Jornal Correio Braziliense

Economia

JBS traça estratégia para tentar espantar má fase nas exportações

Crise mais recente envolve recall de quase 3 mil toneladas de carne por suspeita de contaminação em unidade da empresa nos EUA. Consumidores cobram transparência


São Paulo ; Desde maio de 2017, o calvário das empresas brasileiras do setor de aves parece não ter um fim. A polêmica mais recente foi revelada na última quinta-feira e envolve a JBS, que anunciou nos Estados Unidos (EUA) o recall voluntário de cerca de 2,9 mil toneladas de carne moída e outros produtos crus. A decisão veio depois de os investigadores americanos terem identificado até agora ao menos 57 pessoas, em 16 estados, que adoeceram ao consumir carne da marca, de acordo com divulgação feita no Departamento de Agricultura dos EUA (Usda, na sigla em inglês).

O risco à saúde foi chamado de ;alto;, segundo o site do departamento e categorizado na classe I (situação de risco à saúde em que há probabilidade razoável de que o uso do produto provoque consequências adversas graves à saúde ou morte). A suspeita é de que o produto esteja contaminado por um dos 2.500 tipos de bactéria que provocam a Salmonella.

Os problemas começaram a surgir, segundo o site do Usda, em 5 de setembro, quando o Serviço de Inspeção e Segurança Alimentar do Departamento de Agricultura começou as investigações. Coube à JBS Tolleson, parte da JBS USA, braço americano da maior empresa de processamento de carne do mundo, optar pelo recall. Por meio de nota, a companhia informou que está ;trabalhando em estreita parceria com o Usda para garantir que todos os produtos potencialmente impactados sejam removidos de lojas e residências.;

Ainda segundo a JBS, suas unidades ;são anualmente auditadas por missões sanitárias internacionais e por clientes. No ano passado, a companhia criou a diretoria global de qualidade e segurança alimentar e chamou para a nova área Alfred Almanza, profissional que trabalhou por quase 40 anos no Usda, FSIS.

Justiça


Um dia depois do anúncio do recall, a americana Danna Raab, moradora do estado de Kentucky, apresentou ação junto ao Tribunal Superior do Estado do Arizona contra a JBS Tolleson sob a alegação de que foi hospitalizada depois de ter consumido carne moída da empresa contaminada por salmonela. O alimento foi comprado em uma loja do Sam;s Club em setembro. A consumidora relata que usou parte do produto para fazer um bolo de carne e congelou o restante. Ela passou mal, diz ter ficado internada por cinco dias e que o teste confirmou a presença de Salmonella newport.

Apesar de serem casos sem relação, o calvário da JBS começou bem antes do recall da última semana. Seu sistema de compliance ; como é chamada a forma de agir de uma empresa, de acordo com leis, regulamentos internos e externos ; foi contaminado pelos efeitos colaterais do vazamento, em abril de 2017, da gravação feita por Joesley Batista, então presidente da companhia, de uma conversa com o presidente Michel Temer (MDB), que dava sinais de que concordava com a compra do silêncio de Eduardo Cunha (MDB), então presidente da Câmara dos Deputados, preso na Operação Lava-Jato.

Professor de marketing da escola de negócios Insper, Silvio Laban lembra que organizações como JBS estão sujeitas a lidar com crises de diferentes origens, como as que envolvem produtos e serviços, além de regras de compliance. ;Apesar de ser problemas que afetam a marca, as empresas devem saber lidar, seja junto a seus fornecedores, seja com seus consumidores, que estão cada vez mais preocupados com o que consomem e se o fabricante segue práticas sustentáveis;, diz.

A JBS tem conseguido melhorar alguns de seus indicadores de desempenho operacional. No segundo trimestre do ano, o maior processador de carne bovina do mundo obteve lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda) ajustado de R$ 4,24 bilhões, aumento de 12,8% na comparação anual. A liquidez total dos ativos da companhia foi de R$ 20,3 bilhões, cinco vezes superior ao endividamento de curto prazo.

Perdas

O mesmo não se pode dizer das ações da companhia da família Batista, que caíram, segundo levantamento da consultoria Economática, 11,80% entre 16 de maio de 2017 (dia anterior ao vazamento do grampo de Joesley) e 5 de outubro deste ano. Nesse período, a empresa perdeu R$ 3,4 bilhões em valor de mercado.

Enquanto o mercado observa com atenção cada passo da direção da JBS, o BNDESPar, braço de participações do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), dono de cerca de 22% dos papéis da companhia, está aberto a conversas com potenciais interessados nessas ações. Em julho, o presidente do BNDES, Dyogo Oliveira, disse em entrevista à agência de notícias Bloomberg que o banco considera receber propostas que avaliem a participação do braço de participações da instituição na JBS. Dias depois, foi confirmado o interesse de investidores. Na ocasião, no entanto, foi negado que houvesse alguma negociação.

Por meio de nota, a JBS informou que ;;tem apresentando ao mercado resultados sólidos, e continua gerando valor aos investidores por meio da estratégia de diversificação geográfica e de três grandes diretrizes: maior geração de caixa, desalavancagem e redução de custo de capital. As notas da JBS têm crescido em todas as principais agências de avaliação de risco, o que demonstra a confiança do mercado na estratégia adotada pela companhia;.


  • Dever de casa

    Gigante do setor de carnes, a BRF, dona das marcas Sadia e Perdigão, se esforça para colocar a casa em ordem depois da troca de comando, que tirou o acionista Abilio Diniz da companhia. Para isso, recorreu a Pedro Parente, ex-presidente da Petrobras, que assumiu a BRF em 14 de junho. A companhia foi também impactada por uma decisão da União Europeia, em abril passado, que proibiu a importação de carne de frango de 20 frigoríficos do Brasil, sendo 12 fábricas da BRF. O caso ainda não foi resolvido e serviu como uma fonte adicional de preocupação para a BRF. Para tentar minimizar os efeitos de crise que as empresas do setor enfrentam, algumas delas optam por colocar seus presidentes na linha de frente para prestar contas para o mercado financeiro, diz o professor do Insper Sílvio Laban. É fundamental, na opinião dele, que as empresas estejam preparadas para lidar com essas situações, em condições de responder aos questionamentos. A BRF também foi procurada, mas não respondeu à reportagem até o fechamento desta edição.