideológica: aumentar o investimento para eliminar o hiato de infraestrutura, a diferença entre o que foi feito e o necessário em setores essenciais ao desenvolvimento do país, como transportes, energia, petróleo e gás e telecomunicações. Relatório da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) da Presidência da República revela que o Brasil precisará investir R$ 8,7 trilhões entre 2018 e 2038 para eliminar tal hiato.
Com uma conta parecida, a Consultoria de Negócios InterB considera o cálculo do governo consistente. Claudio Frischtak, presidente da empresa, explica que o país teria que investir 4,15% do Produto Interno Bruto (PIB) por 24 anos para recuperar o tempo perdido. ;Não estamos nem falando em modernização, mas em atualização;, ressalta. A necessidade de investimentos, segundo o cálculo da InterB, é de algo próximo a R$ 7 trilhões em quase duas décadas e meia. Em 2017, os investimentos em infraestrutura caíram para 1,69% do PIB, frente a 1,95% no ano anterior. ;Para reverter esse quadro, o país precisa abraçar uma agenda de reformas direcionadas para atrair recursos privados e possibilitar investimentos em setores essenciais, como mobilidade urbana e saneamento básico, cujo atraso separa o Brasil de países de renda média;, aponta estudo da InterB.
[SAIBAMAIS]Frischtak explica que, no ritmo que o Brasil investe, levará ao menos 58 anos para universalizar os serviços de saneamento e 32 anos para prover transporte público de qualidade. ;Desde 2011, os investimentos privados têm participação mais relevante, chegando a 63,3% do total em 2017. Isso reflete a deterioração do quadro fiscal e a redução de quase 60% dos investimentos públicos no setor de energia elétrica, decorrente do fim de um ciclo de grandes obras e da destruição da capacidade de investimento da Eletrobras;, destaca. Para o especialista, a privatização da estatal de energia, contudo, ficará para o próximo presidente. ;Quem quer que seja, terá que ter força política e apoio do Congresso para conseguir vender a Eletrobras;, diz.
Convergência
Por sorte, na opinião do presidente da InterB, há uma convergência de visões, na sociedade e dentre os presidenciáveis, que o investimento em infraestrutura é baixo. ;Mas é preciso também aumentar a qualidade do investimento. Isso passa por evitar projetos malucos, como Transnordestina e Fiol (Ferrovia de Integração Oeste-Leste, que consta do PPI). Significa gastar menos e fazer mais. Para aumentar o volume de investimentos, tem que ser o setor privado. O pouco que o setor público tem a fazer não pode seguir o ciclo eleitoral;, assinala. Outro desafio, focado em atrair o capital privado, é garantir a segurança jurídica. ;Temos uma situação de elevada insegurança. Quando junta isso com imprevisibilidade regulatória, o prêmio de risco aumenta muito. Os investidores fazem conta e vão exigir muito mais retorno;, destaca.O secretário especial do PPI, Adalberto Vasconcellos, ressalta que muito foi feito no período de dois anos. ;Temos 94 projetos em andamento, dos quais 47 serão concluídos este ano. Isso representa 75% do total qualificado no PPI. Nunca se fez tanto, mas claro que algumas coisas podem ficar para o ano que vem;, reconhece. Segundo ele, as prorrogações de contratos de concessão ferroviária da MRS e da Ferrrovia Centro Atlântica (FCA), que estavam previstas para este ano, ficarão para 2019, assim como os leilões da Ferrogrão e da Fiol.
Na opinião do especialista Fernando Marcondes, sócio da área de infraestrutura do L.O. Baptista Advogados, nem tudo que está na mesa do PPI será concluído este ano. ;É um governo enfraquecido, que está de saída e que nem sequer tem sucessor. Temer tentou fazer a parte ruim da história, com medidas impopulares, como a reforma da Previdência, mas os demais partidos não foram inteligentes e não aprovaram. Resultado: o ambiente de negócios não ficou propício para que o sucessor pudesse ter um início de mandato mais preparado;, avalia.
Para Marcondes, quem vencer a disputa pela Presidência vai pegar um país mergulhado em um cenário de concessões ;enroscadas;. ;Temos problemas de insegurança jurídica. Mesmo o decreto de relicitações (que permite a devolução amigável de concessões), que só depende da assinatura de Temer, é implementação muito custosa, portanto, certamente também vai ficar para 2019;, aposta. Por outro lado, o especialista destaca que os chineses estão com muito apetite. ;Eles estão interessados e pesquisando. E olham para daqui 50 anos e não quatro. Se o próximo governo conseguir acenar com a liberação das concessões, não vai faltar dinheiro. Os chineses estão prontos para liberar os recursos;, afirma.
Um dos segmentos que interessa aos asiáticos são as ferrovias, mas Marcondes admite que há ;um oligopólio a ser vencido;. ;As linhas continuam nas mãos de pouquíssimas empresas, ou seja, aumenta a concentração;, critica. Para ele, ainda serão necessários novos investimentos no setor de energia. ;Se houver aumento da demanda industrial, vai ter crise de energia. Há muita coisa represada, principalmente nas áreas solar e eólica;, avalia.
No entender do especialista em infraestrutura Miguel Neto, sócio sênior do Miguel Neto Advogados, o governo Temer não vai conseguir entregar tudo o prometeu. ;Vai sobrar um estoque de concessões e privatizações, de estradas, ferrovias, elétricas, que o próximo presidente vai ter de fazer. Mas muita coisa dependerá do viés político de quem ganhar;, alerta.
"Temos uma situação de elevada insegurança. Quando junta isso com imprevisibilidade regulatória, o prêmio de risco aumenta muito;
Claudio Frischtak, presidente da InterB.