Jornal Correio Braziliense

Economia

Com inovação no mercado, fintechs provocam revolução digital nas finanças

Com soluções baseadas em tecnologia, fintechs oferecem produtos inovadores a clientes insatisfeitos com o sistema bancário tradicional. Objetivo é conquistar, sobretudo, o público jovem, com serviços mais simples, rápidos e baratos, que podem ser acessados por smartphones

Enfrentar longas filas em bancos, gastar horas aguardando o pagamento de boletos em agências, ir a uma instituição financeira abrir uma conta e esquecer o documento. Perder minutos preciosos no telefone com o gerente do banco. O brasileiro já se acostumou à rotina enfrentada, diariamente, nos bancos comerciais do país. No entanto, a instantaneidade e a busca pela praticidade, sobretudo por parte dos jovens, abriram o mercado para as fintechs, startups financeiras que adotam novas tecnologias, na palma da mão, para mudar a vida de consumidores e investidores.

Com o objetivo de facilitar a vida de quem as usa, as fintechs são englobadas em diversas modalidades inovadoras no quesito tecnológico do segmento financeiro: transações por meio de criptomoedas, controle financeiro, seguros, empréstimos, câmbio e até formas de pagamento. Entre as diversas possibilidades, um denominador comum: a geração y, que busca maior independência financeira, simplicidade e imediatismo. Esse público-alvo é fortemente observado e analisado pelos empreendedores, abrindo um leque de oportunidades no mercado.

Para Hugo Giallanza, presidente da Associação de Startups (Asteps), a transição digital no ramo financeiro ocorre em momento propício. ;Existe um mantra entre essas startups: ;people first; (pessoas em primeiro lugar). No banco, por exemplo, o usuário fica horas esperando na fila. As pessoas estão ocupadas em executar atividades e não possuem tempo a perder. Hoje, os empreendedores estão preocupados em melhorar a experiência, eliminando custos físicos e oferecendo um serviço mais barato, que gere impactos no desenvolvimento das empresas no lugar dos serviços tradicionais, tudo com o smartphone na palma da mão;, explica.

Na visão de Hebert Kimura, professor titular do Departamento de Administração da Universidade de Brasília (UnB), o avanço das fintechs no mercado já redesenha o cenário financeiro do país. ;As fintechs buscam criar valor por meio da exploração de tecnologia para gerar produtos e serviços inovadores na área de finanças. Apoiando-se fortemente em tecnologias e ideias inovadoras e explorando imperfeições e ineficiências de mercado, elas têm propiciado a oferta de produtos e serviços bancários extremamente competitivos, que podem atingir uma população que antes não estava sendo contemplada pelas instituições financeiras tradicionais. Diante dessa conjuntura, os bancos têm também direcionado investimentos para o desenvolvimento de tecnologias e para a aquisição de startups, buscando acelerar seu processo de inovação, e até mesmo barrando o crescimento de novos competidores;, observa.

Opções

O mercado de startups no Brasil oferece diversas opções ao usuário interessado em experimentar os novos serviços. O Nubank, por exemplo, criado em 2013, não cobra taxas do cliente para emitir cartão de crédito, assim como concede ao titular vantagens, entre as quais a possibilidade de demandar o aumento do limite do cartão, algo que é analisado pela instituição com base no histórico do cliente.

;Nós inovamos o mercado ao reimaginar o cartão de crédito, criando uma experiência para os dias de hoje. Desde que lançamos nossas operações, em setembro de 2014, nossos clientes economizaram quase R$ 2 bilhões que teriam pago em tarifas inúteis, e quase 30 milhões de minutos que teriam gastado em filas no banco ou no call center tentando resolver problemas sem sucesso. Oferecemos uma experiência digital, com um aplicativo intuitivo que funciona o tempo inteiro, em tempo real;, afirma David Vélez, fundador e CEO do Nubank.

Na hora de auxiliar, os aplicativos também estão presentes na rotina. ;O GuiaBolso é um aplicativo que pretende orientar os usuários em questões de finanças pessoais e vem conquistando a aceitação do público. ;Para a gente, é um guia financeiro. O que implica ser um agregador em um mundo em que as finanças estão mais desagregadas. Assim, a gente se vê na missão de poder dar uma orientação financeira, transformar a vida das pessoas e revolucionar o sistema financeiro;, afirma Paula Crespi, diretora de produto do Guia Bolso.


Empréstimos

A Creditas, fintech especializada na concessão de empréstimos com garantia de taxas menores que as registradas no mercado tradicional, também se une ao grupo de startups que oferecem um leque diferenciado de serviços ao consumidor. ;O brasileiro está mal-endividado. Possui acesso fácil a taxas ruins oferecidas no mercado. Com base nisso, escolhemos um produto de crédito com garantia do veículo ou imóvel para oferecer ao nosso cliente. Na Creditas, a concessão do crédito com garantia equivale a até 90% do valor do veículo ou a 60% do valor do imóvel, de acordo com nossa avaliação. A partir disso, nossa precificação é personalizada. Somos uma empresa de tecnologia que atua no mercado financeiro buscando fazer as coisas de maneira diferente;, resume Fábio Zveibil, vice-presidente de Desenvolvimento de Negócios da Creditas.


Cautela

Na visão do educador financeiro Adriano Severo, as fintechs representam avanços nas contas diárias dos usuários. ;É um fator favorável, já que essas soluções inovadoras são bem mais transparentes, fugindo da política dos bancos tradicionais e oferecendo juros e tarifas bem mais baixos;, resume. No entanto, segundo Severo, o indivíduo deve ter consciência do próprio limite financeiro para não transformar uma facilidade em pesadelo.

;A pessoa precisa definir os limites de acordo com a realidade e seu estilo de vida. Logo de início, ela precisa deixar bem alinhado o quanto pode utilizar para cada finalidade, como forma de não estourar o orçamento. Como tem a possibilidade de aumentar o próprio limite no cartão de crédito, deve fazer os ajustes de forma gradativa;, explica.

Para Jônatas Bueno, educador e terapeuta financeiro, o usuário deve sempre ter certeza da saúde financeira da startup contratada. ;É uma negociação on-line, via chat. Então, sempre é importante aferir a confiabilidade da fintech, se é empresa séria, se está seguindo a regulação. Agora, se for uma empresa do nada oferecendo o serviço, é um risco ao usuário;, observa.

Tudo o que é preciso na palma da mão



A comodidade e a tecnologia chamaram a atenção do estudante de economia Iago Grillo, 19 anos, que, além de ser cliente dos bancos tradicionais, passou a ser usuário do Nubank. ;A questão empreendedora, como tirar a cobrança de taxas, principalmente de quem é universitário, assim como ter uma maior flexibilidade, chama a atenção. Tem uma pegada diferente, né?;, diz Iago. De acordo com o universitário, o serviço da fintech facilitou a logística de uma viagem ao exterior. ;Ao chegar ao país de destino, não tinha liberado o cartão de crédito na modalidade internacional. Contatei, por aplicativo, a startup que, em questão de instantes, resolveu o problema;, conta.

Iago tem em seu celular uma concentração de startups financeiras, na palma da mão, que as instituições precisariam de um quarteirão, para abrigar em lojas físicas. Um deles é o GuiaBolso, aplicativo de controle financeiro que ajuda o usuário a ter uma visão mais clara das contas mensais. ;Ele é essencial para controlar melhor os gastos. Além disso, o aplicativo permite aliar todos os bancos à plataforma;, resume.

Quem não tinha tempo, com a rotina agitada, para cuidar das contas, viu as fintechs facilitaram a gestão do orçamento pessoal. É o caso de Ana Padilha, 22, estudante de publicidade, que uniu o que precisava em um só lugar. ;Quando era mais nova, possuía um cartão de crédito que era vinculado à conta do meu pai. Agora, é muito bom para mim a possibilidade de ter um cartão do qual posso controlar a fatura, com um limite pré-estabelecido. Não gasto mais do que posso pagar. Sabe o melhor? É digital. Se fosse possível, cancelaria outros cartões de instituições financeiras tradicionais para migrar integralmente para as fintechs. Todo o dinheiro que ganho, do meu estágio e de trabalhos que faço para empresas, reúno na conta da startup da qual sou cliente;, conta.

Economizar na hora de pagar taxas anuais de transações bancárias e serviços também motivou o engenheiro civil Emanuel Bezerra, 27, a apostar nas fintechs. ;Comecei a estudar sobre eventuais bancos em que as tarifas eram menores. Na área digital, os bancos dos quais sou cliente não possuem cobrança. Para se ter ideia, em bancos comerciais, as taxas anuais giravam em torno de R$ 240;, relembra. De acordo com Emanuel, há outras vantagens além das tarifas. ;No Nuconta, por exemplo, o dinheiro na conta é revertido, 100%, em investimento da Taxa Selic, definida pelo Banco Central, o que garante a operação;, explica.

Por também liderar uma empresa de consultoria na área de construção civil, Emanuel procurou aliar a praticidade ao conforto. ;Se quero receber um recurso na conta, posso simplesmente emitir um boleto para a pessoa, que depositará o dinheiro e pronto, está lá. Não preciso pagar tarifa. Mas já tive problemas quando tentei criar uma conta como pessoa jurídica. Tentei registrar a conta e não consegui, e uma das fintechs da qual sou cliente demorou a solucionar o caso;, reclama.